segunda-feira, 30 de dezembro de 2019

MEDITAÇÕES – A culpa é sempre de outro



SITUAÇÃO ETERNAMENTE CÍCLICA

Portugal é um pequeno país, belo, interessante e povoado de gente boa, maioritariamente mesmo boa gente, educada familiarmente e prestável para ajudar a quem lhes surja pela frente, sempre e tanto que este desconhecido seja, por sua vez, respeitador e ofereça sinais claros de que pretende cumprir, nem que seja minimamente, as regras sociais que se tornaram como código de conduta nacional. Um decálogo não escrito nem avalado por alguma Assembleia Política.

Mas (sempre existe um ou mais MAS...) reconhecer a boa qualidade da maioria das pessoas do País não nos pode esconder o hábito, em excesso de uso, de atribuir as nossas desgraças, em geral cometidas por uns poucos mas que afectam à totalidade da população, que sem dúvida corresponde ao descalabro, esbulho e rapinagem a que, quase que permanentemente, são sujeitos os bens públicos. Se todos os que se aproveitam, desmedidamente, dos fundos públicos, andassem pelas ruas com mascarilha, como os Irmãos Metralha da banda desenhada, tínhamos uma densidade de máscaras inesperada.

E, sintomáticamente, os mesmos que são, de facto, os culpados da pobreza endémica deste agradável País, se encarregam de propalar aos quatro ventos a imposição de normas de conduta económica, por parte daqueles a quem pedimos ajuda para não nos afogar nas águas alterosas dos nossos heróis do passado, que, segundo afirmam os nossos concidadãos falantes, são as responsáveis do perda de capacidade económica própria e daí a constante queda ao abismo, em vez de poder tratar de tu-a-tu os nossos “parceiros” credores. Em verdade, os ignotos e habitualmente desconhecidos irresponsáveis da eterna desgraça, não necessitam de se colocar à janela dos Paços do Concelho para denunciar o “dragão” que nos devora. Há sempre uns mandaretes que se encarregam disso.

Para a tarefa de “elucidar” a população, mais ou menos crédula, sempre encontram papagaios que, a troca de um punhado de "limpaduras" sem préstimo, se encarregam de catequizar o cidadãos com os mesmos argumentos de sempre. E assim o ciclo mantém-se em perpétuo movimento.

Já devemos estar mais do que saturados, fartos até o vomito mental, de ver e ouvir que muitas das nossas penalidades foram ocasionadas pelas “condições draconianas” que nos impuseram aqueles a quem fomos pedir ajuda. Os desqualificamos como serem uns carrascos que impuseram a troika que nos subjugou. Sem nunca, ou só raramente, confessar que foram as nossas manias de grandeza, os desvarios de imaginar sermos capazes de novas Mafras e do conseguir um renascimento imperial, sem os alicerces de suporte indispensáveis, que nos empurraram para projectos que, desde o papel já se via terem um peso excessivo para as nossas forças.

Os sucessivos mega projectos, desde o Centro Cultural de Belém, -que nunca se terminou e se entregou de mão beijada a um especulador atrevido- e depois nas sucessivas maravilhas que nos deviam encumbrar ao topo da fama, como foi a Expo. Nada se aprendeu nas costas alheias, mesmo aqui ao lado, com a Expo de Sevilha e a espampanante Nova Valência. Não senhor, nós tínhamos estofo (sem dinheiro...) para muito mais, e em simultâneamente encher os bolsos dos urubus que incitavam as decisões que os iriam beneficiar.

Ou seja, periódicamente nos libertamos do síndrome de honradez que carregava Egas Moniz, e os seus familiares, quando vestidos de burel foram prostrar-se perante quem os podia ajudar. Não se quer voltar a este passado. Agora a soberba da ignorância cristalizada na modernidade, que nos passará ao largo, como tem acontecido habitualmente, já nos iluminou com a Web Summit, seja lá o que isto for. Novos projectos, novas profissões, novos horizontes radiosos se ergueram perante os olhos maravilhados. Entretanto organizam-se novos fogareus, novos espectáculos para encandear a população, e, mesmo que existam os alertas, insistentes, sobre o facto de que as contas públicas não passam de uma manta de retalhos, sempre mais curta do que a cama, a população não sabe como reagir.

A cidadania está totalmente condicionada pelo consumismo induzido e pelo “desporto rei”. As dificuldades económicas de muitíssimas famílias não encontram um prego a arder onde se possam agarrar. Os que dizem estar dispostos a ser seus defensores, os que denunciam constantemente, não mostram a coragem nem a credibilidade que os torne paladinos do população adormecida.

Por sua vez, a personagem omnipresente que tem o dom da ubiquidade, dos sorrisos, dos abraços e falinhas confortáveis, pertence ao restrito grupo dos dominadores. E por mais teatro que faça não passa de mais uma personagem de revista, e como tal, de efectividade nula, efémera, mesmo que permanentemente presente. Desculpam-no com frases do género das que se usam para disfarçar o mau comportamento dos meninos traquinas: Já sabem que “ele” é assim.

No fundo o máximo representante da cidadania em pouco difere da que fazia o falecido Almirante, também pessoa educada e membro do clâ. E assim estamos. Sem rei nem roque que tente dar uma reviravolta neste eterno desvario que comanda um País de sonhos. Não admira, portanto, que existam muitos cidadãos que, esquecendo as singularidades que o tornaram detestável, sonham com o regresso do novo Dom Sebastião, hoje imaginado, qual fantasma, pelo desaparecido ditador Salazar.

Não podemos culpabilizar a insensatez dos que desejam regressar a passados já mais do que gastos e irreais nesta actualidade que nos rodeia. Os estômagos vazios -metafóricamente escrevendo- sempre geram sonhos de mesas Pantagruelicas, que, fatalmente se esfumam quando tratamos de as concretizar.

Resumindo: FALTA UMA PERSONAGEM, CREDÍVEL, QUE NOS APONTE PARA O CALVÁRIO QUE TEMOS QUE SUBIR, mas com a promessa solene, de que tudo fará para travar a inevitável matilha de hienas e urubus que estão ansiosos de devorar o pouco que resta.

quarta-feira, 18 de dezembro de 2019

MEDITAÇÕES- Treinar o maquivaelismo




OS JOGOS DE MESA COMPETITIVOS

Tanto aconteceu com os filhos como mais tarde com as netas, que para os entreter e ao mesmo tempo os treinar para o futuro, mesmo que indirectamente e com a aparência primária de serem actividades inocentes, os introduzi nos aparentemente simples jogos de mesa, sejam de tabuleiro, com cartas de baralho iguais às dos adultos, figuras ou peças móveis.

