domingo, 30 de abril de 2017

SOCIALISMO OU SOCIALISMOS ?



Parece insólito, mas ainda hoje há pessoas que colocam este, digamos que sentimento de solidariedade entre humanos, em pontos muito afastados de uma escala, associada a partidos políticos, onde cabe tudo e ainda sobra espaço para muitas fantasias. Se nos dedicarmos a folhear o dicionário, dando como certo que as definições que lá se colocaram mereceram uma acurada análise antes de as considerar como correctas, aquilo que lá aparece pode admitir-se como uma justificação, um pouco simplista e por isso passível de diferentes interpretações.

Social pertencente ou respeitante à sociedade; sociável; diz-se dos problemas que visam à organização e à satisfação das necessidades dos indivíduos em sociedade.

Socialismo sistema político-económico que preconiza, respectivamente, a direcção e domínio do Estado nos bens de produção e consumo, e uma nova distribuição das riquezas com a abolição do capital; doutrina que defende o predomínio da sociedade civil sobre o indivíduo. (1)

Apesar destas definições “oficiais”, que certamente foram sendo moduladas em conformidade com o tempo e a época, aquilo que se verifica é que, sempre e com o intuito de mascarar ou agradar aos que se deseja, interpretem a solidariedade, inerente ao socialismo mais puro, a fim de que adiram ao ideário do seu partido (ideário que raramente é especificado para conhecimento geral da população) Por isso encontramos programas e interpretações capciosas em grupos pertencentes a patamares de comportamento bastante diferentes entre si, quando não nitidamente opostos.

Para nos ajudar a ver como se usam estes termos, interpretando-os como lhes convier, recordemos que a União Soviética, onde predominou uma ditadura “do proletariado”, que sacrificou o seu próprio povo e outros onde conseguiu entrar, sem o mínimo respeito. Apresentava-se nos organismos internacionais com o nome, em siglas, de URSS que corresponde a União de Repúblicas Socialistas Soviéticas. Paralelamente, na Alemanha Hitleriana pontificava o regime NAZI, que por extenso diziam ser Nacional Socialista, onde a desigualdade de trato para os seus nacionais foi bem notória.

E não foram só estes partidos totalitários aqueles que se auto-qualificaram de sociais. Na actualidade temos uma série de partidos políticos onde o termo socialismo associado aos termos “democrata e cristão” não garantem nada sério, pois neles se acoitam os membros mais conservadores da sociedade. visceralmente com pouca vocação para beneficiar os cidadãos das camadas mais carenciadas.

Ou seja, apesar de que, segundo eu julgo saber, a maioria das pessoas entendem como correcto aplicar um pensamento social, na doutrina que deve prevalecer, ou deveria, na tal doutrina social da Igreja, e que corresponde ao sentimento de conseguir encontrar uma via de trato humanista e igualitário para todos os membros da sociedade, quando se chega ao momento de agir o tentar igualar é uma utopia, pois que, como reza o ditado Entre dizer e fazer, muita coisa há a meter, ou o seu equivalente Entre ricos e pobres não há parentesco. Ou seja, nem sempre é factível uma repartição equitativa de bens terrenos. Mesmo assim sempre vão surgindo oportunidades de ir remediando injustiças e poder aplicar as noções mais puras e altruístas do socialismo real.

Ou seja, pendurando este parágrafo nas duas últimas palavras anteriormente escritas, não é correcto, nem corresponde à realidade dos humanos, entender que o socialismo militante, o dos elementos extremistas de partidos ainda com sentimento totalitário, que não aprenderam da sensatez que existe naquele aforismo, que se cita, quase sempre jocosamente ou com maldade e denúncia, de que somos todos iguais, mas uns são mais iguais do que outros.

Não é necessário referir que existem diferenças intrínsecas e que elas podem ocasionar desigualdades nas oportunidades que o percurso de vida de cada um apresenta. De facto todos nascemos nus, mas a partir daí uns crescerão mais do que outros; uns ficarão magros ou esbeltos enquanto que outros terão tendência para ser robustos; uns serão ágeis no pensamento enquanto outros se mostrarão lerdos; uns gastadores e outros amealhadores; haverá faladores e silenciosos por vocação; etc. Um sem fim de modulações que nos diferenciam e que podem, fatalmente, conduzir a que se situem em patamares diferentes na sociedade. As tentativas de igualar por baixo, sempre se mostraram desastrosas. Tal não implica o tentar remediar, socialmente, e tanto quanto nos for possível, agir positivamente nos aspectos que estejam à mão de cada um de nós.


(1) estou usando a 5ª edição, sem data de impressão, mas que segue as normas de ideologia do Estado Novo. O sublinhado é meu, e destaquei porque, a meu ver, subtilmente, contraria a rigidez programática precedente.


sexta-feira, 28 de abril de 2017

PESCANDO FRASES VI

PEDI A NACIONALIDADE PARA PAGAR IMPOSTOS Pilar del Rio

Viúva de José Saramago (pseudónimo literário e “de guerra”) é uma personagem que, durante bastantes anos, com a qual não simpatizava, mesmo de longe pois que nunca a vi de perto, nem desejava tal encontro. Do pouco que conhecia criei a noção de que foi muito volúvel, apesar de que todos os humanos o sejam, nem que seja por vocação, não realizada, fosse por falta de oportunidade ou por simples covardia. Além disso a qualifiquei de oportunista por se aproximar de Saramago por sentir que ali havia seiva poderosa, e que, como se verificou posteriormente, ela tinha os conhecimentos na imprensa e intelectualidade espanholas capazes de o ajudar a criar um cartel num país onde não existiam os anticorpos criados, politicamente na sociedade do seu Pais de origem. Preconceitos ainda fortemente activos nas gerações mais adultas.
Depois de ler a sua entrevista no Expresso senti que, como na aioria das pessoas, tinha facetas que se devem apreciar respeitar, ouvir, ou ler. Culpabilizo-me de ceder, em demasiadas ocasiões, a impulsos viscerais ao avaliar pessoas, e pior quando aquilo que julgo conhecer ofusca, perniciosamente, o bom discernimento.
Neste caso particular admito terem sido as circunstâncias paralelas à pessoa Pilar del Rio que condicionaram a minha avaliação. Sem dúvida que não fui influenciado pela fama do seu inicialmente companheiro e depois marido oficial, convicto activista político, num partido de cariz intensamente esquerdista, o que lhe concedeu o estatuto de empestado entre os cidadãos que se consideram defensores de algo que nem eles sabem o que é na actualidade. Já coloquei aqui um escrito onde especulo sobre o interesse dos saudosistas em retroceder umas décadas, provocando os opositores.
Daí que, para contrariar os bem pensantes, tenho um bom número de obras de Saramago na minha livraria. Que li. Mesmo aquelas que foram redigidas, tal vez propositadamente, de modo a afastar os leitores que preferem textos amenos. Também escreveu obras deste teor, que se não chegaram ao grande público andaram perto disso.
O “azar” que mantinha sobre Pilar del Rio nem sequer correspondia a factos concretos, indiscutíveis. Sabia que as suas origens eram de uma família aderente ao nacional-catolicismo, e que inclusive tinha sido freira. Desconhecia que o seu pai, apesar de católico oficial, foi frade e deixou os hábitos e casou, gerando uma extensa prole. Aspecto que, até certo ponto, é comum ao do pai do falecido Mário Soares. Daí que, dada a minha ignorância e preconceitos, não explicava o facto de se ter ligado a uma personagem situada no extremo posto do leque político em que foi criada.
Tudo fica esclarecido, até certo ponto, pelo facto de que, desde muito nova, Pilar del Rio se mostrou contrária às normas de conduta então vigentes, tanto na faceta do comportamento pessoal como o de não gostar de obedecer à política imposta. Ela explica como a partir de um contacto meramente literário se criou uma amizade e um sentimento que conduziu ao casamento e, mais tarde, já falecido o escritor, a solicitar a mudança de nacionalidade.
Pilar del Rio especifica as razões porque decidiu tomar esta atitude, de “renegar”da sua nacionalidade por nascimento e família. A que alega ser mais importante é que os seus rendimentos e os da Fundação devem ser cotizados em Portugal. Não considerava correcto declarar rendimentos em Espanha onde, por sinal, pagaria menos impostos. Mas considera, e bem, que a sua decisão contributiva lhe outorga o direito de ficar colérica de cada vez que gastam mal o dinheiro (sic)
Assim como não esconde a dificuldade, quase inultrapassável de ser vista como mais um português. Por mais conhecidos que tenha herdado do falecido marido, e dos colaboradores fieis e atentos na Fundação, sabe e sofre internamente por ser considerada uma forasteira, uma espécie de intrusa. É muito provável que este isolamento seja a consequência do exílio voluntário de Saramago para a ilha espanhola de Lançarote. Um afastamento que devemos compreender dado o acto cometido, oficialmente, por um membro do governo de Portugal.

