sexta-feira, 29 de março de 2019

BREXIT 4



Uma embrulhada

Os últimos dias nos ofereceram, desde Londres, um espectáculo interessante, que sendo único só se pode comparar, no sentido oposto, com aquelas sessões em países onde as pessoas se inflamam a pontos de se agredirem fisicamente, em pancadaria feroz.

Para já a sala de sessões do Parlamento Inglés é muito diferente das que estamos habituados a ver nas reportagens do resto do mundo “civilizado”. Estão enfrentados os dois grupos rivais, instalados bem apertadinhos, sem uma mesinha donde se apoiarem ou colocarem uma aparelhagem electrónica de uso normal. Para completar tem umas regras muito próprias e, pelo menos agora, um porta-voz, ou uma espécie de coordenador-moderador que, além de pedir aos membros da assembleia que se portem com ordem, tem uma expressão facial que podemos considerar, pelo menos, como curiosa e até patusca, mesmo que respeitadora das regras sociais e políticas.

O que nos deu de novo a mais recente sessão foi ver que, implícitamente, os dois bandos estavam já saturados do seu Primeiro Ministro. Aquela espécie de gafanhoto desengonçado que não conseguiu levar a água ao seu moínho. Nem sequer entre os seus membros de governo, que desde meses teimam em se dimitir, e muito menos em conseguir uma demostração unânime de parecer por parte dos seus representantes eleitos, e muito menos da população em geral, que vimos como se tem manifestado publicamente nas ruas e praças, com diferentes opções. Uma rebaldaria que não se sente com solução à vista.

Um ponto,porém, está saliente no sentimento de indecisão sobre como agir neste impasse, que os seus representante abriram com a U.E. Já referi, numa entrega anterior, que o problema mais forte para os cidadãos do Reino Unido é o de não aceitar a hipótese de se re-instalar uma fronteira entre a República Irlandesa, católica, e o Norte, protestante, unido ao U.K.

Não aceitam o previsível retorno a um conflito armado entre as duas zonas, mas tampouco lhes agrada a possibilidade de uma união política e territorial entre as duas Irlandas, pois que esta implicaria a saída do Ulster do R.U. Este tema parece que é o mais agreste neste momento. E a única semi-solução, dada a existência dum conflito religioso de difícil arranjo, os outros membros do U.K., não é provável que aceitassem, assim de repente, abdicar de mais uma parcela do seu já encolhido Império Britânico.

Logicamente tem que se encontrar uma saída para este diferendo, que nem sequer é visto de forma unânime pelos subditos de Sua Majestade. A mais correcta, mesmo que amarga de engolir, poderia ser o abandonar, totalmente os propósitos do BREXIT. Esquecer as possíveis pressões vindas desde os USA, que desejam enfraquecer a União Europeia, quase tanto quanto alguns dos seus membros efectivos, se avaliarmos os conflitos que tem surgido.

Os membros do Parlamento, se quiserem ter uma acção brilhante, além de dar o dito por não dito, podiam propor a entrada do U.K. na moeda única, como mostra de boa-vontade e arrependimento (mesmo que se dessem outros argumentos mais simpáticos e menos amargos). Com esta união monetária podiam tentar recuperar parte da desvalorização que sofreu a libra a partir do anúncio do BREXIT.

segunda-feira, 25 de março de 2019

BREXIT 3




PROBLEMAS INTERNOS

De imediato confesso que não estou preparado -nem sequer tentei- para poder dissertar sobre as consequências económicas que podem acontecer caso a Inglaterra desista de pertencer à União Europeia, tal como valorizar a sua continuidade neste “clube”, numa fase da sua evolução em que se refere existirem desvios nacionais, com perigo potencial num desmembramento. O ambiente dentro da UE não está calmo, tranquilo, antes parece com preanuncios de problemas.

Aquilo que sinto, a propósito do BREXIT, E com alguma convicção baseando-me exclusivamente no que encontro na imprensa e nos noticiários-comentários da TV, é que parece evidente que muitos eleitores do UK, quando se decidiram a votar na consulta geral para decidir se queriam sair ou continuar como membros da União Europeia, ou entrar na iniciativa nomeada de BREXIT, não estavam bem elucidados sobre o que existia por trás daquela consulta, ou até donde poderia ser alterado todo o seu esquema de vida.

Ou seja, admite-se que muitos votaram por sentimento, às cegas. E hoje devem estar preocupados por se optaram erradamente. Muitos gostariam de mudar o seu sentido de voto. Caso as normas vigentes o permitam.

Um dos factores que pode ter influenciado fortemente na decisão do voto pode ser o da visão, possivelmente exagerada, da presença de um número de estrangeiros. O cidadão comum pode sentir que esta presença já é excessiva e que, coincidindo com uma quebra nas ofertas de emprego, em especial nas de tarefas mal remuneradas, criou um ambiente de rejeição perante os recém chegados, dispostos a aceitar o pouco que oferecessem.

Ver as reportagens dos grupos de migrantes ainda na costa francesa, frente ao canal, que tentam, insistentemente, em entrar no UK, sem documentação, ocasionou o atribuir esta situação, perigosa, ao terem sido abertas as fronteiras entre os países membros da UE. Quando se publicitou a hipótese de instalar os controles nas fronteiras inglesas, caso se abandonasse a União Europeia, muitos terão decidido que o BREXIT era a melhor opção.

Esqueceram-se de que muito antes das fronteiras abertas na Europa já lhes chegava um fluxo, practicamente incontrolável, de pessoas com passaporte e entrada legalizada, provenientes de antigos territórios do Império Colonial. Compareceram gentes de cor vindas da Jamaica e outras ilhas do Caribe, mais do Pakistão, da India, e outros lugares onde esteve a bandeira imperial. Alguns integraram-se, como os taxistas e motorista de ómnibus com volumosos turbantes. Outros mais se instalaram-se em sectores comerciais. 

Por outro lado a proliferação familiar deste inmigrantes, muito superior à das famílias inglesas, introduziu mais elementos com nacionalidade britânica do que postos de trabalho disponíveis. De onde que passassem a ser credores das ajudas sociais, ou de se movimentar por zonas clandestinas.

Imagino, sem outra base do que a simples especulação comparativa, que no UK existem muitos cidadãos sossegados, cumpridores, que sendo maioria não deixam de estar temerosos dos que invadem as ruas tumultuosamente, os que insistem em ficar ébrios, drogados, fazer desacatos e agressões injustificadas -caso existam justificadas que não sejam a auto defesa – e, como é fácil de entender, os “pacatos” identificam os transgressores da paz pública como uns indesejáveis. E na multidão destacam, por serem mais visíveis, as pessoas de cor, os diferentes da imagem que desejariam ser a dos seus verdadeiros compatriotas (?), renegando o facto de que muitos destes elementos, com visual de forasteiro, já nasceram no UK, de segunda ou terceira geração, e são legalmente tão cidadãos como eles próprios. A partir daí devem transferir a rejeição para aqueles que ainda não entraram, mas que os sentem como ameaçadores potenciais.

Paralelamente, os recursos humanos gerados no seio dos naturais do RU mostram-se, em alguns sectores, insuficientes para cobrir muitas tarefas imprescindíveis. Por  sector de informática é conhecida a boa preparação, em quantidade e qualidade dos indostânicos, entre outros, com a vantagem de que dominam o idioma, tanto o de uso normal como o profissional.

Um dos sectores onde a Inglaterra não consegue abastecer o seu mercado é na saúde hospitalar. É conhecida a oferta de trabalho para enfermeiros, com salários mais elevados do que conseguem nos seus países de origem. Os recebem com os braços abertos e com a vantagem suplementar de que a preparação profissional foi financiada pelo seu País de origem. Estes podem vir !