Numa visão cândida classificaria estes jogos “de entreter” em dois tipos. Uns são condicionados pelo acaso, seja o que chamamos sorte ou azar -como pode ser o caso da lotaria, sem batota- pois a decisão da jogada está muito condicionada pelo valor (se jogar com dados) ou pela figura que lhe sai em sorte. No outro grupo temos aqueles jogos competitivos onde, desde o primeiro movimento tenta-se estruturar a vitória e derrota do oponente. Podemos qualifica-los como “jogos de guerra

São estes jogos, do segundo grupo, que, passados anos em que os aceitei como sendo simples jogos, terminei por os considerar, sem dúvida, como maquiavelismo. O xadrez é, para a maioria das pessoas, o jogo mais complexo e propício a meditar e estudar tácticas a curto ou médio prazo -tudo depende da experiência, saber e categoria pensante dos dois jogadores- Sem dúvida é um desafio que não está totalmente na dependência da sorte, a não ser, quando existe um equilíbrio entre os dois jogadores, na escolha da primeira jogada. 


Desde criança me alertaram sobre ser indispensável, para vencer em muitos jogos competitivos, seguir e tentar prever não só as jogadas que podem surgir mas, e de suma importância, ter sempre em mente, desde o início da partida, a necessidade em ter um inventário actualizado das peças que já foram jogadas, mais as peças que tem em seu poder, e daí poder deduzir o que está para sair do monte e, principalmente, o que pode ser que o oponente disponha na sua mão coberta..

Sei e admito sem argumentos que possam contrariar, que esta técnica de jogo é que deve ser seguida, se pretender vencer -sempre no caso dos competitivos, nem que seja a feijões- Com ela pretende-se contrariar, ou mesmo eliminar, o  factor sorte ou azar. Ou seja, dos que não podem ser muito influenciados pela capacidade cognitiva, memoristica e calculista do jogador. De facto os jogos competitivos são uma preparação para a vida real, pois incitam e preparam para a previsão, assim como nos podem dar possibilidades para colocar o adversário num beco sem saída, derrotando-o. É a cínica regra social, claramente maquiavelista, que se deve ter presente para não ser destinado, sem apelo, à mó de baixo.

Há quem defina esta situação, real, da vida em sociedade, com a afirmação de que o homem vive sempre numa selva, em perigo de esmagamento, de morte. Só escapam, sacrificando-se eles próprios, aqueles que optam pelo eremitério de facto-nem que seja figuradamente- num alheamento quase total. Escolherem o ostracismo. O que equivale a renegar de uma vida em sociedade aberta.

segunda-feira, 16 de dezembro de 2019

MEDITAÇÕES - Preocupações



Inês de Castro voltou triste

De súbito Inês ficou calada, mesmo sorumbática, e não disse nem mais uma palavra até chegarem a Alcobaça. Quando já alcançaram a porta do mosteiro, e sem cavalgar da sua montada, Inês perguntou a Dom Pedro se não podiam prolongar a jornada, numa decisão não prevista e fora do normal, e seguir até o Real de Óbidos, que sendo já uma Vila da Rainha, ficava fora dos territórios dados, e alguns usurpados, dos frades cistercienses, donos absolutos dos Coutos de Alcobaça.

Pedro ficou assombrado, não só porque esta proposta era totalmente fora do projectado como porque, dada a hora, teriam que viajar de noite. Ele, pessoalmente, acompanhado por um par de homens de armas, não tinha problemas e a distância nem sequer era de muitas léguas, mas não estava afim de sujeitar Inês aos imprevistos que uma noite cerrada, e em terrenos pouco ou nada frequentados após o sol posto, pelo menos por pessoas de bem.

Eu, Inês, não posso exigir nem mandar nada. Neste assunto privado em que nos metemos eu só tenho más cartas na mão. Não passo de ser uma concubina, uma amante, que não respeitei a minha Dona Constança, com a qual casaste em Évora, mesmo que sem a tua presença, por procuração. Só posso perder, e tu ficas pronto para outra, pois não me parece que te queiras inscrever como monge num convento.

Aconteceu que após ouvir aquelas jovens freiras de Cós fiquei sem vontade de conviver com os frades, por muito cultos que eles sejam, e falantes em latim, português, provençal e sei lá mais que, além do francês. Quando entrarmos no Mosteiro de Santa Maria peço-te que anuncies que cheguei muito cansada e mesmo indisposta e que desejo recolher-me, de imediato, à minha estância. Agradeço que dês indicação para me enviarem uma ceia leve, um caldo e pouco mais. A minha porta estará sem trinco, como sempre, e se te apetecer podes-me visitar. Mas hoje não estou para festas. Estou mesmo aborrecida

- Assim farei. E quando todos se retirarem vou ver se esclareço o porque estás assim desgostosa.
... intervalo musical, com o som de alaúdes como música de fundo; profundo e negro de ambiente. Podem aproveitar para aliviar a bexiga.

- Truc, Truk (não é truca-truca!) Incomodo? meu amor, minha luz, minha estrela matutina e vespertina, ou seja Vénus! Das licença a este teu namorado para entrar nos teus aposentos?

Pedro. Não venhas com salamaleques. Estou aborrecida, mas não contigo, e por isso recomendo que não esgravates nos meus sentimentos nesta altura. Se ficares caladinho e sossegado vou tentar explicar as razões do desconsolo que sinto na alma.

Já sabes que estive um longo tempo em paleio com as irmãs do convento de Cós. Elas, todas sem excepção, foram muito gentis e trataram-me muito bem. Não se lamentaram de nada, pelo menos abertamente, nem se queixaram do tratamento que lhes era dado, a não ser por parte de alguns fidalgotes, que entendiam que elas eram pouco menos que prostitutas às suas ordens e caprichos. Mas, coitadas, admitiam que esta era a sua sina e por isso a aceitavam quase como um penitência de pecados que não cometeram. Pelo menos na grande maioria das vezes. Sempre ocorrem excepções...

O que me entristeceu foi confirmar o que já conhecia que acontecia nas terras de onde vim a muitas donzelas que, sem uma vocação pessoal, eram atiradas -e o termo correcto é esse mesmo- para conventos para professarem e ficarem presas de por vida sem terem culpa de serem mulheres e terem sido nascidas neste mundo cruel.

Eu sabia, sem a mais mínima dúvida, que freiras com vocação de se sacrificarem para o Divino foram sempre uma reduzida minoria. Mas o ver a alegria daqueles rostos -frescos uns e não tanto outros- por se sentiram ouvidas e atendidas sem restrições, com uma liberdade de expressão que só entre elas, e sempre com sigilo, podiam ter, foi como se, por um bocado, lhes fosse aberta a porta da gaiola.