Por mim sei o que sente, mesmo implicitamente, apesar dos sorrisos e boas palavras de amizade. São muitos séculos de martelar as mentes com o perigo espanhol, com o mau vento e mau casamento. E nem sequer neste século e numa fase histórica em que deixaram de existir fronteiras com barreiras e polícias, continuam a insistir nos conflitos do passado, inevitáveis, quando só se tem um país na fronteiras

quinta-feira, 27 de abril de 2017

DEPOIS DE MORTOS


Os que são propensos à benignidade não poupam os elogios para quem deixou este mundo. Mesmo que este empenho laudatório refira facetas que não correspondem à realidade. Poucos escapam desta maquilhagem e menos aqueles que, ainda vivos, preveem que para eles não se cumprirá o hábito social.

Cujo aqueles cujo comportamento em vida foi de molde a receber as piores qualificações por parte da comunidade, incluídos os que ganharam, com o seu esforço, a imagem de facínora encartado, com uma longa ficha de referência dos seus abusos, delitos e crimes, terão os seus sempre fieis, que com afinco tentarão limpar a sua nefasta memória.

Esta duplicidade na reacção da sociedade quando alguém nos deixa será ecuménica? Ou é quebrada com aquele respeitoso silêncio daqueles que não sabendo o que dizer de positivo tampouco desejam manchar a sua própria estampa caso se decidirem a denunciar, ou esclarecer, sob o seu ponto de vista, qual era de facto era a personalidade daquele que, ao falecer, fez o seu maior serviço possível à sociedade?.


Seja como for, atendendo ao axioma de que Morre o Bispo e morre o Papa, de morrer ninguém escapa, tenho que admitir como certeza inabalável o facto de estar perto a incineração do meu corpo já alquebrado. Assim como também tenho a certeza, baseada no meu repulsivo “feitiozinho”, que preferiria qualificar de feitio, sem diminutivo carinhoso, não incitarei ninguém a dedicar palavras simpáticas ou severas. Isto porque deixei bem recomendado que a minha morte não seja referenciada além do reduzido círculo de familiares de primeira linha. 

quarta-feira, 26 de abril de 2017

CONFESSAR OS SEUS PECADOS

De facto confessam-se para continuar na mesma. Iris Murdoch

Antes de me dedicar a divagar sobre esta frase, cuja importância não podemos menosprezar, quero deixar bem evidente que não é meu propósito magoar aqueles que são sinceramente crentes.

Penso que muitos somos cientes de que a nossa infância nos marcou indelevelmente, mesmo sem que no dia-a-dia dermos conta disso. Darei um exemplo pessoal de um hábito infantil, que desde o seu início tentaram reprimir mas que, periodicamente reaparece, para espanto de quem partilha uma refeição ao meu lado.

Sei por memória e porque tal me foi recordado pela minha mãe, que sempre fui vagaroso a comer. Raros eram, e são, os manjares que me incitassem a um deglutir anafado, e que instintivamente tento alterar o conteúdo que me foi colocado à frente. O método mais habitual é seleccionar um dos componentes e ir petiscando nele, ou deixando-o de lado no prato, como se assim conseguisse ter duas “especialidades diferentes a partir do mesmo cozinhado.

Aquele onde caio com mais frequência, e sempre no caso de ter a cabeça noutro lugar, é o da sopa de caldo com massa, em geral cotovelos. Ali começa o desgosto de quem me acompanha, e embora existam duas variantes, ambas lhes causam o mesmo desconforto visual: ou apanho a massa, deixando escorrer o caldo inclinando a colher no rebordo do prato, até terminar com a última peça naufraga, para depois poder comer toda amassa a seco e depois dedicar-me ao caldinho como se fosse a melhor iguaria deste mundo.

Ou, em alternativa, mergulhar a colher com cuidado e ir engolindo o caldo em primeiro lugar e depois, quando a massa ficou a seco, como numa maré vaza, dedicar-me à massa. É a minha vingança silenciosa contra um cozinhado que não me apetece aquele dia.

Um filme que se repete com outros ingredientes, como seja o ter salada no mesmo prato, cuja presença me incomoda por trazer água e tempero diferente do resto. Então ou como a salada toda de uma vez, antes de tocar no resto, ou, em alternativa, empurro a salada para um sector do prato que previamente deixei vazio, e comer no fim.

Na vida social, que progressivamente foi reduzindo-se, por minha causa, sempre procedi de forma parecida. Aqueles que, por qualquer razão, senti que as suas opiniões ou comportamentos, eram incompatíveis com as minhas regras pessoais, fui deixando de lado. E dada a complexidade de cada um de nós, o meu extremismo e excessiva auto-valorização, em simultaneidade com uma reduzida complacência ou respeito pelo labirinto que também existe na mente dos outros, conduziu a que os outros também optassem por me rejeitar. Coisas.

Este longo introito pessoal pode servir para esclarecer o porque esta frase, de uma filósofa já falecida, me chamou a atenção.

Já referi, noutros escritos, que na primeira infância era frequentador, induzido, das cerimónias religiosas. Mas creio que não citei que na escola conventual nos davam um cartão no que figurava o nosso nome e que na periferia vinham os números do dia do mês. À porta da igreja estava um freira com um alicate de revisor com o qual picava o número correspondente. Uma forma “muito subtil” de controlar com descaro e ganhar adeptos!

Como o meu interesse pela cerimónia era reduzido, embora soubesse o que por lá acontecia, e teatralizasse q.b., dedicava muita atenção a observar a assistência, em especial às pessoas que já intuía serem de destaque naquela paróquia. Mais tarde, já na rua, se nos cruzássemos com algum daqueles indivíduos, incluídas “senhoras”, que vi comungar e retirarem-se para o seu lugar com cabeça baixa e ar compungido, e o referisse a quem me acompanhava, em muitas ocasiões, em vez de ouvir o comentário de que tal era uma boa pessoa, respeitável e sem grandes faltas conhecidas, noutras vezes, as mais, diziam-me que era um torcionário, um sádico torturador, um denunciante, um velhaco, um mau elemento. É o que me veio à mente quando li esta frase, que por isso a destaquei.


Antes de encerrar é preceitual esclarecer que isto aconteceu no período mais negro da repressão fascista, comandada pelo ditador Franco. Apesar de estarmos a muitas décadas dos factos a periodicidade com que as situações se repetem e o desejo de muitos de ficar bem vistos, abdicando do seu auto-respeito, faz com que, em silêncio, duvide muito da profundidade da fé e bondade inerente dos que publicamente se mostram identificados com alguma religião, especialmente se esta é, por índole, absolutista, acumuladora de riqueza e até repressiva, mesmo que practique um bondoso disfarce.

segunda-feira, 24 de abril de 2017

SENTIR VERGONHA

TER VERGONHA

Dou como certo que cada um de nós chega o dia, o momento, em que ficamos envergonhados por alguma coisa teve origem nalgum acto que cometemos. Normalmente este fase de penitência mental passa com relativa rapidez. Até que, inesperadamente, e mais se temos consciência de que outros observaram, votamos a sentir este peso mental, seja porque algo aconteceu que pode macular a nossa honra, por acanhamento ou por termos faltado ao decoro. Por sorte em ocasiões os fados nos favoreceram e verificamos que, pelo menos aparentemente, ninguém deu por isso; daí que não houve desonra a lamentar.