Ainda neste aspecto de sim ou não à União Europeia, os ingleses devem estar perante o dilema de estudar todos os efeitos que implicaria um BREXIT, uns positivos e outros negativos, mas com a certeza de que sair mas podendo seleccionar, como numa ementa, os parágrafos que lhe podem agradar e rejeitar os outros, não parece factível. Por muito interesse que exista entre os membros da UE para que o UK não active o Brexit, as normas do tratado terão que ser obedecidas e cumpridas.

Para já, dado que na vida normal, nomeadamente na alimentação, a Inglaterra está muito dependente da importação de produtos frescos da Europa Continental, o BREXIT, puro e duro,implicaria um aumento imprevisto do custo de vida. E esta consequência não seria bem recebida na economia doméstica.

Alterar a situação actual, implicaria uma interrupção das negociações com uma duração suficiente para poder fazer o que não foi feito. Ou seja, elucidar detalhadamente a população com um sério balanço dos ganhos e perdas que uma saída ou uma permanência forçosamente implica. Será que o governo de Sua Magestade pedirá estas tréguas? E a UE concederá este bonus temporal?

O Reino Unido, que em linguagem simplificada nomeamos de Inglaterra, tem aquela localização geográfica, desligada territorialmente do continente europeu, que se prestou à famosa graçola de que “devido aos fortes temporais a Europa está isolada”. A realidade actual é muito diferente. Já é difícil, ou mesmo impossível, retroceder a um isolamento imperial.


Moral da história Pretender alterar seleccionando o que se gosta, nem sempre é possível.

sábado, 23 de março de 2019

BREXIT 2



DIVAGAÇÕES SOBRE RELIGIÕES

Sem que considere ser uma cedência ao “politicamente correcto” podemos admitir que, desde a alvorada da civilização, o homem sentiu a necessidade de construir um esquema misterioso, inexplicável, com o qual tentava justificar tanto a evolução das estações como os cataclismos que o penalizavam. E mais o resto, especialmente o penoso.

Uma vez que se aceitou colocar a imaginação em funcionamento as várias soluções que foram surgindo ao longo do tempo e dos diferentes pontos em que os humanos se dispunham a tecer lucubrações, chegou-se ao paradoxo de que todas as montagens se assemelhavam entre si, e algumas inclusive eram practicamente iguais, quase que decalcadas, embora fossem engendradas separadamente. Em comum tiveram o criarem uma classe sincrética que, em nome de entidades divinas, exerciam um poder civil desmesurado.

Deixando de lado esta divagação sem importância o que em geral se deu foi que se organizaram, em paralelo, umas mitologías e uns cánones de conducta, com regras que implicavam, como é de preceito, prémios e castigos para quem as devia seguir, com a exigência de uma obediência cega, sem discussões nem desvios. Daí que se estabelecessem uns preceitos que, logo desde o início, neutralizam a inicial liberdade de acção e de pensamento.

Saltando para a actualidade e abrindo o capítulo da religião que afecta as decisões da população do famoso UK -que teima-se em denominar como Inglaterra, só pelo facto de se admitir ser o reino mais poderoso desta união- verifica-se que, abstraindo dos sentimentos de decisão independente do País de Gales, do qual pouco se ouve falar, e da mais acutilante Escócia, que de vez em quando levanta a voz ao mandão inglés, é na verde Irlanda que o ambiente é mais propício a gerar problemas. Concretamente porque se anuncia o voltar a separar a ilha em duas porções,com fronteiras armadas. E com direitos alfandegários. Um desastre se valorizarem estes anos de parceiros da UE em que os ânimos tinham acalmado.

E este ninho de vespas identifica-se, precisamente, pelo fanatismo religioso. Recuando na história, -que sempre pesa, mesmo que nos custe aceitar esta pressão- até início do século XVI, quando o domínio dos países do sul da Europa estava baseado no poder, terrenal que era aceite ter a Igreja Católica Romana, por designio divino (?) E que esta, se encarregava de conceder o aval ou de o negar, sempre a seu bel prazer.

Em 1517 o frade alemão MARTINHO LUTERO emitiu um manifesto com 95 teses, no qual, baseando-se no abuso que a Igreja Romana perpetrava com os seus fiéis, através das bulas e outras normas de fé, desligou-se de Roma e criou a IGREJA PROTESTANTE. Desta iniciativa resultou uma longa luta armada, a Contra Reforma e uma desavença que ainda perdura.

Quase de imediato, reinando na Inglaterra o famoso Enrique VIII, que entre outras características, tinha a de querer mudar de esposa com excessiva frequência, ao ver que as normas de Lutero não lhe permitiam os divórcios rápidos que desejava, em 1543 decidiu criar a IGREJA ANGLICANA, da qual seria a entidade suprema.

Chegados aqui embarcamos para a verde Irlanda. A população desta grande ilha manteve-se no seio do credo católico, excepto uma zona a norte, que, colonizada por ingleses, aderiu à Igreja Anglicana. E aqui se armou a tenda!

As incompatibilidades entre as duas comunidades foram crescendo, até ultrapassar a simples dialéctica e derivar, claramente, numa luta armada, numa guerra civil -depois da segunda guerra mundial em que os católicos estiveram, embora disfarçadamente, do lado dos nazis- Londres, como éóbvio, não aceitava que os “papistas” tomassem toda a Irlanda, e chegou o dia em que se estabeleceu uma linha separando o sul, católico, do norte protestante.

Muitos de nós recordamos, e vimos até em filmes, a guerra de atentados, lutas de rua, prisões e até torturas, mortes e suicídios, que esta situação comportava. O clima só acalmou quando tanto a Irlanda independente como o UK, carregando o Norte às costas, entraram na União Europeia. Eliminaram os controles de fronteira e as forças militares ou militarizadas recolheram às bases.

A proposta do BREXIT, se chegar a se tornar efectiva, implicaria o retorno da fronteira entre as duas Irlandas, que se habituaram a mais liberdade de circulação e comércio entre si. Este recuar na história política desta ilha é um dos pontos cruciais nas negociação, se não o mais importante anímicamente. Como a cedência tem que vir de Londres e, indirectamente, dava uma dupla vantagem “moral” e política, além de económica, à zona católica os conservadores ingleses, que não ponderaram devidamente as consequências do seu brilhante BREXIT, agora estão pressionados a ceder, e isso custa!

Deixar que a religião condicione a sociedade pode trazer, e traz, consequências que a mesma religião é incapaz de resolver. As guerras que se tem fomentado coma desculpa de credos diferentes, alegadamente incompatíveis, é uma das atitudes mais insensatas, direi mesmo estúpidas, que os humanos tentam em se meter. E mesmo assim se autoclassificam como seres racionais.


O seguinte capítulo tratará das carências sociais do UK e na pretensão de fechar fronteiras à imigração, quando eles as tem abertas, por tratados válidos, com os países da Comunidade Britânica.

sexta-feira, 22 de março de 2019

BREXIT




INFLUÊNCIAS DESACTUALIZADAS

Penso que muitas pessoas já estão enjoadas com este vai-não-vai que os ingleses montaram ao pretender não se manterem, -mesmo que parcialmente pois não aderiram à moeda única- fora da complexa União Europeia. E ao mesmo tempo com pretensões de poder usufruir do “filet mignon” e deixar na travessa os pratos que não desejassem.

Fazer um balanço total,ponderado, dos benefícios e problemas que se criaram ao pretender criar um bloco europeu, trans-nacional, eliminando, gradualmente, as identidades nacionais, e até regionais, que uma já longa história deixaram fixas nos membros da integrada, sem o ser totalmente, U.E. Um dos propósitos mais lógicos e ambiciosos, mas difíceis de conseguir, era o de chegar a um bloco econômico, com governos locais cada vez mais próximos entre si, que pudessem competir com algum pé de igualdade não só perante os EUA como dos novos impérios que se estavam criando ao Oriente.