Ou seja, que apesar de saber como funciona a nossa sociedade, o ter aquele testemunho, mesmo que cauteloso, durante quase duas horas, abriu-me uma ferida no pensar, metafóricamente claro... Não posso admitir, nem tampouco lutar contra, e logo eu..., esta decisão de enviar as filhas que não tem um “bom pretendente” por perto, a ser reclusas num prostibulo disfarçado. Eu, num caso destes, matava-me ou me matariam. A saída que a família Pires de Castro, pseudo fidalga, me deu ao me “inscrever” como Dama da Corte da Constança, pouco melhor é, sem dúvida, do que o terem-me metido num convento. Estas freiras, pelo menos, gostem ou não, tem cobertura frequente e variada.

- Não quero, nem posso, argumentar com arrazoados que contrariem as tuas sérias palavras. Só posso concordar, referindo que nestes dos países, irmãos mas desavindos por serem tão familiares e próximos, existem demasiadas famílias que se consideram donos da plebe. Ou seja, acreditam ser fidalgos de sangue, coisa a que teria muito que objectar. São gente que, para viver, sem grandes luxos, dependem do trabalho, practicamente escravo, dos seus servos, dos que, como sabes, são donos absolutos, inclusive da sua vida miserável. Tens razão, e sabes que, por enquanto sou um simples Infante, sem poder efectivo algum, e que o Senhor meu Pai, o Rei Afonso IV é que, sempre dando a mão à Santa Igreja Católica, é que manda, ou pensa que manda...

sábado, 14 de dezembro de 2019

MEDITAÇÕES – Coisas de mulheres


Mexericos conventuais

Eu sempre atento ao bater das horas no relógio da torre, e mesmo que a distância do Convento de Cós aos aposentos reais que tinha no Mosteiro de Alcobaça, era como dois tiros de besta mecânica, mesmo assim fazia o possível para chegar cedo, pelo menos antes do toque de vésperas.

Já sobre as montadas, Inês quis contar alguns dos mexericos que as já suas amigas freiras de Cós lhe foram relatando enquanto lhe serviam alguns dos seus famosos doces e uma sequência de cálices da famigerada ginjinha conventual. Eu a tinha deixado com as ditas freiras enquanto tratava de alguns assuntos o Paço com a madre superiora e o Padre que estava ao cuidado das almas do convento, E que sei bem que molhava o seu aspersório tanto quanto podia, mas sempre vigiado pela madre superiora, que era muito ciumenta.

Pela voz encaramelada de Inês já dei conta de que as irmãs, seguramente que seguindo a pés juntos as indicações da receita , repetiram a quantidade de aguardente recomendada. (*) Ou então serviram-lhe demasiados cálices, admitindo que vindo ela de terras galegas estava treinada nas bebidas fortes.
Mas vamos ao que interessa. Parece que as mais novas sentaram-se à volta de Inês, gabando-lhe as suas loiras tranças e o seu empinado busto. As mais veteranas também se encostaram, mas não se decidiram a participar. De cabeça baixa, e ouvidos bem sintonizados, fingiam-se absortas nas rezas do rosário. Não do terço, pois ali rezava-se o rosário completo. Automaticamente, sem prestar atenção às ladainhas, que não duvido que, todas elas, estavam fartas de as dizer e ouvir.

Referiam, as mais atrevidas e com caras de quase virgens, digamos que com poucas léguas de rodagem, que entre os cavalheiros que as visitavam os melhores, e de longe ganhavam, os mais educados e sabedores das artes amatórias, eram os frades do Cister de Alcobaça. Elas os lembravam como frades do clister e eu (Inês) perguntei a que se devia este trocadilho. Rindo em coro, disseram que estes cavalheiros, que falavam um francês aportuguesado, ou um português afrancesado, como os migras na França, lhes disseram, muito sensatamente, que engravidarem e trazer anjinhos ao mundo não tinha valor nenhum. Que nem sequer era coisa que elas deviam consentir.

Mais acrescentaram:que, com muita boa vontade, depois do prazer que lhes dávamos, nos facilitariam umas ervas especiais que, tomadas como chá, depois de um dia de falta, quatro ou cinco vezes por dia, sem necessidade de rezas nem sacrifícios, e isso durante três ou quatro dias seguidos, era “remédio santo”. E pode crer, Dona Inês, aquilo dá um resultadão. Mas tem que se começar a tomar antes de ter a certeza de que a coisa pegou! Para os casos em que o descuido fosse mais antigo eles sabiam de outras ervas medicinais que depois de secas e esmagadas, sempre na mistura de quatro ervas diferentes, seleccionadas pelo frade farmacêutico, fervidas durante duas horas, a bom ferver, coadas e deixadas arrefecer até estar morna -provar com um dedo, mas nunca na boca, porque tinham muita fortaleza- e aplicadas com um aparelho que eles trouxeram, e que lhe chamavam de clister, que trazia um canudinho de cana com uma tripa de borrego que ligava o aparelho ao canudinho, e este devia enfiar-se no pipi (eles, que são sérios mas descarados, lhe chamavam kon, que é quase igual ao nome entre nos, e que não digo para não pecar) com duas ou três lavagens daquele caldo, dadas em intervalos de doze horas, era garantido que o intruso, qual diabo, sairia de onde não devia estar. Mas tudo isto referido com amor e boas maneiras.

Aqueles franceses devem trazer muito mundo às costas. Sabem mais do que o Senhor Bispo, e podemos afirmar que ele é o diabo de saias. Os ditos frades de Alcobaça sabem tantas histórias picantes e tem tanta habilidade para as contar, mesmo com aquelas falas atrapalhadas, que por nossa vontade, mesmo até da Madre Superiora, que algumas vezes até se mijou pelas pernas abaixo de tanto rir, nunca ficamos contentes por se irem embora, de regresso a Alcobaça. Se lhe dizermos que muitas das rezas que fazemos ao longo dos dias as dedicamos a pedir que voltem quanto antes... Olhe, a irmã Anunciada diz que gostava muito de ter um anjinho vindo daquele frade loiro. E quem não? Mas não podemos orientar a vida por aí.

A irmã Rosarinho quis entrar na conversa dizendo que, em comparação com aqueles fidalgos de merda (desculpe Dona Inês, mas é que eles são mesmo isso) o frades do Clister são mais do que nobres, e trazem salsichas das grandes, sem ser de lata. Eles dizem qualquer coisa como sausison.

E com esta palestra chegamos às portas do palácio. Ali nos separamos, mesmo sabendo que até cães, gatos e ratos, sabiam do nosso caso.