Mas existe um sentimento de vergonha mais difícil de engolir, seja em seco ou em molhado. Refiro aquilo que qualificamos como de vergonha alheia. Em principio sinto que este sentimento, penoso e sem possibilidade de poder controlar e muito menos de anular, pode aparecer por diversas razões, mas sempre porque uma entidade ou uma pessoa, a quem dedicamos amizade e fidelidade, manifesta-se com afirmações e propósitos que não encaixam com a personalidade que mereceu a nossa afeição.

As mesmas atitudes se tomadas por indivíduos que nos sejam indiferentes podem provocar rejeições viscerais, mas numa escala não afectiva.

Podia tentar alongar este tema,como é meu hábito, mas como o impacto que me marcou foi profundo, não me sinto em condições de continuar. Como escrevi antes, subentende-se que a vergonha própria deixa menos marcas do que a vergonha alheia. Neste momento não me sinto em condições de tentar raciocinar a fim de explicar esta diferença de grau.


FASCISMO versus COMUNISMO



As décadas de paz no Ocidente e a implosão do consumismo deram uma reviravolta no panorama político que herdamos, pelo menos na nomenclatura dos partidos. Apesar desta sensação de existirem menos entraves na adquisição e desfrute de bens e serviços, incluída a muitas vezes enganosa noção de ter bens imóveis, quase sempre centrados na “compra” de uma casa de habitação para acolher a sua família, o facto de ter que pagar o IMI já os torna proprietários perante o fisco.

É pertinente ter a noção de que, pelo menos entre nós, o tempo das ditaduras extremistas só permanece activo na mente dos extremistas dos dois lados opostos. Fora deste grupo perigoso que, como os necrófagos urubus, sempre estão aguardando a sua oportunidade para se locupletar nos bens alheios e em instituir a repressão cega, com a qual podem entregar vítimas aos sádicos esbirros que são os alicerces do seu poder. Entre as hostes dos dois movimentos, que estão desfasados no tempo, pelo menos entre nós, existem os que negam participar nas zonas negras do seus estimados, embora nunca façam nada no sentido de promover a sensatez e o humanismo real.

É lamentável o facto de que na Europa comunitária e por um complexo leque de circunstâncias, umas próprias e outras com génese fora, criou-se um clima de incerteza e temor. Uma das facetas deste nervosismo é a presença, cada dia mais notória, de gentes que sendo oriundas de áreas onde a religião imperante é o islamismo - com várias estirpes que guerreiam entre si- que não aceitam de bom grado a adopção dos hábitos e costumes do país que, propositadamente, escolheram para que os acolhessem. O que sim lhes agrada, e não dispensam, é o poder aproveitar, no máximo, todas as ajudas sociais que, com extrema benevolência, os governos colocaram à disposição destes migrantes.

Além deste foco de inquietação e descontentamento, é pertinente recordar que existem outros temas que influem na vida social das populações das camadas abaixo dos muito bem instalados. Sendo assim o clima de revolta contra o sistema, mesmo que pouco analisada por parte dos descontentes, está condicionado aos efeitos provocados pela desindustrialização, pelo livre comércio e pela ainda não estabilizada a nova economia.

A utilização destas inquietudes por parte dos conservadores, interesseiros como lhes é apanágio, e também saudosistas da sua ditadura, lhes proporcionou um caldo de cultura para poder avançar no seu desejado percurso para o poder total e, como futuro inevitável, desfazer tudo o que puderem do, para eles nefasto, estado social.

Estes conservadores, claramente neo-fascistas, tratarão de reduzir, reduzir, ainda mais, e anular as reformas pelo trabalho (que o governo actual também tem na sua mira); o atendimento médico pelo SNS a quem não tenha capacidade económica para se dirigir à medicina privada; descurarão, progressivamente, o apoio à velhice e, se conseguirem dominar por completo a sociedade, induzir, subtilmente, a eutanásia dos dispensáveis, que obviamente serão aqueles que não pertencem ao seu grupo de eleitos. E outros motivos de acção estão, com certeza, na sua ementa de actividades que desejam fomentar.

Entre nos, como sabemos ou deveríamos saber, o socialismo nacional está mais desnatado do que o leite magro. O benfeitor da Pátria, recentemente falecido e merecedor de vir a ocupar um belo sarcófago num lugar de alto relevo, e mais os seus parceiros, depois de seleccionados por ele mesmo, encarregaram-se de só manter a sigla partidária, pois pragmáticamente sabiam que, sendo já burgueses (ele desde nascença) e outros porque engordaram pelo caminho, a população normal, os que quer é sopas e descanso, não está propícia a invadir propriedades, tanto rústicas como urbanas.

A insistência em maldizer do socialismo utiliza um alvo errado. Os socialistas de hoje são exclusivamente partidários de que o governo não utilize as classes média e baixas só para as sangrar, e que as melhores fatias deste espolio sejam dirigidas aos capitalistas que apoiaram as suas campanhas.

Nem sequer há que recear as “feras” dos partidos comunista e os da sua esquerda, que gostam de vociferar para provocar o alarme. Esta zona do espectro político nacional está numa fase residual, e só crescerá se os conservadores os provocarem. Sabem que a população que “deveria” ser o seu alvo de captação de votos não quer colocar as “suas galinhas” à disposição dos exaltados.

Quando era novo, jovem, era frequente ler e ouvir, vindo dos católicos progressistas e dos da esquerda mais bonzinhos, que Jesus foi o primeiro socialista da história. Curiosamente este Jesus não tinha nada para dar neste mundo, nem sequer trabalhava par poder distribuir um pecúlio. O que ele oferecia era uma utopia, que dava como certa e indiscutível. Mas os humanos, se esceptuar os eremitas vocacionais, gostam dos bens terrenos, de comer -bem e bom se for possível- de vestir roupa nova e dentro da moda imposta, de habitar e de passear, nem que seja no low-cost.


domingo, 23 de abril de 2017

PESCANDO FRASES V


A luta de classes conduziu à democratização da guerra.
José L.Pardo – filósofo espanhol contemporâneo

É necessário mergulhar mais no texto deste pensador para poder dar uma ideia do panorama inédito que existe actualmente.

As possibilidades de difusão, interacção e ainda o poder invadir e alterar, electrónicamente, documentos e escritos de índole reservada, à distância e com ocultação difícil de evidenciar, constitui a mais terrível arma que se colocou à disposição de indivíduos que estavam fora do sistema dominante.

Podemos avaliar este acontecimento como sendo mais perigoso,pelas consequências inicialmente inapreciáveis, do que o terrorismo clássico que neste momento coloca em ânsias a população, não só do que chamamos de mundo ocidental como está presente em muitas zonas do globo que, por hábito, não constavam da nossa lista de preocupações imediatas.

Antes do aparecimento da pirataria informática, o sector burguês da sociedade dispunha, em exclusividade, à sua disposição todos os meios policiais e militares para poder atacar os membros das camadas inferiores sem o risco de sofrer baixas, pelo menos num quantitativo alarmante.

Quando rememoramos as grandes contendas militares entre países que se tornaram beligerantes, vemos que antes de abrir fogo foi necessário aplicar enormes somas de dinheiro para armamento, agrupar e adestrar o sua carne de canhão, e também dedicar esforços na doutrinação do seu povo para que aceitasse a ideia de que abrir aquela contenda era fundamental para o seu amado país, afirmando que sabiam como o pretenso inimigo estava preparando-se, intensamente, para nos invadir. E que o governo estava disposto a vos defender a tudo o custo. Todo aquele discursar falacioso que conhecemos, sempre ocultando os verdadeiros motivos que os impulsam para a belicosidade.

Continuando com o passado sabemos que, mesmo naquelas consideradas como revoltas populares, nos casos em que tiveram sucesso, sempre careceram de personagens pertencentes às camadas mais superiores da sociedade para os orientar, pois que os labirintos do poder instituído não estavam no rol dos conhecimentos do povo. As classes inferiores tinham um horizonte limitado à igreja, à polícia, dos cobradores de impostos, dos diferentes burocratas que os desorientavam e espoliavam, e finalmente as cadeias.