Procurar justificações racionais ou absurdas para esta pretendida fuga do U.K., que se assemelha ao clássico Agarrem-me se não eu o mato!, e da também clássica fuga de sair pela porta alegando que “vou comprar tabaco”, mas com a oculta pretensão de que depois de “fumar aquela broca” pode regressar ao lar e encontrar uma forte amizade. Quantos desejaríamos poder partilhar de soluçoes assim, pouco definidas e cheias de escapatórias?

Todavia os vectores que pressionaram os eleitores ingleses a votar num referendum pouco ou nada meditado, sem avaliar o futuro em que cairiam, são tão diversos e alguns inclusive tão recuados no tempo, que quase se torna ridículo os colocar sobre a mesa, sabendo que, instintivamente, quem oiça estas referências vai negar que tenham algum peso na sociedade actual.

A situação sedimentada que pouca atenção se lhe dá é a do trauma saudosista de que padecem as nações que tiveram uma expansão colonial importante e que, hoje, se encontram na situação de restos de um naufrágio quando chegam às praias, após os fortes temporais e as marés vivas. Aquilo que orgulhosamente se quer valorizar como sendo a aportação de uma cultura mais avançada, que substitisse as culturas ancestrais locais, implicou a transferência de uma língua europeia, que não sendo autóctona lhes é estranha, mas que se tornou indispensável na vida actual.

As gerações que viveram na fase de desmembramento do “seu império” ainda retêm, intimamente, a ideia de que aquilo tudo era nosso , mesmo quando a capacidade de manter aqueles territórios sob o seu domínio era reduzida dada a diferença numérica das populações naturais e a dos invasores, além do poder económico, cultural e industrial.

Só a colonização do norte da continente americano, em que se decidiu exterminar os habitantes indígenas, é que atingiu um equilíbrio diferente. Embora instável dada a substituição dos indígenas por escravos africanos e a proliferação ancestral dos ameríndios a sul do Rio Grande, que ameaçam substituir os wasps como uma coluna de termites.

Deixemos os casos da península ibérica, por nos tocarem de perto, e observemos à derrocada do Império Francês, herança da era napoleónica. O território africano mais apreciado após o fim da segunda guerra mundial, era a Argélia. Ali se estabeleceram muitos colonos e explorações, mas também se tinham preparado, militarmente naturais daquela zona (1) Por um lado tinham as forças militares francesas, apoiado e apoiando-se pelos residentes franceses, muitos de segunda e terceira geração, que não queriam deixar aquilo que tinham conseguido. Do lado oposto o exército de libertação argelino, onde ilitavam muitos argelinos que tinham sido incorporados no exército francês durante a segunda guerra mundial. A contra-guerrilha francófona terminou opondo-se ao governo de Paris. Os apelidados de pied-noir não só mantiveram um estado de guerra no território argelino como fizeram atentados terroristas no próprio hexágono.

A Europa constitui um extenso repositório de casos semelhantes, que ainda hoje rabejam como a cauda de uma sardanisca mutilada do corpo principal.

Tomaram-se, e continuam a se tomar, decisões mais por influência do saudosismo do que como resultado de uma ponderação actual. As pressões do passado histórico existem e não deixam de ter peso no descontrolar da realidade actual.

(1) Como sempre se fez ao longo da história, usando o pelo do mesmo cão

Na próxima entrega trataremos do triste problema da religião.

segunda-feira, 18 de março de 2019

IN MEDIO STAT VIRTUS


No meio está a virtude

Nem sempre aquilo que parece evidente numa mensagem clássica é só uma das possíveis interpretações, e, pelo contrário, aquilo que mais de imediato nos é sugerido pode ser o cerne do recado. A tradução que apresento para a máxima latina é a mais socialmente correcta, se a entendermos equivalente ao outro ditado de Nem tanto ao mar nem tanto à terra. Nos propõe fugir dos extremos, da ambição desmedida, ir para um equilíbrio que satisfaça ambas partes.

Todavia, a picardia da linguagem vulgar, interpreta literalmente onde se guarda a virtude, concretamente das mulheres. Pelo contrário quando são referidas mulheres de virtude, o léxico popular não se refere precisamente a mulheres que tenham um comportamento virtuoso, sem mácula. Antes esse qualificativo se usa para definir mulheres que se dedicam a más artes, a bruxedos e outras acções que sendo reprováveis socialmente a mesma sociedade aceita e até promove.

Uma situação que pode ser ainda se mantenha vigente nas zonas rurais mais esquecidas, e a de que estas mulheres a quem se atribuem poderes ocultos, tanto para fornecer mezinhas de medicina popular como até, em casos extremos podem facilitar abortos ou um fim de vida sem sofrimento. Aquilo que se chamava de uma boa morte, que na linguagem e costumes actuais se refere como aplicar a eutanâsia. E quantos de nós, se nos encontrássemos perto de um fim irremediável, sem possibilidades de cura e perante o ter que padecer de um tempo indefinido de sofrimento, não desejaria que alguém, fosse homem ou mulher, médico ou curandeiro nos ajudasse a partir?

Outra frase feita, que ouvi referir durante a minha juventude e que desconheço se ainda perdura na linguagem coloquial, era: Deu-lhe água de cú lavado. Que além da rudeza de interpretação literal se pode entender como, para conseguir prender um namorado, sempre houve e haverá, quem arrisque a oferecer “o seu tesouro máximo”, não necessariamente através de uma beberagem nojenta mas antes por facilitar, consentir, uma apertura do tal meio onde se atribui residir a virtude, e praticar aquele acto que, simpáticamente se pode definir como um acto de amor.

E numa sequência muito corrente podia -ou pode- acontecer que mesmo sacrificando a virtude do meio, o fim pretendido não surgisse e o parceiro se escapuliu depois de satisfeita a sua lubricidade. A ex-virgem dizia, neste caso, que foi enganada a falsa fé, possivelmente com o uso da lábia traiçoeira do castigador que, antes dela, já tinha conseguido resultados iguais com outras convencidas do seu valor e capacidade de não vir a ter o mesmo destino das anteriormente enganadas.

Esta capacidade que alguns têm, e usam, para conseguir o que desejam chama-se cantar a canção do bandido. Que, como é evidente, aquele que tem o dom de convencer outro, usará a canção mais apropriada em cada caso. Os membros da dita etnia cigana possuem um repertório bastante extenso para convencer, enfeitiçar, quem se coloque a jeito de os ouvir. O que se recomenda é que jamais lhes de a mais mínima oportunidade de iniciarem o seu “canto”, pois que uma vez ligada a fita é difícil interromper e escapar incólumes.

domingo, 17 de março de 2019

TOT CAPITA TOT SENTENTIAE

Tantas cabeças tantas sentenças

Habitualmente aceitamos, mesmo que algum ranger de dentes, que as opiniões que dois dialogantes possam ter sobre qualquer assunto não coincidam, ou sejam claramente opostas, incompatíveis. Caso alarguemos o inquérito, sem condicionar as respostas, deixando total liberdade de expressão e opinião, certamente verificaremos que o leque de respostas cada vez é mais lato.

E se repetimos a pergunta, com alguma variante de léxico mas procurando que não se altere o fundo da questão, até pode acontecer que os que deram uma opinião determinada, na segunda volta mudem para o sentido oposto.

Esta constatação, que não é taxativa mas que é real, nos leva a um segundo cabeçalho para este escrito:

VOLÚVEL OU OBCECADO, EIS O PROBLEMA.
(uma variação à guitarra da frase célebre de Shakespeare)

As duas posições, opostas numa primeira análise, podem ser alvo de críticas ferozes. Uns opinaram que o mudar de opinião como de camisa -mesmo que só a mude de longe em longe-, mostra não ser uma pessoa de palavra e que o seu pensamento é tão mutável como a seta de um catavento. Mas aquele que não arreda das suas ideias fixas também não escapa das críticas, pois que não aceita modular as suas opiniões em função da evolução a que todos estamos sujeitos.