(*) nunca entendi como se podem fazer bem as coisas com os pés juntos. Só se for saltando à corda. Até aos animais, de burros a cavalos, para que não saiam para longe, se lhes atam as patas com umas manilhas.

sexta-feira, 13 de dezembro de 2019

MEDITAÇÕES – Dois problemas bicudos


Problemas com solução problemática

E, por azar, estes dois problemas, entre outros, são de incerta solução, e suficientemente complexos para nos aconselhar não os querer tratar, até porque cada individuo, isoladamente, não tem potencial para poder agir no sentido de condicionar a sua evolução.

E, após esta espécie de introdução, que nada diz, será que o leitor está preparado para o que daí pode advir? Podemos “entrar a matar” sem receio de provocar AVC? Pois aí vão, sem os referir por ordem de importância, pois cada um, no seu género e dimensão, nos prometem alterações na débil tranquilidade que tanto apreciamos. Outros existem com previsíveis consequências nefastas.

Referirei, em primeiro lugar, o que está ainda quentinho, nas letras gordas de todos os jornais desta zona em que nos encontramos. Ou seja, que o tema do dia corresponde ao resultado da última consulta eleitoral havida no Reino Unido, e que, em poucas palavras, corresponde à liberdade de decisão do governo inglês, eleito ontem, para proceder à gestão da vontade maioritária dos súbditos de Sua Majestade no sentido de abandonar a sua presença na União Europeia.

Os que se consideram muito entendidos quanto aos efeitos que podem causar este tal de Brexit, que podemos valorizar, de forma excessivamente simplista, como sendo uma espécie de divórcio entre nações livres e soberanas. Apesar de este propósito estar na ordem do dia durante muitos meses, deve ser geral ignorar, concretamente, todos os efeitos directos e indirectos que poderá causar, tanto para os súbditos de Sua Majestade como para os restantes membros da União Europeia.

Para já é possível que nem sequer a maioria dos votantes do U.K., que ofereceram, ao seu partido conservador, as chaves desta iniciativa, que se pode entender como uma ordem de despejo à medida dos inquilinos, sem passar pela fase de um divórcio não litigioso, devem conhecer toda a água no bico que carrega esta separação. Tem o potencial de uma verdadeira inundação, na qual muitos se afogarão.

Admito que muitos cidadãos da Inglaterra actual, e mais concretamente os que são desta naturalidade por direito de gerações pretéritas, votaram condicionados por questões com génese complexa e que não serão neutralizadas pelos que ganharam estas eleições. O responsabilizar as normas fronteiriças vigentes na UE pelo crescente número de migrantes estrangeiros que ocupam os postos de trabalho dos nacionais(?) é esquecer a porta dos fundos aberta para os originários da Comunidade Britânica, herdeira do seu Império.

Entendamos. Muitas destas situações tiveram a sua génese já no tempo da Margaret Thatcher quando do encerramento de minas de carvão e ferro, dos altos fornos produtores de aço, e por arrastamento, de algumas actividades que, ao abrir as fronteiras aos produtos que se encomendaram a países do Oriente, com grande satisfacção de quem abandonou a produção na Inglaterra -assim como sucedeu nos restantes países ocidentais- pensando que livravam-se dos problemas sindicais, e outros anexos, mas mantinham a comercialização das suas marcas, com melhores margens e menos problemas, não tardaram a verificar que a invasão de cópias fabricadas pelos mesmos que aceitaram produzir os seus modelos patenteados, fatalmente produziram versões próprias, que comercializaram directamente invadindo os mercados ocidentais e mundiais em geral.

Apesar de não ser exactamente idênticas as duas situações, podemos avaliar esta falta de previsão com a dos colonos na Austrália, que para eliminar outros problemas locais implantaram espécies não autóctones, nomeadamente coelhos e gatos, que actualmente constituem pragas de difícil neutralização.

Ninguém se atreve a profetizar as consequências que podem advir da saída do RU na “sociedade em comandita” que é a UE. Entre os optimistas e os pessimistas deve existir uma longa lista de efeitos, do tipo co-lateral, que poucos se atrevem a diagnosticar. Já é suficiente considerar que, sejam poucos ou muitos, simples ou complexos, os temas que se terão que abordar. Não demorarão a vir à tona da água, ou a descer às profundidades do irresolúvel.

E o segundo tema “bicudo” que gostaríamos de esquecer, sem conseguir, é o da degradação ambiental. Não só do aquecimento global de que muito se tem falado e pouco ou nada agido para tentar travar, mas também o problema dos resíduos da sociedade actual. Não só são as matérias plásticas de síntese, não degradáveis na natureza, mas também de outros muitos resíduos industriais, incluídos materiais rejeitados mas com longos períodos de radioactividade.

São muitos os compostos descartados com características perniciosas venenosas e até que não se podem reutilizar, ou seria “muito caro”, “não rentável” o eliminar as características perniciosas. Daí que, com atitudes irresponsáveis e totalmente inaceitáveis, livram-se de ter o problema em casa, como quem varre o lixo para debaixo do tapete. Tanto o ocidente industrial como a evoluída Ásia e Indostão, numa atitude cinicamente capitalista, enviam para zonas pobres de outros países, muito do que não podem esconder ou neutralizar. Com estas atitudes transformam áreas campestres em perigosas lixeiras.

quarta-feira, 11 de dezembro de 2019

O PRESSÁGIO DE ALCOBAÇA


E O PEDRO NÃO PENSA NOUTRA COISA

Em verdade ele quer é “coisar”, seja com quer for. Até uma burra sem saias lhe daria prazer! Mesmo assim, nestes momentos “solenes” ele só pensa na Inês (pereira), enquanto, à falta de melhor, manipula Constança com mãos de mestre -de obras-, enquanto de relance pisca o olho à Inês.

Constança, que nem sequer aprecia as lides de Cupido, finge-se descomposta, com dores de cabeça, que ela, com fingida timidez atribui à um prenúncio do famoso “incómodo”. Se Pedro estivesse interessado em seguir o calendário e, além disso, soubesse alguns rudimentos da fisiologia das mulheres, já teria descoberto que era impossível Constança ter tantas visitas de ingleses, quase semanalmente. Teria que estar mesmo doente...

Mas vamos ao assunto que nos chama a atenção.

Dom Pedro “o fodilhão” aguardou, com semblante compungido, que a Dona Constança, sua amada esposa, se decidisse a retirar para os seus aposentos e depois de se mostrar atencioso e com reverencias contínuas, andando às arrecuas, deixou a real companheira junto aos fieis serviçais, entre eles o bobo preferido -que mais adiante e se surgir uma oportunidade, veremos justificava a fama de ser um anão, gracioso, com dichotes e ocorrências que provocavam a risota mesmo às pessoas mais sisudas. Mas, também, tal como tem fama os anões, o que lhe faltava em altura era sobradamente compensado em comprimento do seu aparelho urogenital- muito gabado pelas aias, criadas, cozinheiras, lavandeiras e paneleiros da corte. Nem se entende como o dito Bobo, de nome Gaspar o Bem Armado, conseguia satisfazer tantos orifícios. Devia tomar muito leite com cacau, ou outra porção revigorante.