Daí que, até hoje, só aqueles que tinham tecto e sobrevivência garantida é que podiam organizar e dar uma visibilidade ampla ao movimento reivindicativo. Que por sua vez podem ter imaginado mas por não ter contacto directo com o povo -hoje dizemos as bases, mais imaginadas do que reais- ficavam os dois sectores impotentes, sujeitos à repressão inevitável. Hoje, com a democratização da informática, mesmo que não totalmente abrangente para todo o sector menos letrado da sociedade, possibilitou que muitos anónimos possam, desde os seus ninhos, provocar situações potencialmente perigosas. Já nem carecem de se juntar em grupos, mesmo que pequenos, de conspiradores. O hacker pode permanecer não só anónimo mas com uma imagem mundana de inocência totalmente imaculada. Só comparável à dos espiões infiltrados que foram bem sucedidos, já que jamais se descobriu quem estava sob o disfarce.

PESCANDO FRASES IV


  • Os que nasceram católicos são uma raça diferente. Iris Murdoch

Um pensamento que sendo da autoria de uma irlandesa, católica e, como se não bastassem estas credenciais, era filósofa, merece ser lida e analisada com respeito e atenção.

A minha experiência pessoal não me proporciona ponderar o tema concreto com conhecimento de causa próprio. Todavia nasci num país onde, desde séculos, os seus governantes se colocaram ao lado do Vaticano, alegando ser um bastião fiel e defensor “até à última gota do seu sangue” da fé cristã, e mais adiante do catolicismo. Sendo, pessoalmente, céptico e já ateu convicto, há muito tempo que duvido da boa fé dos decisores e, em contrapartida, pendo mais para as conveniências que orientaram, e ainda hoje orientam, as opções que os do topo tomam em nome do “seu povo”, sem se preocuparem muito sobre as opções que os seus súbditos pudessem ter, caso lhes fossem permitidas.

Tenho que sair deste trilho porque seria longo explicitar aquilo que bule dentro de mim. Só direi que com manha, cinismo e pressão consegue-se meter nos costumes da população aquilo que se quiser. Cada um pode, e deve, se as pistas que aí coloquei o incentivaram, procurar a documentação idónea para ficar esclarecido.

Retomando o relato pessoal. Já deixei escrito que a minha escolaridade pré-primária e primária esteve a cargo das freiras de um colégio anexo a um convento, algo que ainda é muitíssimo comum na Espanha. Sendo assim estava eu sujeito à doutrina católica vigente, com toda a panóplia inerente.

Em casa, a fim de não me baralhar em excesso, não era pressionado no sentido contrário. Tanto assim que, segundo me relatava a minha falecida mãe, todas as noites e quando devia entrar na cama, a minha mãe acompanhava-me para verificar se me ajoelhava em frente do leito, com as palmas das mãos unidas para orar, e rezava a ladainha que me tinha ensinado a freira encarregada da catequese. Iniciada a minha comunicação, do fim da jornada, com a divindade a mãe retirava-se e deixava-me à vontade.

O relato continuava com aquilo que,inesperadamente, surgiu numa manhã, quando me levantei. Fui ter com ela e lhe disse que na véspera não tinha rezado, e vendo que não morri, que não fui para o inferno nem aconteceu nada de novo, tinha decidido não mais rezar.

Uma decisão deste teor e numa idade tão inicial só podia ser factível numa família que fosse respeitadora das opções de cada um, incluídas as crianças. E ainda que os seus progenitores, e educadores de casa, não fossem uns crentes activos, fervorosamente aplicados no seguir todos os preceitos da Santa Mãe Igreja.

Vendo a frase de Iris Murdoch com a amplitude que merece temos que aceitar ser a sua mensagem aplicável não só ao catolicismo como a qualquer outro credo, pois que todos eles sistematicamente, não admitem discussão sobre os pilares da sua doutrina. Mas nem só de ascese e religião vive a humanidade. Há muito mais temas absorventes que, uma vez agarrados, tornam difícil o poder romper laços quando já se incrustaram no pensamento.

É o caso, entre muitos outros, do nacionalismo intensivo; do fanatismo político; das opções partidárias; do clubismo, e de outras facetas que, ao longo da vida, nos atam a determinadas opções. São as crenças, que julgamos racionais mas que não as tratamos como tais, porque não as discutimos, nem sequer interiormente.


Veio-me à memória a visão de fanáticos de equipas de futebol que decidem, sem esperar pela opção racional da “vítima”, vestir os filhos, que ainda não falam nem andam, com a farda do seu amado clube. E a mascarada continua pelos anos fora. Levam-no ao estádio, mostram-lhe como se grita incentivando os seus, insultando os outros e qualificando o árbitro com os mais grosseiros e desrespeitosos insultos, que incluem a mãe do alvo. Imagino que deve ser muito difícil, mesmo no limite do possível, poder-se libertar deste fanatismo, que lhe foi transmitido no seio familiar, que é donde se deve educar e deixar caminhos de vida correctos e favoráveis.

sábado, 22 de abril de 2017

PESCAR FRASES III

A IRONIA É A QUINTA ESSÊNCIA DA VERDADE. Millôr Fernandes

O brasileiro autor desta frase (1923-2012) foi um fino humorista e pensador, muito celebrado no Brasil e entre nós.

O facto de que um humorista de renome refira um capítulo específico da sua arte, e com tão parca frase, é como desnudar-se em frente de todos os leitores, na imensa maioria desconhecidos. Mostrou quão importante era, para ele, o poder da ironia, onde mascarando o que se pensa, e o que se pretende, utilizando o dissimulo, com frases aparentemente laudatórias ou inócuas, deixa a ideia de que a sua mensagem é oposta. O viciado na ironia consegue, com um comentário aparentemente inócuo, inocente, atacar a vítima, com cínicos sorrisos.

De facto a ironia é a arma mais letal que um humorista pode utilizar, sempre e tanto que tenha um arquivo dialéctico e uma finura na apresentação do seu discurso indispensáveis para conseguir desorientar a vítima. Sem que o espectador atento, e treinado, não deixe escapar a farpa. A vítima, duplamente vítima, além de ser gozada com subtileza, normalmente fica impedida de retorquir. Só os mais treinados nos ataques verbais florentinos é que podem ganhar ao humorista irónico.

Por existir este risco, de o carrasco virar a vítima, com o gáudio da assistência, é imprescindível conhecer previamente as características e capacidades de quem se pensou ironizar. Não há pior vexame para um humorista, seja amador ou profissional, que lhe apareça pela frente quem seja capaz de o derrubar com as suas próprias armas.

Aquilo que convêm ficar bem claro é que com o uso da ironia podem-se conseguir apreciadores. Sem dúvida necrófagos que deleitam-se com as humilhações alheias. Dificilmente conseguirá fazer amigos. Antes pelo contrário, criará inimigos e perderá anteriores amigos caso tiver a infeliz ideia de aplicar este agressivo humor sem ponderar riscos


SER CÉPTICO



Após consultar o dicionário da língua lusitana que tenho na mesa de trabalho, e que por ter sido compilado e editado antes do repelente desacordo ortográfico, merece o meu mais profundo respeito e até veneração. Caso este sentimento for permitido por aqueles que o reservam, em regime de exclusividade, para entidades com chancela vaticana. Sendo também coerente afirmo a minha convicção de que ser céptico implica carregar um peso social difícil de suportar e, caso não bastasse, ser visto como um ser indesejável, a-social, dada a sua insistência em destruir as convicções que tanto agradam a muitos cidadãos, valorizados como normais.

O dicionário diz: céptico é aquele que duvida de tudo o que não é evidente; incrédulo; pirrónico; pessimista; teimoso; obstinado.