Fisiológicamente já todos leram, mesmo que não fixassem ao pormenor, que o nosso corpo, desde o cabelo até às unhas dos pés, incluída toda a aparelhagem que carregados no interior do corpo. Mais a estrutura óssea e a derme, constantemente rejeita células mortas e se renova com novas. Não vale a pena fixarmos um período geral, pois certos órgãos devem ter um tempo útil mais longo do que outros. Mas, o conjunto, desde a concepção até à morte, muda paulatinamente. Enquanto estamos vivos, evidentemente.

E as nossas ideias, as nossas sentenças, incluídas as que ficam internas e por isso não se apresentam á crítica exterior, tem que ser sempre idênticas? É pouco provável. Todos admitimos que as reacções e os critérios extremistas, próprios da puberdade e juventude, vão perdendo intensidade e vão mudando, modulando, passando até para o sentido oposto, sem ser súbitamente. Leva o seu tempo. Não é por acaso que se refere: O velho muda o conselho.

O tempo que a Parca nos concede, apesar de nos parecer curto, ou longo -consoante o momento e o nosso estado de espírito-, é suficiente para que assistimos a mudanças, lentas ou súbitas, que nos pressionam para alterar algumas noções de consideramos estarem imutáveis, de pedra e cal. Algumas não as podemos atribuir directamente à influência de outras pessoas, governos, leis e outros condicionalismos que não dependiam de nós. Outras serão consequência da passagem do tempo e de como, tal como as estações do ano, nos condiciona.Em suma,podemos afirmar que o nosso leque de possibilidades de opção e decisão é mais reduzido do que habitualmente pensamos. Ou nem sequer dedicamos algum tempo de meditação para especular sobre isso.

sábado, 16 de março de 2019

SOL LUCET OMNIBUS - o sol nasce para todos



Ou como encarei a minha formação universitária.

Admito que os poucos leitores que perdem tempo a ler o que coloco aqui sabem que tirei um curso superior de Engenheiro Químico Industrial (no tempo em que era completo). Mais concretamente pensando, desde inicio, em dedicar o que viesse a aprender numa indústria transformadora. Não tinha pretensões de me integrar em entidades públicas, fossem de ensino ou de investigação. Ou seja, tomei a formatura precisamente pelo cabeçalho.

E tinha, além das bases teóricas, uns conhecimentos practicos e humanos que sabia iam facilitar a condução de homens, tanto dos quadros subalternos como dos operários. A primeira regra que devia aplicar era a de não falar com o pessoal desde cima da burra. Vestí sempre um fato-macaco e admiti que, depois de explicar, numa linguagem que se adaptasse á do ouvinte, e ter deixado as indicações por escrito, devia ficar um tempo, não demqsido curto, para a observar como o operário agia.

A segunda regra, que se aprende para benefício próprio, é que após ensinar como devem manobrar, regular, apontar no quadro, e em periodos determinados, os valores que em aparecem nos indicadores do painel de comando. Assim como é de sábio admitir que, com a práctica, o operador tanto pode cair numa manobra errada como pode encontrar uma solução que não estava prevista. Em laboração contínua, mesmo que ser der a ordem de que nos devem comunicar qualquer anormalidade, sabemos que, quando a complexidade do sistema operativo e das diferentes fases e equipamentos por que passam os materiais, desde as matérias primas até o produto final, é fundamental contar com uma equipa de pessoas que nos aceitem, que colaborem sem preconceitos sociais que podem interferir.

Não se consegue navegar e chegar a bom porto com uma tripulação desajustada do comando. Sempre entendi que era positivo ensinar os colaboradores acerca das tecnologias que se aplicavam na fase que estava a seu cuidado. Bem entendido que não se pode pensar em ilustrar por completo a pessoas que até o dia anterior nunca tiveram contacto com aparelhagens complexas e desconhecidas. E sempre foi positivo dar oportunidade ao operador para nos referisse as suas observações. Serenamente tinham que ser observados os efeitos e, caso fosse pertinente, incorporar às intrucções gerais. Os mal sucedidos só se sabiam a posteriori.

Considerei, desde o primeiro dia, que era fundamental o dialogar com o pessoal, reconhecendo no íntimo, que dependemos deles. No trabalho fabril todos os elementos humanos são importantes e, em princípio, merecedores de ser respeitados. Se algum se mostrar incapaz temos que lhe procurar um posto onde se possa adaptar, sem o achincalhar. Este é o melhor exemplo que se pode dar ao resto da tripulação.

Outros problemas, potencialmente mais bicudos, podem-se encontrar com os patamares mais acima do nosso. O pior sucede caso “lá de cima” se decidam alterações que afectem o pessoal que se tem para laborar. Os administradores, em geral, agem de acordo com regras próprias e não estão preparados para avaliar as consequências a nível funcional. Nem sequer tal os preocupa. Não querem saber. Esquecem que podem afectar pessoas, sensíveis em grau que não podem imaginar, e que por isso devem ser tratadas com cuidado. Depois são os quadros de topo que tem que tentar colar os pratos rotos.

Mesmo assim eu, pessoalmente, estaba dedicado totalmente a esta tarefa de intermediário, comulativa com a producção, qualidade e rentabilidade. Sabendo que ao contrário da Isabel de Aragão, citada com frequência, nem tudo eram rosas, e estas sempre traziam espinhos.

quinta-feira, 14 de março de 2019

CARREGAR UM ESTIGMA




Se atendermos ao dicionário o termo ESTIGMA correspondem, entre outras aceitações: Marca infamante feita com ferro em brasa (livra ! Como nos romances de Alexandre Dumas e similares!) cicatriz; ferrete, sinal infamante. Prefiro adotar uma interpretação mais de acorde com as letras de alguns fados castiços: Ter o destino marcado.

Pois eu, sem nunca ter chegado ao nível de um “entretainer” pago e procurado, desde os tempos da primária que fui classificado como “engraçado”, que era capaz, e com certa frequência, de sacar bico não só ao lápis de pau, mas também a uma situação ou a uma conversa que, para os outros presentes não dava azo a um trocadilho gracioso. Concretando, que fazia rir a  assembleia constituinte.

Todavia esta capacidade, espontânea, nunca conseguí que se mostrasse “a pedido”. As graças surgem no meio de uma conversa, e também em situações em que não se considera serem as adequadas para gerar e transmitir graçolas. Quanto mais séria fosse a situação em que me encontrasse, aquele respeito geral, do qual não acreditava ser real, mais incitava a ver, entre os assistentes uma personagem que destacasse, fosse por dormir e ressonar, ou por fazer limpeza às narinas, entre outras atitudes. Podia ser o reparar que “ele” apalpava o nalguedo da sua vizinha, nomeadamente se esta não fosse a sua companheira oficial, sem que ninguém se desse por achado.

Já sabemos que funerais e outras cerimónias "respeitáveis", sejam religiosas ou civis, prestam a incitar apartes que não estão propriamente ao nível do momento. Mas precisamente são nestas alturas de manter um digno e respeitoso recolhimento que mais me pica a vontade de soltar uma barbaridade.

Esta dissertação a laia de introito foi a consequência de ter lido certos artigos de imprensa ao longo dos derradeiros dias. Somos avisados, já depois do leite derramado, acerca de que a evolução da tecnologia informática colocou a clássica censura no lixo. Além de que poucas cartas se escrevem para ser enviadas pelos serviços postais, nem sequer é necessário ouvir ou gravar directamente as conversas telefónicas.

Sabe-se que todo o correio electrónico, e qualquer documento transmitido por via electrónica, além dos telefonemas e conteúdos pessoais nas redes sociais, são constantemente contrastados por servidores automáticos que, por meio de palavras-sinal (os tais algoritmos) gravam, seleccionam, arquivam e oferecem, seja a organismos oficiais, oficiosos ou particulares, enormes quantidades de detalhes pessoais, que podem ser úteis a terceiros sem que o visado tenha conhecimento e muito menos autorizado.