El Pedro, que viria a ser apelidado de Cruel, tal como um seu primo lá das Castelas, sem tardança dirigiu-se para o ponto de encontro (tinha um grande X marcado no chão) e lá estava a Inês (a nespereira perdeu as folhas devido a uma mija de cão raivoso) lendo uma revista de mexericos, com muitas fotos e notícias falsas, inventadas ao gosto e desejo das ávidas leitoras.

- Então, seu Pedro, minha Alteza Real, já se livrou dos seus deveres conjugais? Com descarga seminal ou só com boas palavras?

- Inês, não sejas má para mim, tu que estás boa como o pão-de-ló de Avintes, Atrintas e até Aoitentas à hora. Sabes que pão de milho ou de centeio não é o meu forte. Mas, respondendo ao que inquiriste, sim, por sorte Constança alegou que estava prestes a ficar historiada e eu, se bem que contente, mostrei-me muito constrangido. Suspirei e disse baixinho, mas de modo que ela ouvisse: Que pena, e logo agora que eu queria cumprir com o meu dever de esposo amante e fiel.

- Pedro, és mais falso do que uma dobra de latão. Quem não te conheça que te compre. Mas sabes tantas artes amatórias, que aplicas tanto nos corredores como no campo ou sobre uma cama, que eu não consigo resistir. Sabes bem que és um garanhão.

- Pois sei. A minha irmã diz a mesma coisa. E até a minha mãe, que ficou derreada com a minha derradeira cavalgada com ela. E disso faleceu. Que Deus a tenha na sua glória e lhe deixe a seu mando uns arcanjos com armamento maiúsculo, para ver se a satisfazem. Que bem merece. Tadinha.

- E então, tens alguma ideia na mente, que não seja exclusivamente o fornicar, que de tal já nem duvido.

- Por acaso sim. Estive pensando em darmos um passeio até Alcobaça e ver como andam as obras no magnífico mosteiro que os frades de Cluny ou do Cister, estão levantando, com o esforço da gleba que lhes foi graciosamente atribuída, com todos os direitos, desde o de pernada até ao Pelourinho e forca se o réu não fosse indispensável. Se o espaço nos agradar podíamos marcar uma residência onde descansar tempos eternos. Bem sabes que estamos neste mundo por um tempo reduzido, marcado, mas que desconhecemos quando será o nosso derradeiro suspiro. E quem refere suspiros podem ser beijinhos das Caldas, que não cavacas, que são mais secas do que … não digo!

E depois de ajoelhar e fingir que rezamos perante a Santa Cruz, muito sensibilizados e pesarosos, podemos rumar para o Convento de Santa Maria de Cós, afamado pela hospitalidade das suas acolhedoras freiras e também pela excelente doçaria. Nunca lá estive, mas chegaram-me referências de que tem formosas freiras, nada ariscas e que já deram frutos em quantidade à nobreza que as visitou, motivo pelo qual, sendo respeitosas da vida dos humanos, organizaram um infantário e até uma escola para os anjinhos que alí se geraram.

Dizem que existe um túnel, subterrâneo portanto, que liga o mosteiro do Cister com este Convento. Deve ser para prevenir incêndios ou inundações, apesar que os túneis habitualmente estão numa cota inferior e portanto atreitos a ficar inundados. As más línguas, que sempre proliferaram, dizem que é frequentado pelos monjes, em grupos de quatro, escolhidos por sorteio ao almoço da comunidade.

- Vamos até Alcobaça e Cós, ali poderei descansar enquanto tu te distrais com algumas irmãs. Se o que te disseram corresponde à verdade. E neste entretanto engordarei um pouco com os doces que dizes serem de muita nomeada. Se os fados me acompanharem poderei apaladar uma ginjinha preparada por aquelas fadas, que é bem melhor do que outras que por aí circulam, em milhares de garrafas.

Seguirá, se o nosso Deus consentir, uma relação das coscuvilhices que as engraçadas e desenvoltas irmãs me contaram. Inês.

MEDITAÇÕES - Está tudo doido



NÃO BASTOU COM O TAL BLACK-FRIDAY

Se a influência americana para cair no consumismo desenfreado já nos instalou os dias de compras insensatas, através de publicidade intensiva e enganosa, nestes dias recentes assistimos a que esta tentação irracional, mas pensada e tratada com profissionalismo e adesão total por quem vende, apanhou muitos bolsos já em estado de exaustão depois das despesas ligadas ao regresso das férias de verão e, nomeadamente, aos que tem filhos em idade escolar.

O calendário, porém, está de conluio com o comércio, e se já se entrou na fase das exigentes compras natalícias Tantas vezes absurdamente inúteis e despropositadas, mesmo que com o propósito de agradar a familiares e amigos, ou até para cumprir com compromissos profissionais. Não serão poucos os cidadãos que já esgotaram o seu topo de débito automático e estejam caindo, a pique, no crédito, com os implacáveis juros que só aparecem quando as mentes não pensam.

Ah! Mas as tentações do comércio não esperam que as cabeças dos adictos ao consumo tenham tempo e calma para pensar. Já estão preparando, e os compradores aguardando, enfeitar as suas montras com cartazes de DESCONTOS DE NATAL ou com o espanholizado REBAIXAS. E toca a gastar mais. Insistindo progressivamente no crédito.

Oficiosamente nos pretendem tranquilizar afirmando que o progresso económico do País depende de que a roda do comércio gire sem parar. PARAR É MORRER ! Raramente nos elucidam de que muito do que os nossos compatriotas compram foi importado, e que as facturas correspondentes empurram o deficit da economia cada vez para mais alto, sem que a produção de bens, tanto para consumo interno como para exportar (que é o mais importante nesta contabilidade) acompanhe neutralizando a evolução negativista.

O canto da sereia vai-se adaptando às circunstâncias. Todos recordamos as campanhas, mais ou menos disfarçadas, que se fizeram negando a qualidade dos visitantes mochileiros, que sujavam mais do que limpavam -em verdade nunca se entretiveram a limpar, nem sequer aquilo que eles mesmo sujavam- Mas agora, caídos noutra maré, tipo maremoto ou tsunami para os mais letrados..., recebemos a invasão dos que nos chegam canalizados por redes de contratação electrónica, ocupando, com as suas malas de rodinhas, que substituíram muitas mochilas, partes de casas particulares.