O que me faltava saber! Dando fé à cultura sou, e não sabia, seguidor de Pirrão, que consta ter sido um filósofo grego que viveu, pouco mais ou menos, entre 360 a.C. E 270 a.C. Para compensar, pelo menos anímicamente, existe no santoral cristão o conhecido Santo Tomé, que insistia em que só acreditava se visse ou tocasse. Um sentimento bastante comum entre os galanteadores. Como podem testemunhar as meninas que são assediadas por aqueles “polvos”, tantas são as mãos que anseiam por manusear os seus corpo. Mas também pode ser que, na actualidade, as reticências femininas tenham desaparecido.


Mesmo depois de consultar, a vol-d'oiseau, alguns textos filosóficos não fiquei minimamente tranquilo por saber que os cidadãos, na sua imensa maioria, não apreciam ou nem sequer aceitam que alguém tente liberta-los de algumas convicções, crenças ou mitos que não resistem a uma abordagem racional. A reacção habitual é a de se fechar e afastar-se de quem o contrarie, com a mesma tensão que aplicaria a um apestado.

A PROPÓSITO DA BRINCADEIRA PICTÓRICA



Logo de entrada tenho que manifestar que sinto vergonha de ter colocado aquela imagem no meu espaço “privado e público em simultâneo)

A brincadeira deveria ter ficado em casa, escondida fora das vistas de quem nunca nos visita. Mas pior do que isso foi o facto de não ter conseguido centrar a imagem, retirar as parcelas que entraram sem ser convidadas e que, depois de um amigo recentemente falecido, ter tido muita paciência para me explicar como funcionava a técnica do fotoshop e o poder colocar imagens num texto, coisas que fiz durante anos tudo se me varreu, vergonhosamente.

Sem pretender justificar a realidade atribuo esta degradação memorística ou mesmo mental, a que devo ter uns ocos enormes na mioleira. Uns falhanços que, de per se, deviam-me indicar que chegou o momento de parar, e aceitar na bondade de ficar hipnotizado em frente da TV desde o desdejum até o fechar das persianas oculares.


Já agora, e voltando ao meu desvario. Aquelas caricaturas, na maior parte com mostras de decadência e uso desmedido na sua profissão de mundanas, cocotes, marafonas ou simplesmente putas, incluídas as que foram registadas legalmente com “simplesmente” Maria, não correspondem a alterações maldosas das faces de pessoas concretas. Hoje, ao olhar para esta “obra prima” encontrei, além de algumas que parecem travestis degradados, uma das vestais com bastantes semelhanças com uma das filhas do apreciado maestro com bengala. Não foi de propósito. Calhou, ou os pincéis pregaram uma partido, sem o meu consentimento.

sexta-feira, 21 de abril de 2017

O MEU MAIS RECENTE DESVARIO


Entre outras possibilidades optei por GRUPO DE VESTAIS DO BAIRRO ALTO LISBOETA NA DÉCADA (decadente) de 1950
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PESCAR FRASES II



A oração era o melhor modo de deixar de pensar. Iris Murdoch.

Quando ainda era um tenro infante, inocente, e estava inscrito num colégio religioso, nomeadamente num convento de freiras de São Vicente de Paul, tinha sessões de catequese e, pasmem-se, era o mais conhecedor do tema. Tanto assim que no dia em foi decidido preparar os alunos em idade de receber a primeira Eucaristia, fui escolhido para ficar na cabeceira da fila e os outros seguirem o meu exemplo.

Mas recordo que já naquele então tinha uma adversão, possivelmente congénita, em decorar as diferentes orações que a freira teimava em me ensinar. Durante anos ainda permaneciam em mim farrapos mentais de alguns destes elaborados textos. Mais tarde aconteceu como com a tabuada, que aprendíamos com o apoio de uma cantilena. Não tardou a que só ficasse gravada a “música”, e a letra fosse substituída por alguns truques que permitiam saber as respostas sem recorrer ao arquivo automático. Havia uma que tinha o visual bem fixo, a do 9. Aquilo de que na coluna dos resultados o algarismo da direita descesse e o da esquerda subisse era fantástico. Suponho são conhecidos de todos os que foram pressionados para aprenderem as tabuadas. Tanto teimei nesta embirração que, esforcei-me para que nunca jamais papagueasse uma resposta automática.

Daí que ao ler a frase que encabeça este escrito senti-me totalmente solidário coma escritora, por sinal irlandesa católica, mas que, por ter convivido sempre com gentes de outros credos, mostra uma mentalidade relapsa para aceitar que uma entidade, neste caso a sua Igreja, lhe retire a possibilidade de se expressar consoante o seu pensar a oriente no momento em que sinta necessidade de se dirigir ao seu Deus.


A fé é uma forma de artritismo intelectual. Pitigrilli

É reconhecido o facto de que muitos contestatários dos costumes bem estabelecidos social ou politicamente, o que no fundo vai dar ao mesmo, saltaram a barreira do circulo onde nasceram e foram criados, e mostraram-se, quase sempre, inimigos mais ferozes e propensos a tentar dar a volta ao texto do que aqueles que, ele já antevia o aguardarem para confirmar os preconceitos com que foram criados.


Pitigrilli (pseudónimo de Dino Segre 1893-1975) nascido e criado na Itália onde se encontra a sede do catolicismo, não foge à regra dos dois polos magneticos. Um país cujos cidadãos tem forçosamente que conviver com aqueles que se mostram fervorosos adeptos da fé, seja por convicção ou por conveniência, e os que são seus inimigos fidegais. Felizmente existem os que não são defensores, de capa e espada, de nenhuma facção. Estes, descomprometidos, são os que ficam sempre a pagar a loiça partid

PESCAR FRASES



Uma das vantagens de ler o que outros escreveram é a de encontrar frases com um conteúdo subjacente que nos chama a atenção. Por vezes caímos na tentação de sublinhar, com o propósito de assim conseguir fixar no nosso arquivo mental aquela ideia que acertou na nossa forma de pensar. Todavia nem sempre a nossa memória ajuda no sentido de ter o arquivo sempre disponível.

Hoje decidi comentar algumas das frases que nos últimos dias pensei serem merecedoras de atenção.

Na América os bons não privam com os maus. Iris Murdoch (1)

Temos a convicção ao fazer comentários extremistas que uma impressão isolada pode-se considerar como um todo indiscutível. Da minha experiência pessoal posso confirmar que, de facto, entre os cidadãos residentes nos EUA e que não apreciam aquelas cenas de pancadaria gratuita que nos relatam, insistentemente, em muitos filmes made in USA evitam conviver com potenciais agressivos. São o que podemos qualificar de timoratos.

Viajando nos States numa auto-estrada de muitas vias paralelas, quando os estômagos já marcavam as horas, os olhares estavam mais pendentes de encontrar um local onde matar a fome do que em apreciar a paisagem. E aqui surgiu uma das muitas recomendações, ou receios inculcados: Neste não convêm parar, só há grandes camiões! Tem que ser num sitio onde no parque abexo estejam carros familiares.

Mas a larica ia-se acentuando e quando vimos um local com automóveis e aqueles enormes transportes que usam buzinas com muitos decibéis, o clamor foi de tal ordem que o condutor teve que ceder. Ao entrar, primeira surpresa: no quiosque vendiam algemas, matracas, punhos de metal para andar à pancada rija e outros artigos propícios para conseguir fazer amigos. Segunda surpresa: Duas salas de jantar, nitidamente diferentes, tanto na decoração como no mobiliário. Dum lado cadeiras com estofo de tecido e do outro cadeiras resistentes e com estofos de napa. Para evitar confusões, cada sala tinha à entrada um grande cartaz indicando: só camionistas e no outro Turistas. Na linguagem própria da zona, que mesmo de raiz inglesa tem os seus modismos.

Esta situação não foi única, mas no rifoneiro português podemos ler Em toda a parte está o perigo. Sendo assim temos que reconhecer que os cidadãos cá da terra evitam entrar em bairros pouco recomendáveis, e nalguns deles mesmo a força policial toma as suas precauções.

