sexta-feira, 3 de março de 2017

VENI, VIDE, VINCI


Cheguei, vi, venci

Esta frase célebre proferida por Júlio César, quando se apresentou perante o senado de Roma, como início do seu relato de como conseguiu a pacificação da Gália “em três tempos”, pode aplicar-se em geral a todos os cidadãos que circulam por aí. Todos, salvo raras excepções, já estão vocacionados às coisas rápidas, ao estilo das cápsulas de café.

Uma das consequências de evolução rapidíssima da vida é que os quilómetros e outras medidas que desde que há memória se foram utilizando para nos elucidar sobre a distancia entre dois lugares, também implicavam a noção do tempo necessário para a deslocação. Havia, portanto, uma ligação directa entre distância e tempo.

Com a melhoria das vias de circulação, da se terem construído estradas que não atravessam populações e que permitem aproveitar quase continuadamente as capacidades dos veículos que temos a nosso dispor, esta situação sofreu uma alteração notável, que mentalmente nos induz a dar menos importância aos quilómetros. Como se agora fossem, simultâneamente mais longos e mais curtos, do que estávamos habituados. É uma avaliação mental, consequência de comparar os percursos com o tempo necessário para os completar, antes e depois da modernização.

Infelizmente este progresso não se deu na maioria dos percursos ferroviários, o que teve como consequência a perda de utentes e, mais drasticamente, o fecho de muitas linhas e ramais que, a partir do século XVIII constituíram a sistema circulatório de Portugal, tal como a rede de veias e artérias alimenta o nosso corpo. Hoje a rede ferroviária secundária está tolhida, anquilosada. Quando nos vemos metidos num comboio que circula por alguma das linhas decimonónicas, o que sentimos equivale a uma paragem do tempo. Ficamos com a sensação de que os relógios andam a menos de meio gás. E esta lentidão já ninguêm a aceita.

Recordo com certa saudade o tempo em que para fazer um percurso por estradas antigas, que demorava mais do que o dobro do tempo do que hoje se necessita para chegar ao mesmo destino, aquela quase aventura rendia paragens intermédias para abastecer de combustível, descansar, esticar as pernas, e mesmo a sentar-se para uma refeição completa. Já se conheciam alguns um locais donde apreciar a boa cozinha, e até ter uns dedos de conversa com o dono ou dona. Tudo isso desapareceu. Hoje para-se numa estação de serviço e engole-se qualquer coisa, sempre delimitados a uma escolha entre reduzidas opções. E sempre com a pressa em cima de nós. Nem sequer o motor do carro chega a arrefecer.

Longe está o tempo em que ao programar um passeio, mesmo com uma distancia que hoje avaliamos como de virar a esquina, já se contava com um intervalo de refeição sem urgência; com uma visita a locais, monumentos, museus, paisagens, e pontos de interesse, sem ser a mata-cavalos. Inclusive podia acontecer fazer pernoita, fosse em casa de familiares ou amigos, ou num estabelecimento hoteleiro, que hoje já não existe ou foi modernizado sem manter nada do que era, e muito menos a amabilidade natural de quem não tinha sido formatado numa escola de hotelaria.


A modernidade empurra-nos para o domínio do imediatismo. Desde a comida pré-cozinhada até as diversões de carregar pela boca, que substituíram as feiras tradicionais, mais abrangentes e variadas nos conteúdos. Mas, sem dúvida, menos capitosas. (embriagador, estonteante)

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