quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

UM CANCRO COM MUITAS METÁSTASES



Lamento, profundamente, não acreditar nos valores da economia que nos distribuem diariamente. Embora, se olhar pelos cidadãos que encontro nos transportes públicos ou deambulando pelas ruas, fico com a impressão de que o povo está tranquilo e aparentemente satisfeito.

Fica-se com a ideia de que os poucos inconformistas estamos loucos, doidos de meter num manicómio. Salva-nos deste destino o facto de que aqueles locais de reclusão fecharam. Pelo menos os mais conhecidos.

Apesar de estarmos rodeados de pessoas tranquilas e coniventes, nem que seja tacitamente, quase que juraria ue esta aparente satisfacção é efeito da falta de informação. Ou por acreditarem, sem contrastar, em tudo aquilo que nos impingem.

Para avaliar como está espalhado este cancro social em que estamos metidos basta saber, como é nossa obrigação, que os números de emprego, e por reflexo os da diminuição do desemprego, estão viciados pela forma como se fazem as contas. Ali há batota, da grossa! Para já, muitos desempregados deixaram de constar das listas oficiais por diversas razões, especialmente os indivíduos com idade que dificilmente conseguirão um emprego remunerado. Estes desaparecidos por “esquecimento”, que com um excesso de boa vontade podemos considerar ter sido involuntário, o facto é que continuam sem remuneração e sem que as suas capacidades produtivas sejam aproveitadas. E com poucas, ou nenhumas, possibilidades de ver alterada a sua situação de arrumados num canto.

Mas o caso mais grave, não só na actualidade mas, principalmente, pelo futuro que se adivinha, é o da precariedade com baixos salários. As propostas de trabalho temporário sem a mínima possibilidade de poder optar para uma carreira, mas de estar, permanentemente, na expectativa de uma renovação por semanas ou meses, é opão nosso de cada dia para muitos. Ou pior, quando ouve mesmo que a sua colaboração deixou de ser necessária. Um eufemismo para lhe fechar a porta na cara.

É incontestável que, mesmo com esta rotação cruel, podem dizer que há mais gente empregada num dia qualquer. Mas este esquema de contrato, que mais parece uma treta, oferece outra coisa do que a escravidão a longo prazo?

E, pelo que se aprecia, todos os governos que passam pelo País, incluído este da enxertia na esquerda, aceitam sem contestação efectiva esta novidade, cada vez mais habitual extensiva. Os políticos alegam, em sua defesa, que esta situação “anómala” mas já instalada como fixa, foi-nos imposta pela Troika quando estivemos em quebra disfarçada. As vozes que se ouvem discursando na Assembleia da República limitam-se a um blá-blá-blá inoperante, só para figurar nos telejornais e assinar o ponto de estarem muito descontentes.

A gravidade desta situação não fica restrita aos falsos empregos de cada cidadão vitimizado. É muito mais grave, pois além de não se conseguir uma capacitação efectiva nas tarefas que lhe incumbem, e que vão mudar na semana seguinte, as cotizações para a complexa segurança social serão diminutas, ou mesmo inexistentes caso a entidade patronal não cumprir os preceitos legais. Que futuro terão à sua porta estes jovens quando atingirem os 40 e tal anos?

Dizem, os sábios papagaios do regime, que o melhor futuro é aquele que cada um pode conseguir como seu esforço. Ou seja, que passe a ser um empresário individual. Inclusive, de vez em quando e não sei se o esquema funciona, afirmam que existem ajudas monetárias e outras, também importantes, para que os jovens se possam lançar a ser empreendedores. Não contam as dificuldades e exigências com que terão que se enfrentar. Alguns acreditam e metem-se em acção, mas quantos conseguem aguentar mais do que um ano?


E estas são só algumas das metásteses do cancro social que corrói a nossa sociedade. Mas no IPO não podem tratar deste tipo de cancros.

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