(1) filósofa e prolífera escritora irlandesa (1919-1999)


terça-feira, 18 de abril de 2017

EMBALAGENS E CONTENTORES


Deixando de lado, por pertencer a outro universo caracterizado por dar mais importância ao impacto visual do que à estrita função de proporcionar um espaço seguro e fechado donde poder guardar um artigo, optei por tentar fazer uma analise sumária do peso económico e social dos diferentes tipos de embalagens, pelo menos das que nos aparecem ao longo do dia.

O tema surgiu-me em consequência de ter iniciado uma fase de trabalhos com madeira. Coisas sem importância, que me ocupam algumas horas do dia. Esta viragem aconteceu depois de ter ensaiado vários sectores da criatividade (inútil), Senti o impulso de variar o tratamento da madeira que tinha feito anteriormente. Desta vez optei por trabalhar com madeira usada, recuperada ou já trabalhada anteriormente de modo funcional.

Imaginava que encontraria, sem dificuldade, uma quantidade de restos lenhosos digna de pasmo. A realidade foi muito diferente, a minha memória mantinha-se agarrada às caixas de sabão, as de fruta, e até às grades que se usavam para protecção de equipamentos. Mesmo as famosas paletes de madeira estão em retrocesso.

Desta constatação veio o meditar sobre o que se ganhou ou perdeu ao substituir a madeira (ou o vidro) para transportar produtos. Sem procurar valores credíveis que me ajudassem na comparação da relação custo-beneficio, cheguei a critérios que, em quase todos os casos, podem denunciar que as opções actuais são tomadas mais pelo custo imediato do que pela avaliação de todos os factores que incidem antes, durante e depois da utilização de cada família de embalagens ou contentores.

EMBALAGENS E CONTENTORES DE MATERIAL TERMO-PLÁSTICO

A julgar pelo domínio, quase que total, deste material, e dando como indiscutível que a capacidade de produção, medida em unidades por hora, de qualquer destas peças, não pode ser igualada por nenhuma outra matéria prima, temos que aceitar o facto e ser o seu custo, imbatível, tanto na produção como em todas as fases da sua vida útil.

Mas o que também é visível, e notável pelo prejuízo ambiental que provoca, é que uma vez utilizada, estragada e não reciclada, dado que encontramos demasiado lixo de plástico para acreditar na sua reutilização, estes materiais já constituem uma séria ameaça para o eco-sistema em que estamos inseridos. Os mares e oceanos estão poluídos desde a superfície até os seus fundos com peças ou partículas com longa vida ou mesmo inalteraveis, que preocupam e alarmam a todos os que se deparam com este facto.

Valerá a pena insistir em todo o tipo de embalagens, desde sacos até frascos ou carcaças de aparelhos, e uma multidão de peças que se incorporam nos mais diversos produtos? Com os materiais sintéticos não totalmente degradáveis estamos envenenando o planeta.

EMBALAGENS E CONTENTORES METÁLICOS

Tradicionalmente usaram-se o ferro e alumínio, além de ligas de onde entra o níquel, cádmio, estanho, cobre, zinco e algum outro metal. Em todos os casos a corrosão e a reutilização é quase total por ser valorizada como matéria prima no circuito produtivo. Em comparação com os materiais sintéticos ganha pontos por não constituir uma ameaça equiparável para a saúde da Terra.

VIDRO

É o material de mais fácil de reciclar. Mas tem a seu desfavor, quando valorizado exclusivamente pelos custos comerciais, do seu peso e do pouco, ou nenhum, interesse em reutilizar as peças que na primeira metade do século XX se recuperavam. Opta-se por obedecer os baixos preços de fabrico, inferiores aos custos unitários de reutilização, e assim desprezar os benefícios sociais e ambientais que a reutilização poderia oferecer. Também aqui o dinheiro decide.

E, em abono da verdade, muitos cidadãos não aderem convictamente às normas de respeito pelo ambiente. Nem as autoridades insistem em promover a recolha, porque isto implica custos em todas as etapes.

EMBALAGENS DE MADEIRA

Apesar de as unidades fabris já terem aderido à automatização, estes produtos implicam mais custos de mão de obra por unidade produzida do que a peça equivalente de plástico. É mais pesada e, em geral ocupa um volume inalterável, e são passíveis de deterioro. Difíceis de empilhar e com custos não negligenciáveis para serem reutilizadas. Tem tudo em sua contra.

Todavia estão directamente ligadas à natureza e na sua génese, desde a plantação das árvores até à manufactura das peças encomendadas, deve ter o índice de horas de trabalho por milhar de peças saídas da fábrica, mais elevado do que qualquer outra solução. Não admira que quase tenham desaparecido.

EMBALAGENS DE CARTÃO

Ocuparam muitos sectores que estavam ocupados pelas caixas de madeira. Aparentemente são uma boa opção. Fáceis de fabricar, mesmo em linhas automáticas. Aceitam impressão e decoração, tanto nas faces em pasta mecânica. Sem branqueamento. Noutras o cartão é revestido com uma folha de papel apta para uma boa impressão. Leves e resistentes, podem ser estudadas para diferentes volumes e cargas. Habitualmente são para um uso, não reutilizáveis, mas são uma boa fonte de matéria prima para produzir nova pasta caso sejam recolhidas e retomem a linha de fabrico.

Apesar de que no seu esquema de produção está uma das indústrias mais poluentes da actualidade, e que consome muitos milhares de toneladas, ou de esteres, de madeira em bruto, contribuindo na erosão dos terrenos, o seu nicho de mercado parece sólido.


Decidir da bondade ou a preferência a dar a cada um destes sectores é difícil, pois a avaliação pelos efeitos no meio ambiente, ou pela importância social avaliada pela utilização de mais ou menos horas de trabalho valorizadas como fonte de emprego. Ou pelos efeitos a montante e a jusante do produto. Assim como do custo unitário a incorporar no material que deve proteger ou transportar. É um tema complexo,porque implica dar mais importância a alguns, ou algum, pormenor em detrimento de outros.

Até o momento o aspecto económico ofusca o ambiental, dado que este não está cotizado na bolsa de valores.

segunda-feira, 17 de abril de 2017

VEM AÍ AS MOSCAS

Com o aumento da temperatura a bicharada prolifera. A partir daí já sabemos o que nos espera. Sendo um cidadão previdente decidiu que estava no momento certo de se prevenir.
Neste sentido dirigiu-se a uma drogaria que estava no seu percurso habitual. Alí decorreu o diálogo que segue:

- Boa tarde. Pode-me atender?
- Com certeza, e com todo o prazer. Em que o posso servir?
- Não será difícil. Tem um remédio para as moscas?
- Precisamente chegou ontem um produto de excepção. Mas terá que tomar muito cuidado com crianças e animais de companhia.
- Pode estar tranquilo,pois sou uma pessoa consciente e cuidadosa.
- Aplique o produto sobre um isco e garantimos que depois de pouco tempo. Uma hora no máximo. Só verá moscas mortas no chão.
- Mas o que propõe horroriza-me! Não é meu propósito liquidar as moscas! Antes pelo contrário. Eu vinha procurar um remédio para as curar do extermínio que os homens decidiram aplicar a estas criaturas,

GLOBALIZAÇÃO OU NOVA COLONIZAÇÃO



O facto de que me mantenha em regime de reclusão domiciliária, admitindo que, em parte, por vontade pessoal, pelo menos, no que respeita à carência, quase que absoluta, de “vida social”, tal não impede a minha cabeça sofra desvarios e a pensar em horizontes que não conheço directamente, mas que admito existem.

A madrugada é a fonte de inspiração, e a última não falhou. Meditava eu na enorme reviravolta em que está o mundo. Só comparável a alguns dos grandes acontecimentos históricos que nos precederam e que ainda recordamos. Basta referir, como exemplo, a formação do grande império mongol, ou do fim do império romano, a descoberta formal do continente americano, ou da rota para as Índias orientais.

Aquilo que, a meu entender, está marcando o roteiro é a substituição da antiga colonização e esbulho das riquezas e trabalho dos povos não ocidentais, sempre conseguido pela força das armas, e depois do dinheiro, e que actualmente funciona com base à globalização e com o recurso às novas tecnologias. Identificadas com a informática e o automatismo. que dispõe de uma arma muitíssimo eficaz para descaracterizar os povos, novamente escravizados, mas que por não recorrer à força bruta mal se apercebem do que lhes espera.