É um fartote! São a salvação do País !? Dizem que estes viajantes deixam muito dinheiro no comércio!? E no "bebércio!", porque encontram aqui o comer e o beber a preços que, comparando com os dos seus países, são da uva mijona. Podem comer bem, e beber até cair, por menos da metade do que despenderiam na sua terra. E nós, nem lembramos que o trigo com que se faz a farinha e o pão que compram barato, está com preço subsidiado; pois que também se importa quase na totalidade.

Após ter estas notícias favoráveis quem se atreve à decisão de amainar nas suas “necessidades” consumistas? Se o meu falecido sogro estivesse presente, tenho a certeza absoluta que diria, e com razão: Está tudo doido! Andam esgaseados ! (um termo do léxico popular que ficou desde o regresso dos militares regressados da frente de Verdum. Hoje só os mais velhos, vivos, é que o recordam)

segunda-feira, 9 de dezembro de 2019

MEDITAÇÕES - Dormir



O nosso corpo só para quando o coração desiste

O estado “letárgico” do nosso corpo necessita um período de tranquilidade, que normalmente qualificamos como sono. Mas será que recordamos que muito, mas mesmo muito daquele complexo sistema funcional que nos confere a vida, não está inactivo? Dou como certo de que todos temos consciência que o coração e os pulmões funcionam, mesmo que com marcha reduzida, e também sentimos que o aparelho digestivo não está em estado de letargia, incluindo o equipamento de depuração do sangue de que estão incumbidos os rins, em comandita com o fígado, pois que o fluxo de saída deste sistema de depuração, acumulando-se na bexiga, dá o alarme de ser necessário esvaziar. A não ser que o equipamento de aviso esteja deteriorado ou inactivo.

Mas o órgão de comando geral, que admitimos está concentrado no cérebro, ali na caixa craniana, este nunca deixa de trabalhar, não só coordenando as funções vitais como arrumando as mais recentes observações do exterior, mais as deduções internas, nos seus complexos ficheiros. E tal como nos acontece quando procuramos um livro nas estantes, o arquivista cerebral é atreito a consultar e manipular, a seu entender, o passado e o tornar quase que perceptível com imagens mentais que denominamos de sonhos.

Chegados à constatação de termos, no nosso corpo, sistemas internos que não descansam, mesmo que possam amainar no seu funcionamento, é de boa lei recordar a existência de outros muitos complexos funcionais, indispensáveis, e dos quais só nos apercebemos quando, por alguma eventualidade ou simples desgaste, deixam de estar devidamente activos que estas “indústrias” internas são obrigadas a ter um funcionamento contínuo, e por não auferem do merecido. Falta-lhes um sindicato activista que exija o justo descanso.

Ou seja, admitir, sem ponderar todos os factos ao nosso dispor, que se “dorme como uma pedra” é não avaliar esta afirmação na sua dimensão real: não passa de uma figura de estilo.

Não sei avaliar que proporção do nosso corpo está, ou admitimos que esteja, em estado letárgico quando dormimos. Possivelmente é muito pouco, pois nem o cabelo nem as unhas dão sinais de interromper o seu crescimento por um período concreto. Ou seja, admitir, sem ponderar todos os factos ao nosso dispor, que se dorme como se desligassem o corpo de uma tomada de corrente é errado.

sexta-feira, 6 de dezembro de 2019

MEDITAÇÕES - Criticar pelo mais fácil



A DESTRUIÇÃO DO MEIO AMBIENTE PELOS HUMANOS

O modo como muitas pessoas comentam a presença da adolescente sueca Greta, incluídas quem pretendem ser apreciadas como educadas, sensatas e até ciosas das boas causas, nos pode desorientar. Simplesmente porque notamos que preferem avaliar o facto pela parte mais sensível e fora de contexto. Claramente, tratam de tirar valor à acção acusadora desta rapariga baseando-se num diagnóstico de avaliação psicológica, não confirmado, que a ser correcto nem por isso lhe devia retirar o mérito de encarar este assunto com a intensidade que tem faltado a muitos adultos, tão sãos de cabeça e de espírio quanto os detractores.

Vasculharam a biografia e família desta adolescente e insistem em pormenores que os devia envergonhar, nem que fosse porque com esta atitude de acusar e denegrir pretendem esconder a sua apatia e conivência com os factos que, actualmente, são indubitavelmente conhecidos e considerados perigosos para a futura permanência da humanidade, e outros seres vivos, neste planeta que, por enquanto e assim continuará, é o nosso único poiso.

Se estes críticos boçais avaliassem a situação actual da degradação do meio ambiente, que nem sequer conseguimos travar, e muito menos eliminar para recuperar o que existia um século atrás, então quiçá alterariam o seu discurso. Tudo começou, com velocidade inusual quando ocorreu a celebrada revolução industrial, que com a máquina de vapor, os geradores de electricidade e os motores de explosão, abriram a porta dos fundos para chegar aos descalabro actual.

Se usassem os seus neurónios para pensar, estes mesmos críticos insensatos, que se ficam pelas ramas e desprezam o conteúdo, integrar-se-iam em multidões de activistas que, mesmo arriscando-se a ser considerados retrógrados, denunciariam que muita da evolução que nos rodeia é causadora de uma poluição nefasta incontrolável. Estes manifestantes, apesar de identificar a degradação ambiental actual, não sabem nem vislumbram projectos credíveis de a travar e eliminar. E o que conhecem está fora das suas capacidades de acção.

Os mais “modernos e evoluídos” devem considerar que estes propósitos de emenda, sem garantia de ser factível, não eliminam o perigo de destruição acelerada do meio ambiente, e que a isso corresponde  um atraso social de muitas dezenas de anos, ou mesmo centenas. A essa dedução, pessimista em extremo, mas negativista perante o problema, mais do que já confirmado e inegável, a atitude que penso seria mais positiva era a de recordar que a humanidade já ultrapassou, mesmo com perdas de enorme importância, catástrofes climáticas e geológicas, e que sobreviveu, até recuperou, lenta mas progressivamente, a capacidade de se adaptar às novas condições.

O que está acontecendo, especialmente com a incorporação, tanto nos mares como na terra emersa, de detritos não degradáveis, e que inclusive aquilo que nos dizem ser bio-degradável deixa um rastro de partículas, minúsculas, até microscópicas, que não estavam na natureza, e que esta natureza ainda não teve tempo de combinar de um modo estável e inócuo para a vida que se gerou, sob uma imensidade de formas evolutivas ao longo de milhões de anos, mesmo de eras, e que hoje sentimos estar em perigo.