A primeira recomendação que nos fazem aqueles que sabem que outros sabem, ou podem sabem, é o de não referir, voluntariamente, pormenores da nossa vida pessoal, familiar e profissional, incluídos os nossos passatempos preferidos. Que evitemos disseminar pormenores pois que nunca podemos prever a que propósito lhes podem interessar.

Pessoalmente e dado que sei estar de partida, já em nada me afecta que seja quem for confirme que sou, intrínseca e visceralmente, um “hilário”, um “piadético” empedernido e irrecuperável, e que não me envergonho desta característica dado que desde muitas décadas atrás (mesmo desde a escolinha pré-primária) isto é do conhecimento geral.

Além do mais estou convencido de que um cómico, um palhaço se descermos na qualificação, só pode ser bom no que faz se, enquanto actua, diverte-se. Nota-se que está na onda e gosta do seu trabalho quando altera os seus números com emendas que lhe surgem espontaneamente. No teatro de revista dizia-se que estas inclusões,inesperadas mas aguardadas, se referiam como "buchas"

Para quem seja curioso confesso, sem me envergonhar, que inclusive quando estou só, desfruto fazendo palhaçadas e dialogando (em monólogo) tontices para o meu exclusivo gaudio. Já devia estar isso na minha ficha pidesca.

terça-feira, 12 de março de 2019

GANHAR OU PERDER - PERDER OU GANHAR



A ordem destas duas situações, mesmo que em ambos casos implique que de um lado se consegue alguma coisa que não se tinha e do outro lado se perde alguma coisa que se possuía, não é indiferente, pelo menos para quem tem algum ligame com esta dicotomia. Daí que, para quem escreve e para quem ler, a ordem não é displicente.

É um tema que tem sido abordado por muitas pessoas, e desde tempos recuados. Habitualmente é conectado com os jogos de fortuna, ou de azar a avaliação de cada um. E neste capítulo encontram-se muitas verdades irrefutáveis, como: Quem muito quer tudo perde, ou, Quem não arrisca não petisca, assim como se recorda a sensatez e a prudência: Quem não quer perder não jogue. Assim como avisa Quem usa tramoias cai nas sentenças.

Deixando os adágios de lado podemos divagar -que é o que se recomenda para chegar ao longe- sobre o que de facto está subjacente aos termos ganhar e perder.

Perder para a maioria dos cidadãos equivale a deixar de ter algo que era seu, de direito. Simbolicamente ou factualmente podem-se perder a virgindade, a honra, a própria vida, a fortuna, o respeito que consideramos merecer, e outras coisas mais, entre elas um familiar, a carteira, os óculos, o comboio ou um meio de transporte que estava no nosso propósito utilizar. Mas sempre se entende como o deixar de ter.

Quem aposta e não ganha, de facto só perde aquilo que colocou de penhora, nem que seja dinheiro vivo. De imediato atribui a culpa ao azar, à pouca sorte, mas raramente se culpará por não ser sensato e previdente.

CARLOS BERTINI escreveu, e eu aproveito, um pensamento muito válido Devemos ganhar com graça e perder com dignidade.

Quanto ao GANHAR nem todas as situações são equiparáveis, pois que a vida não se resume a uma série de apostas, nem sempre honestas na sua estrutura. Existem ocasiões em que se confunde recuperar e ganhar. O ganho é visto como uma recompensas do trabalho ou do esforço. Muitas vezes é impossível recuperar aquilo que se perdeu. Nem todas as perdas se podem emendar como o virgo, Mas o chegar a um ponto em que seja reposta uma injustiça é uma satisfacção tão profunda que consegue amainar todas as agruras anteriores.

As máximas que se aplicam a esta situação são muitas. Algumas nos podem parecer que foram pensadas concretamente para situações da vida corrente, e certamente que assim foi: A razão é a prova da verdade, e precisamente a verdade mereceu muita atenção: A verdade não sofre dissimulações; A verdade não tem pés e anda; A verdade, ainda que amarga, se traga. E a parceira do lado oposto não deixa de ser citada: A mentira é sempre vencida; O mentiroso larga a honra a pouco preço.

E por falar em honra citaremos: Honra e proveito não tem jeito; Honra é sem honra, alcaide de aldeia e padrinho de boda.



SERÁ DEFEITO OU VIRTUDE ?




A pergunta pode ser apresentada de outra forma: Aceita que se atirem pedras ao telhado do vizinho ou admite que cada um deve ser dono de optar pelo que entender, sempre e tanto que não incomode os outros?

Este pensamento, que nem sequer tenho a ideia de que seja exclusivo da minha mioleira, surgiu após meditar sobre a vocação que algumas pessoas manifestam renegando das decisões de outrem. Por vezes pouco falta para que deitem fora, ou dentro de locais com accesso livre, afirmações que se podem qualificar de cobras e lagartos. Nem sequer estou em sintonia com aqueles que pretendem “catequizar” o pensamento alheio, tentando assim os levar para o seu sector.

Atitude diferente é a de apresentar as suas crenças com honestidade, ou até com leves mostras de não concordarem, mas mesmo assim esta abertura ao exterior, que a podemos aceitar como dispensável, nem sempre temos a percepção de que pode ser prejudicial, para quem se “despe” perante estranhos,  e até pode ser considerada como reprovável, dada a possibilidade de poder influenciar alguém que até então se sentia satisfeito com as suas noções e ideias,mesmo que outros as rejeitam por princípio. O afectado pode passar a sentir-se culpado e, em consequência, ficar pressionado.

Se dermos algum crédito ao que as Sagradas Escrituras, nomeadamente o que se diz nos versículos do Antigo Testamento, lá encontraremos a afirmação de que “o Supremo Criador” ofereceu ao homem -e possivelmente também à mulher- a liberdade de pensar e agir do modo que entendesse. MAS... sob certas condições, pois este bondadoso patrão tinha ideias bem concretas de como desejava que as suas criaturas se comportassem. Mesmo assim, as suas exigências e punições -que na primeira fase,ou Antigo Testamento, eram terríveis, drásticas até mais não, quando a idade a lhe pesar e o obrigou a ser mais comedido, permitiu excessos que não deveria ter deixado passar ao largo.

A mudança de atitude de Jeová foi, se atendermos aos acontecimentos, o deixar de ser Ele o carrasco oferecer, gratuitamente, este privilégio ao homem. Ou mais claramente. Entendam-se ou lixem-se. Eu fico a ver.

Mas podemos saltar por cima destas palavras orientadoras e ficar com a noção de que o pensamento deve ser visto e avaliado, sempre, como livre. Infelizmente esta faceta, basilar, da liberdade nem sempre é respeitada pelos bípedes, nossos parceiros nesta viagem planetária pelo cosmos.

Tal como tenho feito noutras ocasiões, pensei em pesquisar, nos refraneiros de que disponho, os ditados, anexins e outras máximas equivalente que a sabedoria popular foi acumulando, onde se comentassem as virtudes e defeitos que o homem (sempre com a mulher incluída) tem insistido em aderir. Encontrei mais referências sobre os defeitos do que das virtudes. Desisti, para bem da humanidade. Fico-me aqui, sem cumprir o meu imaginado roteiro.

segunda-feira, 11 de março de 2019

MENSAGENS CRÍPTICAS



Para aqueles estudiosos dos desportos de pontapé que, como é de prever, desconhecem o significado deste cabeçalho, não os vamos esclarecer. Até porque às claras, batidas em castelo e cozidas num volume adequado de leite -de preferência de vaca e não de boy Apis- nos podem oferecer uma iguaria (?) que a mim, pessoalmente, as tais farófias não me entusiasmam. A não ser que venham recobertas com um leite-creme sem defeitos de maior, nem de menor, ou mesmo de nível intermédio. De preferência caseiro/a, e não de inquilino/a.