Como me acontece quando utilizo este sistema de escrita tão actual (enquanto não for substituído por outro) tudo funciona aplicando uma linguagem que, derivada do inglês, certamente seria ininteligível a Shakespeare ou a Lord Bacon. A maioria dos termos utilizados são de poucas letras, curtos e incisivos, mas aos quais correspondem funções basilares para conseguir obter uma utilização eficiente das imensas possibilidades que a informática nos proporciona.

Esta situação está ocasionando uma cultura muito centralizada, cada vez mais funcional ou pelo menos afastada da leitura em papel e dos temas clássicos. Os mais jovens sabem que hoje o domínio da língua inglesa, e em especial da utilizada na informática é fundamental. Até certo ponto, mas respeitando as diferenças existentes, é semelhante ao fenecido domínio do latim, que deixou de ser ensinado massivamente e ficou reduzido aos textos religiosos, a certas expressões do domínio da jurisprudência e, juntamente com o grego clássico, para a composição de termos científicos de novo cunho.

É reconhecido que os povos, tanto de regiões concretas do ocidente, como de países que foram formal e factualmente colónias até poucas décadas, quando os seus representantes pretendem comunicar com países mais avançados tem que utilizar alguma língua europeia, que já foi o francês mas que hoje é o inglés, ameaçado de perto pelo chinés.

Esta realidade leva-me a deduzir que as línguas regionais e autóctonas tendem a ser cada vez mais residuais, a só servirem para comunicar entre pessoas sem representatividade perante o exterior. Vendo do lado mais negro, a globalização carrega armas poderosas, que não se resumem à exploração comercial mas, socialmente, a uma cada vez mais notória descaracterização das populações autóctones. Neste sector da uniformidade linguística incluo, como deixei indicado na primeira linha deste parágrafo, a limitação das variantes regionais no estrito âmbito familiar ou, quando muito, válido num sector da população que seja cioso da cultura herdada.

Ao referir o declínio do latim quando a Europa medieval foi desmembrada e se optou por dar valor às línguas utilizadas pela população em geral, é citada a data de 880 por corresponder ao mais antigo escrito, conhecido até hoje, totalmente redigido no francês popular. A data é importante por corresponder à entrada oficial da primeira língua derivada do latim. Hoje, ouvindo como falam os jovens, já absortos na referida informática, sente-se como inserem muitas palavras inglesas no meio dos seus discursos.


Pergunto: surgirão novas linguagens, não eruditas, no seio dos diversos países, derivadas deste inglês “abastardado”? Ou seja, veremos que a história repete-se com novos actores?

quinta-feira, 13 de abril de 2017

UMA AMOSTRA







Se conseguirem manobrar a fotografia adjunta terão a oportunidade de poder apreciar uma pequena parte dos trabalhos de modelação e pintura, fruto da minha dedicação, ao longo de bastantes anos, ao tema de como surgiram os mitos dos dragões, muitos deles ligados às serpentes e a interpretações esotéricas.







O REI DE NARIZ TORCIDO

O REI DE NARIZ TORCIDO

Depois de uma serie de possíveis títulos, sempre dentro do cariz nobiliário, optou-se por referir uma das características dominantes deste monarca.

O retratista utilizou uma palete de materiais que ultrapassam a conhecida Arte Povera. Socorreu-se de pedaços de madeira já rejeitados, excepto as que serviram para representar a barba encanudada da insigne personagem. Mesmo assim só se pode qualificar como uma porcaria paupérrima.

O autor, que rejeita que o qualifiquem de "artista", por considerar um insulto, tato para si como para os verdadeiros artistas plásticos, nas suas diferentes vertentes.


terça-feira, 11 de abril de 2017

COMO IMAGINAMOS OS EXTRATERRESTRES

COMO IMAGINAMOS OS EXTRATERRESTRES

Longe vão os tempos em que as mentes especuladoras imaginavam a existência de seres residentes noutros planetas, ao estilo dos selenitas (semelhantes a galináceos) que os intrépidos irmãos Lumiére encontraram ao visitar a Lua.

De então para cá há centenas de “testemunhas fidedignas” que afirmamn sermos visitados insistentemente. Com propósitos nada claros a julgar pelo que os especuladores descrevem. Foi comum, e persistem hoje, entre os vocacionados a imaginar como seriam os seres de outro mundo, apoiarem-se em animais nossos conhecidos na Terra, incorporando partes de uns e outros, tal como se gerassem uma nova quimera.

Os avanços científicos e, em concreto a noção das distâncias que nos separam de outros mundos, e dos limites que ainda se consideram como impossíveis de ultrapassar, pelo menos enquanto não surjam novas teorias na física e astronomia, fecham-nos no que respeita a visitar ou sermos visitados. Por enquanto a velocidade da luz é um obstáculo inultrapassável. Que inclui a dificuldade, até hoje sem resolver, de poder transmitir matéria dum ponto a outro, seja na Terra como fora dela.

Como conseguir? As mentes mais expeditas dizem que isso se conseguirá enviando os átomos como mensagens de radio e reconstruindo o objecto, ou a pessoa, no outro lugar. Para tal, além de muitos problemas tecnológicos ainda nem sequer esboçados, implicaria a existência de um equipamento receptor e reestruturador no ponto onde desejássemos enviar o tal tele-transporte. Ou seja, que não bastaria fazer pontaria a um planeta determinado se não existisse, disponível, uma aparelhagem receptora e reconstrutiva. Daí que antes deste teletransporte teriam que ter ido os montadores, fossem humanos ou robots comandados desde a Terra ou uma base de terrestres em local próximo.

Apesar destas dificuldades, por enquanto impossíveis de ultrapassar, continuamos a imaginar seres extraterrestres. E, como sempre aconteceu, a base destas criações é função do que conhecemos ou que damos como ser possível no futuro mais ou menos próximo.

Quando se admite que os seres imaginários devem ter um aspecto plausível a especulação, mais uma vez, parte do que sabemos. Assim sendo os humanoides em questão, possivelmente dissemelhantes de nos, devem ter um conhecimento científico bastante superior ao nosso. E isso implica terem um cérebro ainda mais volumoso do que o nosso. Por isso é habitual serem representados como dolicocéfalos em grau superlativo. Ter tanto poder mental liberta-os dos esforços físicos e, em consequência imaginam-se corpos frágeis, qual pigmeus anoréticos.

Outros inventivos já dispensam o corpo físico. Reduzem estes seres, hipotéticos, a uma espécie de hologramas, que devem deslocar-se pela força do pensamento, e esta não deve obedecer às nossas leis da física. Mas então como se explicam as pretensas naves galácticas que se afirma nos visitam com insistência?

Poder acreditar nas notícias, nunca confirmadas oficialmente, de visitas de seres de outros mundos colide, frontalmente, com todo o progresso que se tem feito na astronomia e no envio de naves exploratórias. Estes sucessos estão baseados nas teorias da relatividade restrita e geral, cujos postulados iniciais nos foram dados por Einstein.

Admitindo que as fronteiras do conhecimento são colocadas, constantemente, mais longe dados os avanços que, progressivamente, se alcançam, devemos ser cientes de que faltam grandes saltos até conseguir, se tal for possível, ultrapassar o nosso sistema solar e mesmo a nossa galáxia. Se hoje outros seres nos conseguem visitar é pertinente deduzir que, comparativamente, somos uns primitivos e que os nossos foguetões equivalem às pirogas dos nativos que tão brilhantemente colonizamos.



ONDE ESTÁ A RESPONSABILIDADE ?



Antes de iniciar a apresentação do meu parecer, que corresponde ao de um velho com 79 anos de casa, quero dar entrada a um pequeno excerto do que um reputado psiquiatra manifestou:

Uma atitude que o psiquiatra juvenil Daniel Sampaio considera ser um reflexo de "um défice de autoridade" por parte dos pais. "Os jovens devem ser responsabilizados pelos seus gestos e comportamentos. Depois os pais têm de exercer autoridade, não autoritarismo, mas autoridade baseada numa relação de regras com cumprimento de direitos e deveres, que deve começar na infância."