Não tentaremos negar o que se conhece de grandes períodos de glaciação e outros de calor ou de subida do nível das águas. Muito se conhece e se pode observar (por testemunhos geológicos e até escritos) destas mudanças climáticas. Mas sempre as causas e correcções foram endógenas, sem a contribuição do homem. Foi a ânsia de saber como, porque e como alterar o equilíbrio que, nos levou a uma situação que parece repetir a ameaça bíblica de que todo o nosso mal estava concentrado na árvore do saber; do bem e do mal.

Terminada a segunda guerra mundial e insistindo na decisão de usar a potência que estava confinada nas partículas elementares, a denominada energia atómica, que nos convencemos poder domesticar, os chefes decisores viram-se confrontados com a terrível possibilidade de gerar uma catástrofe, que inclusive podia ter a consequência da destruição da vida se desencadeassem uma guerra nuclear. Por enquanto desistiram desta loucura. Mas a ciência não descansa, tem que avançar por outros caminhos, que cada dia vão surgindo mercê da inteligência destravada dos humanos.

E hoje não só nos responsabilizamos por uma artificial mudança da temperatura e daí do clima, como, por ser pouca coisa (?) ainda lhe acrescentamos uma progressivamente maior poluição, e consequente degradação.

Penso que os futurólogos que seguem os textos bíblicos -e não só, pois que outras profecias existem sem ser as que conhecemos e que, bem ou mal, acreditamos- não terão também os seus novos profetas. Uns e outros se debaterão com mais ou menos dificuldades para deduzir que os males que nos atingem (e que ainda não vemos na dimensão que estão próximos de atingir) são tão fáceis de explicar como eram os sonhos que o faraó relatava a Josué.

quarta-feira, 4 de dezembro de 2019

MEDITAÇÕES – Ganhar e Perder



ASSIMILAÇÃO, MISCIGENAÇÃO, SEGREGAÇÃO

Um das situações sociais que acompanhou, desde os primeiros homens erectos, e certamente ainda antes, quando andávamos como os gorilas apoiando o corpo também com os membros anteriores, é o modo como convivemos com os que não são exactamente iguais a nós. O que não garante que com os iguais andemos sempre aos abraços e beijos... Andar à pancada, facadas, envenenar e outros devaneios de convivência e tão próprio dos humanos como o espirrar.

Os arqueólogos, em conluio com os geneticistas da actualidade e os restantes estudiosos da evolução, nos alertam paulatinamente de que encontram novos elos da nossa ancestral cadeia evolutiva. E nem sempre estas descobertas se encaixam na sequência anteriormente definida. Quando era um jovem e inexperiente estudante as referências de humanos pré-históricos resumiam-se aos Crómagnon e aos Neandertal, com o consequente diferendo de se estas duas ramas evolutivas eram compatíveis, miscíveis, ou se uma eliminou a outra. Hoje creio ter lido que nem uma coisa nem outra, pelo menos em absoluto, que do encontro entre membros (e membras) duns e outros também geraram mestiços. E isso sem fazer referência aos seres que apresentam sinais corporais de que não estão muito longe do homem das cavernas, ou tabernas para que não as visualize como grutas.

Como as ciências evoluem sem descanso, ao analisar, geneticamente, inclusive fósseis humanos, sempre incompletos e petrificados, já se conseguiram identificaram outras ramas de evolução de hominídeos, o que veio complicar ainda mais a nossa estimada árvore genealógica. Esta confusão está em linha com a actual fúria vandálica com que se abatem as árvores vetustas.  

Se entrarmos em linha de conta com as condições climatéricas e de alimentação, próprias das zonas onde viveram aqueles que hoje nos aparecem como fósseis, justificam-se muitas mudanças permanentes e transmissíveis na estatura, na cor da pele e dos olhos, além do cabelo e mais pilosidade corporal. Estas alterações corporais ao se tornarem hereditárias conduziram a uma verdadeira confusão visual, que em épocas anteriores, mas recentes,  se pretendeu arrumar com a noção de existirem diversas raças de humanos.

A educação e civismo, que muitas vezes ofuscam em vez de esclarecer, renegaram deste conceito, digamos que pelo menos classicista, por decidir classificar os indivíduos por raças, como se os humanos fossemos (e somos) equivalentes a animais domésticos de convívio habitual, sejam cavalos, cabras, ovelhas, ruminantes ou aves de capoeira. Coisa feia! Intolerável no séc XXI! FICOU DECIDIDO, NÃO HÁ RAÇAS HUMANAS!!! o que não elimina as diferenças entre um esquimó e um cafre, como exemplos claramente opostos.

Felizmente que nos dizem ter terminado a escravidão humana, mesmo que ainda exista e não pouca. Devia ser um sossego poder adquirir, no mercado livre, algum prisioneiro/a avaliado pelo corpo, a dentadura (como os equídeos), a idade presumível e, como a nossa Igreja nos garantia que estes seres não tinham alma, podiam ser tratados com o rigor que fosse compatível com a sua rentabilidade. Os cuidados e atenções que o dono dos seus escravos lhes proporcionava deviam ser, ressalvando as distâncias temporais e físicas, com os que se dão a um tractor, uma ceifeira-debulhadora ou uma camionete.

Com a vantagem de que se podiam vender quando não fossem indispensáveis, e inclusive negociar as suas crias, mesmo aquelas que que tinham algum dos patrões como co-progenitor. Um escravo “clarinho” era mais valorizado do que um retinto. Uma confusão que pode ser habitual é a de imaginar como escravos exclusivamente indivíduos de ascendência africana (isso de ter que fugir do termo pretos é uma seca...) desconhecendo que também os havia branquinhos pois que podia-se ser condenado à escravidão por alguns delitos que o justificassem (?). Estes brancos deviam estar bastante sujos por falta de asseio, Mas entre os escravos do mercado encontravam-se amarelos, asiáticos de diferentes etnias e indígenas das Américas. Podemos aceitar que tudo o que vinha à rede era peixe.

Só para recordar a quem não saiba: O senhor feudal, cá do sítio e de todos os quadrantes europeus, era não só amo e senhor das terras como também dono absoluto dos seus habitantes, com os quais podia entreter-se a fazer as velhacarias que quisesse, inclusive matar e esfolar ou vender como qualquer outro bem transaccional. Entre nós, -no Portugal, como dizem os migras- até poucos anos atrás havia quem se referisse aos trabalhadores braçais do campo como servos ou ganhões, com uns direitos cívicos um pouco inferiores aos já diminutos dos seus amos, caso estes não fossem da estirpe dos “grandes senhores”. O termo amo já nos revela muita coisa...

