Lamento,
profundamente, não acreditar nos valores da economia que nos
distribuem diariamente. Embora, se olhar pelos cidadãos que
encontro nos transportes públicos ou deambulando pelas ruas, fico com
a impressão de que o povo está tranquilo e aparentemente
satisfeito.
Fica-se
com a ideia de que os poucos inconformistas estamos loucos, doidos de
meter num manicómio. Salva-nos deste destino o facto de que aqueles
locais de reclusão fecharam. Pelo menos os mais conhecidos.
Apesar
de estarmos rodeados de pessoas tranquilas e coniventes, nem que seja tacitamente, quase que juraria ue esta aparente satisfacção é
efeito da falta de informação. Ou por acreditarem, sem contrastar,
em tudo aquilo que nos impingem.
Para
avaliar como está espalhado este cancro social em que estamos
metidos basta saber, como é nossa obrigação, que os números de
emprego, e por reflexo os da diminuição do desemprego, estão
viciados pela forma como se fazem as contas. Ali há batota, da
grossa! Para já, muitos desempregados deixaram de constar das listas
oficiais por diversas razões, especialmente os indivíduos com
idade que dificilmente conseguirão um emprego remunerado. Estes
desaparecidos por “esquecimento”, que com um excesso de boa
vontade podemos considerar ter sido involuntário, o facto é que
continuam sem remuneração e sem que as suas capacidades produtivas
sejam aproveitadas. E com poucas, ou nenhumas, possibilidades de ver
alterada a sua situação de arrumados num canto.
Mas
o caso mais grave, não só na actualidade mas, principalmente, pelo
futuro que se adivinha, é o da precariedade com baixos salários. As
propostas de trabalho temporário sem a mínima possibilidade de
poder optar para uma carreira, mas de estar, permanentemente, na expectativa de uma renovação por semanas ou meses, é opão nosso
de cada dia para muitos. Ou pior, quando ouve mesmo que a sua
colaboração deixou de ser necessária. Um eufemismo para lhe fechar
a porta na cara.
É
incontestável que, mesmo com esta rotação cruel, podem dizer que
há mais gente empregada num dia qualquer. Mas este esquema de
contrato, que mais parece uma treta, oferece outra coisa do que a
escravidão a longo prazo?
E,
pelo que se aprecia, todos os governos que passam pelo País,
incluído este da enxertia na esquerda, aceitam sem contestação
efectiva esta novidade, cada vez mais habitual extensiva. Os
políticos alegam, em sua defesa, que esta situação “anómala”
mas já instalada como fixa, foi-nos imposta pela Troika quando
estivemos em quebra disfarçada. As vozes que se ouvem discursando na
Assembleia da República limitam-se a um blá-blá-blá inoperante,
só para figurar nos telejornais e assinar o ponto de estarem muito descontentes.
A
gravidade desta situação não fica restrita aos falsos empregos de
cada cidadão vitimizado. É muito mais grave, pois além de não se
conseguir uma capacitação efectiva nas tarefas que lhe incumbem, e
que vão mudar na semana seguinte, as cotizações para a complexa
segurança social serão diminutas, ou mesmo inexistentes caso a
entidade patronal não cumprir os preceitos legais. Que futuro terão
à sua porta estes jovens quando atingirem os 40 e tal anos?
Dizem,
os sábios papagaios do regime, que o melhor futuro é aquele que
cada um pode conseguir como seu esforço. Ou seja, que passe a ser um
empresário individual. Inclusive, de vez em quando e não sei se o
esquema funciona, afirmam que existem ajudas monetárias e outras,
também importantes, para que os jovens se possam lançar a ser
empreendedores. Não contam as dificuldades e exigências com que
terão que se enfrentar. Alguns acreditam e metem-se em acção, mas
quantos conseguem aguentar mais do que um ano?
E
estas são só algumas das metásteses do cancro social que corrói a
nossa sociedade. Mas no IPO não podem tratar deste tipo de cancros.
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