Uma mensagem críptica que guardo na memória, fechada a sete chaves e dois cadeados de segredo, como as mensagens de Fátima, diz assim, e assado, frito e cozido, sem deixar de aceitar a opção do grelhado à Lourenço, ou seja, nas duas faces da lua, agora já com possibilidade de serem conhecidas em pormenor depois de ter aluado -como os gatos no cio, ou mais croquetamente as gatas- uma geringonça chinesa, que compraram num estaminé de paquistaneses.

Pois, retomando o fio da mijada (um dia qualquer, nem que seja de noite, e se para tal cometido for intensivamente requerido, posso expilicar o que vem a ser isso do fio da mijada. Tem alguma piada e é mais autêntica do que uma nota de sete aéreos) a frase críptica do dia é... TACHIM TACHIM, cá vai ela: NÃO SÃO TODOS OS QUE ESTÃO NEM ESTÃO TODOS OS QUE SÃO.

Inicialmente, que significa que falta-se à verdade logo de princípio, sem que se ponha em dúvida, nem dívida, a afirmação, também quase críptica de que NO PRINCÍPIO ERA O VERBO. Evidentemente neste caso croqueto recomenda-se que o verbo não seja muito longo, ou seja, que não se espalhe ao comprido, já que existe o famoso risco que marca o limIte do aceitável, e que deve evitar-se pisar o dito. Não só o tal risco encarnado, mas o verbo propriamente dizido. Mas o outro, que não identifico porque sou muito respeitador.

Pois bem, como tinha pensado logo no início inicial,ou seja, mesmo antes de começar com esta krónika, tinha in mente oferecer um prémio a quem respondesse, cabalmente -ou seja segurando um cabaz enquanto se encontra cavalgando num caval- Mas, ao longo do devaneio, deitado irrespetuosamente sobre um divâ, cheguei à conclusão conclusiva e concludente -ou seja que pouco cozida- de que tal iniciativa seria equivalente a pretender subornar algum leitor, um mais incauto, nomeadamente algum que não tem automóvel próprio. Por esta razão, onde se encontra o Deve e o Haver, e em cujas páginas o monge -dado o hábito que veste- reclama mais do que lhe prometeram e não cumpriram do que o bicoversa, que é como quem diz, torcem o bico.

Só uma pista, de carrinhos de choque, que já quase desapareceram das feiras, dado que a malta prefere bater com o carro durante os períodos de férias, de preferência já devidamente carregados de shots de bebidas espirituosas -daquelas que fazer gargalhar estupidamente- e a coberto das altas horas da noite cerrada, melhor até se o pavimento estiver molhado e as rodas com o piso já sem cabelo, ou seja, karekas.

A pista, que neste momento está parada e por isso a podemos atravessar, é que a dita cuja frase consta -sem que a tal me sinta vocacionado a dar a minha palavra de honorável cidadão- do frontispício de alguns estabelecimentos humanitários. E não posso fornecer mais detalhes porque já tenho as unhas gastas de tanto bater nas teclas do teclado, que não nas do piano, nem do órgão, pois que neste não encontrei jamais quaisquer teclas. Se calhar me enganei de órgão!


domingo, 10 de março de 2019

AS MULHERES MANIFESTARAM-SE




De entrada quero deixar bem evidente que nada tenho contra as mulheres. São elas quem nos trazem ao mundo e, se tudo correr como está previsto, elas é que nos cuidan, nos alimentam, nos ensinam a falar e muitas mais coisas elementares. E ainda nos acompanham ao longo dos anos. As mães serão substituídas por companheiras, esposas se preferirnos, e a cadeia normal da evolução social continuará (assim espero) com mais ou menos sobressaltos e variações (à guitarra ou à viola, se forem violadas).

O que, visto friamente, foi reservado para as mulheres é uma longuíssima lista de afazeres, extensiva e exhaustiva, que as têm mantido como “fadas do lar” ou como “serviçais sem ordenado e poucas regalias”, ao que se deve acrescentar o terem que ser, gostasse ou abominasse, o veículo que possibilita o famoso “descanso do guerreiro”.

E isto é assim desde o tempo do homem das cavernas, ao que se seguiu o “homem das tabernas”, aquela figura que se descreve como chegando ao seu lar (que de facto deveria ter sido sempre o lar dela) embriagado de álcool ou de um futebol mal digerido e descarrega a sua frustração no corpo da vítima lá de casa.

Não ficamos admirados de que as mulheres se revoltem contra a triste sina que lhes foi reservada nesta sociedade “machista e patriarcal”. Já deve ter passado quase um século, ou mais, desde que as primeiras feministas se manifestam, e algumas queimaram, simbólicamente, os soutiens como símbolos de opressão.

Atitude que foi aplaudida por “gregos e troianos”(*) quando os seios das damas eram de dimensão reduzida e ainda erguidos por natureza. As mais encorpadas, devem ter queimado as peças mais deterioradas e de imediato vestir as que lhe beneficiavam a figura. É assim como em muitas ocasiões existe uma realidade que se contrapóe aqo que se manifesta.

Mas o cerne da questão não está exclusivamente na revolta contra a escravatura familiar, contra a desproporção do trabalho efectivo e contínuo, das mulheres comparativamente com o mais tranquilo e menos permanente dos homens.

A desculpa da capacidade física para esforços já não é possível ser admitida, pois mesmo nas sociedades menos desenvolvidas, vemos mulheres carregando pesos exagerados, trabalhando no campo e, durante os últimos grandes conflitos bélicos, as damas substituiram, eficazmente, os homens nas fábricas. Além disso também existem damas que practicam musculação, não se limitando a fingir que andam sobre um tapete rolante o pedalando numa “chiclete” que não sai do lugar onde está.

Quando a mulher entrou na área do trabalho remunerado, primeiro em fábricas onde se lhe pagava, e ainda se paga, de forma discriminada. Mais adiante, progressivamente, escalou até posições de topo E é natural que muitas já se sintam em condições de ombrear com os cavalheiros e daí sentir-se mais independentes e ansiosas de poder tirar de si as tarefas que, tradicionalmente, lhes estavam reservadas. A revolta actual está, portanto, centrada no desejo de deixar ser a esposa e mãe, se a esta posição lhe têm que corresponder, forçosamente, uma escravidão sem fim.

A primeira decisão importante que muitas mulheres tomaram foi a de protelar a maternidade. Já foi conseguida por muitas senhoras, muito ciosas da sua figura e da sua situação de topo. Seja no âmbito profissional ou social. Mas quem pode vir a sofrer com estas gravidezes tardias, -e sofre em muitos casos- é a inocente descendência, que não foi tida nem achada nestas decisões tão meditadas, ou levianamente decididas.

Seja como for. Tal como se dizia décadas atrás é à fruta da época. Se bem que a que estava sempre disponível era a banana.

(*) por assim dizer, “eles e eles, pois se não referirmos as “lésmicas” são os machos os que mais são atraídos pelas glándulas mamárias das femeas. As tetas são um fetiche perpétuo, pelo menos as não pendentes... Uma memória perenne da fase em que se alimentavam directamente do corpo da mãe - ou de uma ama. Não encontrei nenhuma citação de que um fulano sinta uma atracção intensa ao ver um biberão, mamadeira no Brasil.

sexta-feira, 8 de março de 2019

PODEMOS ESQUECER A POLÍTICA?