As ocorrências recentes, em diversos patamares da vida nacional, mostram como o sentimento de irresponsabilidade se instalou fortemente entre nós. O caso dos excessos de incivismo e carência de educação que foram destacados estes dias, apontando a grupos de jovens, que se julgam adultos, mas irresponsáveis, nem sequer é uma situação nova.

Antes de que os grupos de jovens, sem hábitos de qual deve ser o seu comportamento segundo as normas de convivência social, se tornassem evidentes num hotel na costa sul de Espanha, já anteriormente se tornaram indesejáveis nas unidades hoteleiras entre a costa de Tarragona até a norte de Barcelona. Parece que entrou no fosso do esquecimento os que morreram ao tentar saltar de umas varandas para outras, possivelmente incitados pela vontade de armar barraca, associado a uma desejada embriagues. Outros grupos, nomeadamente de ingleses, já antes deram exemplo deste péssimo comportamento. Cá temos por hábito imitar, e habitualmente as imitações são piores do que os originais.

Tal como nos diz o Professor Daniel Sampaio, o cerne deste problema comportamental está nos pais, e até acrescento de muitos avós. A obrigação de educar e orientar os descendentes degradou-se com a evolução da sociedade.

É reconhecida a concepção errada, mas instalada em demasiadas famílias, de que o civismo deve ser ministrado pelos docentes nas escolas, abdicando com total descontracção do que sempre foi uma das principais tarefas e obrigações dos adultos para os seus descendentes. É no seio da família que se devem inculcar as boas regras. Assim fazem a maioria dos mamíferos, animais que qualificamos de irracionais, mas que mostram ter um sentido de responsabilidade maior do que os humanos da actualidade.

Outro sintoma que nos é desfavorável é o de os pais entregarem importâncias excessivas de dinheiro aos seus filhos, por não resistirem com a autoridade que, no fundo, os educaria na sensatez. Deste facto, inquestionável, podemos concluir que, apesar da sempre referida crise, existe um sobrante de dinheiro disponível, seja resultado de trabalho ou negócios, ou conseguido através de crédito. Seja como for, habituamos mal os jovens. E muitos dos pais actuais já foram assim mal educados.

Outra faceta que está presente neste acontecimento, que insistem em apresentar como pontual, é o de desculpar as tropelias, como se o alardear de incivismo seja justificável. Desculpar a chusma, mesmo que se confirme serem uma parte do todo, não é método que eduque. Tão ladrão é o que vai ao nabal como o que fica ao portal.

Esta tendência a desculpar, usando subterfúgios e deixar os evidentes responsáveis de fora, nem sequer é exclusivo de Portugal. As manifestações emanadas dos países do sul da UE a propósito das palavras, de Dijesselbloem qualificando, de uma forma descontraída e até amiga por não ser tão agressiva quanto poderia ter sido, é uma dupla vergonha.

Em primeiro lugar, e com destaque, todos somos conscientes que muito do dinheiro que, desde os centros de decisão da UE, foi entregue aos países do sul com o propósito de que recuperassem o seu atraso em relação aos mais avançados, foi mal gasto, desapareceu sem dar os resultados prometidos. Indo, mais uma vez, ao rifoneiro, ali encontramos Dinheiro “emprestado” será mal parado. Ninguém duvida nem pode por as suas mãos no fogo pela boa gestão daquelas enormes verbas.


Mas este reconhecimento interno não impede que tantos gritem, berrem, se mostrem ofendidos, e “exijam” a demissão de quem, a meu ver, pode ter sido infeliz quando não pretendia ser demasiado explícito. Poucas opiniões encontrei, sem as procurar exaustivamente, onde se escalpelize a verdade dos factos.

domingo, 9 de abril de 2017

TEMOS QUE ACERTAR O PASSO



Contam, aqueles que “fizeram a tropa, quando recordam a recruta, que para alguns era difícil acertar a passada, e não trocar os pés, com os restantes membros do pelotão. Penso que para a estrutura militar poder apresentar um grupo compacto de soldados marchando síncronos é a primeira mostra de que não se trata de uma, patuleia (termo que teve origem na tropa, mais ou menos irregular e com pouca preparação prévia, integrada no Partido Popular na revolução de 1876). Hoje estas formaturas são reservadas, quase que exclusivamente, para desfiles em parada, pois aquelas cargas de infantaria que eram normais nas guerras que antecederam a de 1914-1928 já passaram à história.

Mesmo assim e dado que os tempos mudam, e neste século as mudanças são tão rápidas nos campos da tecnologia, e em especial de tudo o que estiver ligado à informática, que é difícil conseguir adaptar-se com a mesma ligeireza em todos os sectores que afectam à nossa vida em comunidade.

Sentimos que nem todos conseguem, ou dão a mesma importância às mudanças sociais do que aquela que aplicam às novas tecnologias, tanto de informação, como de trabalho e recreio. Admite-se que está à nossa disposição um fabuloso manancial de conhecimentos, como se as bibliotecas anteriores não tivessem existido.

Neste capítulo do conhecimento, da erudição, do saber, é pertinente considerar que não basta ter as estantes repletas de volumes de toda a índole, ou mesmo se restringida a certos capítulos. De pouco servem os livros se não são consultados. Assim como também é fundamental ter a mente preparada para que oriente os nossos passos na pesquisa e, depois, para possibilitar que se façam as meditações que permitam chegar a conclusões. Conclusões que pode acontecer, e assim sucede amiúde, não serem definitivas. A sapiência permite encontrar novos conhecimentos e incorporar estas novidades para assim ter uma visão mais correcta e abrangente. E esperar, com paciência, outras incorporações.

Chegados a esta base creio que estamos preparados para fazer a abordagem do tema que me incitou a escrever hoje. Concretamente é o de sentir a necessidade fundamental de fazer a conexão da sociedade actual e os partidos políticos que existiam meio século atrás.


Quem permanecer estagnado nas querenças e noções, já do domínio da história, acerca do comportamento das camadas sociais, vigentes seis décadas atrás, está totalmente fora da realidade. Ou, em opção, está convicto de que, pressionando a sociedade com tácticas de medo e desestabilização conseguirão mudar o rumo actual.

Persistentes em querer viver fora da época são aqueles saudosistas, de novo cunho, que se incorporaram fosse por uma sequência familiar ou por uma adesão viral irremediável. Ficam estagnados nos dois polos opostos, que sem os referir pelos nomes que conservam, mas que nem sempre respeitam, podemos encontrar nos cacifos dos ultra-conservadores e dos revolucionários. Ambos são temidos, e massivamente rejeitados, por não terem doutrinas adaptadas ao pensamento e desejos da maioria da população.

Se os da esquerda já não comem criancinhas ao mata-bicho, os da direita também podem entender que o sector da população que adere, convictamente, aos sentimentos inculcados durante séculos, é cada dia menos numeroso. A cultura e o afastamento da pobreza extrema, mesmo com resíduos importantes neste extremo, vai progressivamente igualando os segmentos ou classes sociais. O efeito mais evidente é que leva o cidadão médio, já mais instruído, a renegar a bipolaridade, a preferência está no centro, em fugir dos compromissos e daí o absentismo nas eleições. Não querem saber de partidos políticos!

Uma atitude, compreensível, mas que é sumamente funesta para o futuro imediato, pois de facto deixa o campo livre para que, aqueles grupos partidários que desejam o poder, com egoísmo e espírito de ganância pessoal continuem a receber o poder.

Os cidadãos que podem presumir de ter uma cultura acima da média, mesmo que estiver concentrada em domínios muito restritos, devem aceitar que tem a obrigação moral e social de escapar dos extremos e oferecer parte do seu saber aos sectores da população a que tem acesso (se se esforçar a isso) a fim de tentar abrir-lhes caminhos para a concórdia que, mesmo existindo por instinto, nem sempre se aplicam devidamente.