Mais abaixo deste escrito aparecem, destacados, uns termos que estava previsto incluir no meio dos textos, pois que, sem dúvida, estão em sintonia com o carácter ambíguo do que mal escrevi. Os deixo passar com a certeza de que o leitor, ou leitora, os podem arrumar convenientemente no lugar devido do contexto (esta do contexto é boa, podem guardar para as palavras cruzadas)


Assimilação Compenetrar-se de ideias ou sentimentos alheios. Tornar-se semelhante. O oposto da segregação. Não confundir com as gorduras corporais excessivas, fruto da assimilação dos excessos alimentares; mesmo nas pessoas que afirmam que até a água os engorda (?)

Miscigenação Assimilação por mestiçagem, sem pretender a igualdade. Nada de confusões! Nem todos podem vir a ser um Almada Negreiros, ou um presidente de governo. O a fadista Míssia, que não é carne nem peixe.

Pragmatismo Valorizar só o que nos seja útil. Pode-se utilizar, erradamente, como um falso sinónimo de cinismo.

Segregação Opor-se, até com violência, à mistura racial. Promove a separação, o isolamento, castigando os atrevimentos de convivência, excepto quando é o patrão que os procura. Os cidadãos de terceira que querem galgar para a primeira especial e reservada sabem que devem aguentar com atitudes segregacionistas por parte dos que não os aceitam como seus pares. Pelo menos enquanto não tenham amassado grandes fortunas, sem trabalhar, como é óbvio.

segunda-feira, 2 de dezembro de 2019

MEDITAÇÕES – Como queremos o Exército Nacional.



Organizado com recrutas, profissionais ou voluntários?

Antes de avançar no tema de hoje, por razões que não são de interesse geral, entendo que é honesto referir que eu, pessoalmente, e por condições de isenção legal, não “fiz a tropa”. Portanto as minhas noções não estão baseadas num conhecimento em primeira mão. São mais o fruto de uma visão histórica e do que me foi possível deduzir do que vi, estudei e ouvi.

Tenho um conceito, empírico, de que na actualidade os jovens que atingem a idade em que habitualmente eram chamados a se incorporarem nas fileiras militares, no que se denominava de recruta, tal obrigação é vista, por muitos deles, como uma exigência abusiva e sem sentido. Estamos vivendo um longo período de paz na Europa Ocidental, anormal se olharmos para a história. Não há memória de um período sem conflitos armados entre vizinhos que se possa equiparar. Todavia reconhecemos que perto das fronteiras deste “pacífica” Europa continuamente deflagrem conflitos armados, e que em alguns deles inclusive se enviem militares de Portugal.

O que decidiu foi optar pelo voluntariado, tendo sido abolida a recruta obrigatória. Mas em compensação (?) abriram-se as portas dos quartéis para as raparigas. Já não exclusivamente para ocupar postos de não combate mas, pelo contrário, consideradas em igualdade de condições com os militares masculinos. Algumas mulheres já atingiram graduações e até postos de comando.

Esta versão pacifista que desobrigou a permanência, mesmo que temporal, nas forças armadas é practicamente geral em todos os países do ocidente europeu. Mas esta bondade decretada não garante nem descansa os que receiam a possibilidade de se iniciar um grave conflito armado. Não porque se respire um ar belicista que alerte sobre este ressurgimento, mas porque os especialistas entendem que as forças disponíveis actualmente para entrar em campo não se podem valorizar como suficientes se tiverem que enfrentar um inimigo forte e bem preparado.

A solução que se tomou, numa tentativa de equilibrar os efectivos por comparação com o estimado poder de um opositor, com recurso a voluntários-mercenários é a mesma que sempre existiu, e que foi uma das causas do declínio do Império Romano. Recordemos que a incorporação de tropas recrutadas nas colónias esteve vigente, com um peso numérico não desprezível, nos dois conflitos mundiais que ainda perduram na memória colectiva. A estabilidade e boa vida que os cidadãos romanos tinham na vida civil não os motivava para se oferecerem para incorporar as famosas legiões imperiais. Progressivamente foram admitidos, ou contratados, guerreiros que foram adversários temíveis na véspera e chegou o momento de que estar legiões, teoricamente sob as insígnias imperiais ou republicanas, deixaram de obedecer os seus comandantes romanos e ficaram leais aos seus conterrâneos “bárbaros”.

Recordemos que a incorporação de tropas recrutadas nas colónias esteve vigente, com um peso numérico não desprezível, nos dois conflitos mundiais Facto que por perdurar na memória colectiva, não é legítimo escamotear

Retomando a referência do Império Romano, reconhecemos que em todos os grandes conflitos se incorporaram mercenários, voluntários a soldo, mais fieis aos seus chefes de origem e às possibilidades de saque, do que à Roma dos togados. Ou seja, a parcela mental que pode incitar à luta para defesa dos símbolos da Pátria e, em consequência, o arriscar a vida para resguardar o que o soldado considera ser mais importante do que a possibilidade de ser ferido ou morto, não se pode esperar entre as tropas de voluntários estrangeiros, ou pior de mercenários. Nestes o travão para não desertar pode estar nas mãos dos oficiais que os controlam de pistola em punho, ou pelo medo que os do outro lado lhes imponham.

Os militares de carreira, que imagino não são muito estimados pela maioria dos cidadãos, por pertencerem a outra parcela da sociedade e com regras de comportamento próprias, não devem estar muito tranquilos com a situação actual neste ocidente europeu. Além de que não há memória de um tão longo período sem guerras, os estrategas não podem estar convictos de que esta “pax romana” possa ser eterna.

Há três factores, entre outros também importantes, que alertam os pessimistas: Um deles é o progressivo envelhecimento da população, com incremento dos não produtivos e a falta de nascimentos para compensar o deficit. Outro factor a ponderar é que a possibilidade de recuperar o montante populacional com elementos vindos do exterior e com características e religiões compatíveis com as dos autóctones europeus se verifica estar longe de ser geral; com a agravante de se verificar que a vontade de se integrarem na nossa sociedade não é evidente, antes pelo contrário. Os autóctones, em muitas zonas da Europa actual sentem-se em perigo de ser minoritários na sua terra.

O terceiro factor tem duas frentes diferentes. Por um lado o “sócio” poderoso que tinha a Europa na NATO com os EUA está derivando para um isolacionismo, pelo menos em relação aos problemas actuais e previsíveis da Europa Ocidental. Para completar o panorama teme-se, e com razão, a perda da hegemonia da Europa nos campos das tecnologias, produção de bens e serviços e capital disponível.

Não parece factível que estas nuvens negras se dissipassem devido a retomar a recruta obrigatória, nem que o treino de mais indivíduos já com valor antes de uma incorporação urgente, seja a solução. Nem sequer se pode avaliar como perto disso. Mas tampouco parece que confiar a nossa defesa do território e dos seus habitantes a voluntários, mais ou menos contratados como mercenários, nos possa dar uma garantia de segurança. Não deve haver Companhia de Seguros que se atreva a propor uma apólice neste problema.