POR MUITO QUE QUEIRAMOS É IMPOSSÍVEL

Somos muitos os cidadãos que, sejam quais forem as razões que apoiem e decisão, optamos para não entrar na política partidária, com a qual amiúde não nos sentimos representados, dao o profissionalismo corporativo e de nítido compadrio.
Mas esta opção de liberdade leva-nos à triste conclusão de que, só quem estiver numa ilha deserta, como um novo Robinson Crusoe, é que poderia escapar das múltiplas pressões que nos regem. A partir do decálogo que Jeová entregou a Moises, tem-se complicado cada vez mais, regulamentado, ameaçando e punindo (quando se chega a esta situação) sempre sob o comando de uns delegados, que o são através de processos políticos.
Para que não julguemos que existem vias livres por donde poder escapar a todos os códigos optarei por, sumáriamente, referir os diferentes capítulos que, habitualmente, são utilizados para situar as regras que nos regem: Organização do Estado; Ligações com outros países; Legislação Internacional; Educação; Saúde; Cultura; Trabalho; Lazer; Assistencia social; Meio ambiente; Transporte; Habitação; E mais algum capítulo que me tenha passado. Até o que nos deve acontecer depois de morrer está legislado e regulamentado, com taxas e coimas, que devem satisfazer os herdeiros.
Sendo tão abrangente o que fica decidido por políticos, que se diz serem os nossos depositários, ou mandatados, através de votação universal e secreta, mas que, de facto, raramente conhecemos aqueles que foram seleccionados pelas estruturas partidárias, em nosso nome (?) Admitindo que um cidadão comum, isolado, pouco ou nada pode fazer para se opor a decisões colegiais que o afectem pessoalmente, e que se o tentar pode encontrar-se com novos problemas, o mais habitual que opte pela posição menos molesta. Tornar-se abstencionista. Que de facto tampouco é uma solução.
Esta pretensa abdicação dos seus direitos políticos, que são mais teóricos do que reais, é uma atitude, compreensível, adoptada por muitos adultos jovens, e não só. O que de facto acontece é que deixam o campo totalmente livre e disponível para que os políticos, que o abstencionista detesta, cortem e cosam a vida de todos a seu bel prazer.  Isso não impede a que o abstencionista deseje que com o seu "não acto" deram mostras, inequívocas e ineficazes, de desagrado.
A sociedade criou, por mãos hábeis, um amplo esquema de controlo, que mesmo com mudanças profundas ou simples maquilhagens, permanece vigente. De nada serve tentar manter-se ao largo, pois tarde ou cedo nos encontramos embarcados numa nave em que não confiamos e que nos leva a rumos indesejados.
Que fazer? Quem tiver uma receita válida para agirmos aqueles que não temos "vocação política" e que, visceralmente, rejeitamos "esta gente", podem ser amáveis e simpáticos nos oferecendo a sua solução para a partilhar. AGUARDAMOS.

quarta-feira, 6 de março de 2019

SABE COM QUEM ESTÁ A FALAR ?


VIRÃO INQUIRIDORES COM TOGA ?

Pensei que esta frase, desafiante, já tinha passado á história.Tal como os auroques que os primitivos gravaram nas encostas de Foz Côa.

Claramente um erro de avaliação, pois mesmo que já não nos apareçam aqueles emproados que exigiam ser tratados com extrema deferência, esticando o pescoço como galos prontos a bicar e que foram caricaturados por Ramalho Ortigão e seus contemporâneos, sucede que mudaram de fato, de roupagem, mas no fundo continuam tão emproados como outrora.

O que acontece, e na tranquilidade dos dias não avaliamos, é que a sociedade continua a estar organizada por patamares, mais ou menos estanques, reservados, onde aqueles que se acoitam num determinado estatuto já se consideram, quase que por designio divino, merecedores de usufruir de umas regalias especiais, que incluem tratamentos sociais específicos.

A evolução da sociedade, começando pela universalidade do ensino, e consequente desaparição do analfabetismo total (substituído pelo analfabetismo funcional) exceptuando alguns cidadãos mais idosos, e avaliando a influência que tanto a televisão como a internet tem tido no comportamento das pessoas, temos que reconhecer que a uniformização não fica restrita a pequenos detalhes. Não só a totalidade dos cidadãos já anda calçada e vestida, sem ser com farrapos, como também se sentem integrados num mundo de cariz democrático e, em consequência, aparentemente igualitário. Podem parecer pequenas conquista, mudanças de fachada, mas em verdade muita coisa mudou. Mas não tudo!

Habitualmente não se dá muita importância à máxima de que somos todos iguais, mas uns são mais iguais de que outros. A mensagem é tão clara que consegue ser indigesta, pois contraria o mais elementar princípio de direitos dos cidadãos em geral. E quem acredita na igualdade? Se nos tempos de Eça eram habituais os tratamentos, sempre respeitosos -com o chapéu ou o barrete na mão- ao Senhor Conde, Visconde, Morgado, Doutor, Juíz, Bispo, Coronel, etc., o que hoje ouvimos é equivalente, pois de Doutores e Engenheiros está a rua cheia.

O curioso e aparentemente desvalorizado é que alguns núcleos de tipo corporativo conseguiram manter ou adquirir de fresco um estatuto de impunidade e de não aceitar críticas, sob pena de reagirem exigindo sanções. Parece que não se pode consentir que se apontem erros ou pareceres pessoais que sejam vistos como não aceitáveis pela cidadania. A noção de que as leis em vigor devem corresponder à aceitação tácita da população pensante e minimamente culta, em sempre se verifica.

Saíram à tona aspectos e reacções que nem sequer nos séculos da monarquia absolutista eram aceitáveis. Se as críticas que se consentiam aos bobos da corte, e aos artistas que representavam autos sacramentais com alusões de denúncia, reclamação ou sexualmente atrevidas, mas em geral bem explícitas, sofressem os castigos que seriam equivalentes aos que se sugerem hoje, nem Gil Vicente escaparia a ir praticar remo nas galés.

No século XIX, ainda com a monarquia parlamentar, o modo como se criticava e satirizava, caricaturalmente e em textos de denúncia explícita, o monarca, os ministros, o clero e todos os que tinham poder, era muito mais agudo do que hoje. Bordalo Pinheiro nos deixou publicações que elucidam bem a existência de uma oposição ao regime, mesmo que se soubesse que só era conhecida por uma fracção muito restrita da população.

Também podemos referir, e recordar os que viveram no período da ditadura Salazarista, que permitiam-se comentários com críticas ao governo e entidades oficiais, mal disfarçadas, nas peças teatrais do nível de “revistas”, em especial no dia da estreia ou ante-estreia, piis que na segunda representação já a tesoura tinha dado alguns cortes. Mesmo assim muita crítica se deixava seguir, para que os espectadores pudessem rir-se e aplaudir atrevimentos que só ali se consentiram. Uma válvula de escape, com efeitos limitados, mas que sempre se disseminava.

Nesta época, que se diz corresponder a um retorno para a direita mais ferrenha, teme-se que se inicie uma “caça às bruxas” entre os humoristas atrevidos e desrespeitosos. Oxalá não se cumpram estes maus prenúncios.

domingo, 3 de março de 2019

UM MILAGRE ACTUALIZADO




Quando leio ou oiço referir o milagre das rosas sob a autoria da Isabel de Aragão, e que também foi conseguido por uma sua parente Isabel de Hungria -devem ter andado na mesma escola ou estudado os mesmos tratados de ilusionismo- tinha eu o hábito -mesmo não sendo monge- de afirmar, sem uma base fidedigna em que me apoiar, que esta dama, rainha de Portugal por casamento, tinha pronúncia de zopinhas de massa, e que por isso contestava ao rei Dom Dinis “zão zozas”.

Lembrei esta falsa vivência ao ver que estamos perto de ganhar o festival das cantigas na eurovisão, acumulando com os prémios oscáricos que tem ganho o nosso actual ministro das finanças, mesmo que estando em tempo parcial.

O seu já habitual truque de orçamentar por cima do ano anterior, mas cativar com uma percentagem castradora é formidável. Creio que nem sequer foi este Doutor em Economia Doméstica que descobriu esta forma de fazer render o peixe. Muito antes dele já o Salvador Jesus da Nazaré, que também atendia por Emmanuel, Manuel, Manel ou Manolo entre andaluzes, aplicou esta receita ao distribuir sandes de pão e peixe a uma multidão, partindo de uma quantidade de alimento bastante reduzida: uns cabazes, poucos, segundo creio recordar de quando me ilustraram desta façanha na “doutorina”. Só bastantes séculos mais tarde é que, por causa da dissidência do malandro Enrique VIII, la pelas bandas da Britânia se distribui o peixe frito junto com batatas aos “paulitos”

Mesmo antes de começar esta dissertação pensei no quão mau gestor familiar fui quando os nossos filhos recebiam uma semanada.
Devia ter posto o dinheiro que pertencia a cada um, na mão, mas antes de que o dito descendente fechas se os dedos, pensando já em onde poderia investir a massa, teria que lhes retirar entre 20 e 50 % do total como cativação. Afirmando, com ar solene, que me encarregaria -esperando que eles, inocentes, acreditassem- de imediato colocaria estas importâncias numas conta bancária em nome de cada um, a fim de que, em chegando a ocasião, já crescidos e desmamados, pudessem dispor de uma quantia avultada.

Poderia ter funcionado naqueles tempos, em que os filhos se esforçavam par acreditar, de pés juntos e olhos fechados, em tudo o que os pais dissessem, mesmo quando sorridentes. Execpto se entrassem numa de escandalosas gargalhadas que os levassem a uma crise asmática. Mas duvido que hoje, já tendo ouvido comentários sobre as tretas centenárias -apanharam esta? Era fácil- das cativações caíssem na cantiga, como cidadãos responsáveis mas na realidade iludidos e submissos.

A PROBLEMÁTICA DOS BAIXOS SALÁRIOS


Entre as muitas choradeiras e lamúrias com que, neste País de fado,parece que nos deliciamos uma destaca, pela continuidade e por sentir que  temos o destino marcado, pelo menos neste capítulo. Refiro-me aos baixos salários e aos contratos a tempo certo, quando mesmo sem qualquer espécie de contrato.

Neste capítulo existem vários factores que influenciam a situação. São tantos que quase envergonha referir uns tantos, mesmo que não todos. Mas é pertinente saber,que esta situação não apareceu por acaso. Não foram os fados que se deliciaram condenando os mais jovens à situação de nem-nem. Devemos reconhecer, que a degradação dos salários para os não especialistas e de que para uma oferta de emprego existem dezenas de interessados, mesmo que com baixas remunerações e sem garantias. É uma moléstia hoje endêmica na Europa, que podemos valorizar como uma epidemia sem cura imediata. Antes pelo contrário.. 

Em todos os países notou-se que um dos efeitos da globalização mais a deslocalização, e a automatização de indústrias, que eram não só consideradas essenciais pelos seus productos como pela estabilidade social. Algumas indústrias foram encerradas com a desculpa de serem poluentes e contribuírem para o problema do aquecimento global. Mas a necessidade de aço, cimento e outros produtos "nefastos" mas necessários, foram transferidas para outras zona do globo, poluindo a atmosfera, os terrenos, as água e os mares, mas longe das nossas casas. VARREU-SE PARA DEBAIXO DO TAPETE.

Raras são as fábricas que tradicionalmente eram de  mão de obra intensiva que não estão integrando a automatização da produção,precisamente para dispensar operários (enquanto a população mundial continua aumentando) A rentabilidade dos investimentos não pode ter sentimentalismos,sob pena de ser liquidado pelos concorrentes. Sem referir a já citada decisão de transferir a produção para países onde a mão de obra ainda é muito barata. Entre nós, só vemos imagens de muitas pessoas atarefadas numa nave se trabalham à peça ou se estão contratadas por períodos curtos, nos tais call-centers. Até estes transferem o serviço telefónico para outros países, mais baratos, fingindo que estão ao pé de nós.

Esta degradação salarial, já é um problema social geral no ocidente europeu. Sendo mais agudo nas zonas em que não existia uma tradição de industriais ávidos de criar e manter grupos fabris e comerciais. Quando os empresários se satisfazem com um volume de negócio relativamente pequeno, que consideram poder gerir sem problemas de maior, podem manter a sua independência durante uns tempos, mas tanto podem cair por não resistir à concorrência como podem tombar quando decidem ampliar o negócio sem ter capacidade financeira própria, que os leva a estender a mão  aos banqueiros, sem os quais sabem que não podem atender as necessidades de expansão. 

Para alguns cidadãos, que não admitem nem podem subsistir na situação de desempregados ou mal remunerados, o panorama de futuro parece um retorno ao passado. Iniciarem-se na categoria de empresário individual, que em pouco difere do anterior artesanato, com a agravante de que já não existem os grémios que coordenava e regiam a concorrência. Aquele artesanato nacional que ainda existia umas décadas atrás e que tinha como clientes a população local ou regional, hoje está abandonado e destinado a rumar no abastecimento aos turistas se pretende subsistir. A concorrência e o novo tipo de compradores os levou a se abastardar, produzindo falso artesanato tradicional.ou aceitar ser revendedor de artigos fabricados no oriente.



Aquilo que não mudou, nem mudará, mesmo que a aparência seja favorável, é a desagradável exploração do homem pelo homem. Sempre existiram e existirão excepções honrosas, mas a natureza do homem é de ganhar com o suor de outros. Não existe uma saída? uma escapatória? Como sempre acontece existem,de facto, soluções pessoais, individuais, com as que se possa dar o salto. Primeiro como indivíduo isolado e, caso o sucesso se mostre credível, avançar para pequeno empresário. Mas continuar a avançar não esta ao alcance de todos.

sexta-feira, 1 de março de 2019

PISANDO O RISCO DO PLÁGIO



E DA BLASFÉMIA (com passagem directa para a fogueira)

Admito, sem vergonha mortal, que a minha capacidade de arquivo acessível tem diminuído fortemente nos últimos dez anos. Atendendo a este facto, incontestável, decidi reler alguns dos livros que tenho em casa, sabendo de antemão que já os li alguns anos antes, mas que não sou capaz de os resumir por não os recordar plenamente. Só ao longo da segunda leitura é que vai aparecendo à tona algumas fases do argumento. Mas jamais consigo recordar o desfecho.

Este prelúdio, por assim o chamar, vem a propósito do que encontrei, esquecido, no meio de uma obra escrita por EDUARDO MENDOZA, com o título A assombrosa viagem de Pomponio Flato.

O tema concreto, parcial, que me causou um impacto é onde debate a dualidade entre matéria e espírito. A personagem que medita e tira conclusões acerca da da continuidade das pessoas depois da morte corporal, baseando-se na ideia da permanência da alma, admite que esta faceta espiritual é a que comanda o corpo, que lhe proporciona a vida. Daí, prossegue no seu raciocíneo, quando o corpo deixa de funcionar, a alma o abandona. Então dizemos que a pessoa morreu mesmo, sem apelo nem agravo, irremediavelmenteMorto o cão terminou a raiva.

Pelo contrário, quando o corpo dorme ou está inanimado por algum motivo, ou seja, que perdeu o conhecimento, a alma fica livre, temporariamente, e pode afastar-se para paragens afastadas, tanto geográficamente como temporalmente. Para a alma, livre e solta, não existem barreiras de qualquer espécie. Pode lutar como um super-homem; enfrentarse a seres mitológicos; ter prazeres físicos que jamais conseguiu conscientemente; assim como cometer as mais reprováveis perversões.

Todavia estas liberdades que aufere a alma, o espírito, dependem da vida corporal. Mal a pessoa acorda, seja de um sonho reparador ou de uma inconsciência, a alma regresa para ser o fiel auxiliar do corpo, em conluio com o pensamento do indivíduo.

Imaginar que a alma continua activa depois da decomposição física do nosso corpo equivale a aceitar que os deuses, ou o Deus único e verdadeiro, insiste em castigar alma pela eternidade sem fim, enquanto que o mais compreensível é que quando o corpo deixe de existir a alma entre no merecido descanso.

Raciocíneos deste teor devem ter orientado certos povos a mumificar os seus defuntos, com a pretensão de que não se decompondo o corpo conseguissem manter o espírito, a alma, activa. Sendo este o propósito se entende porque juntavam à múmia alimentos e pertences que pudesse utilizar na suas andanças incorpóreas.