segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

FÉ E CORDURA



Aqueles que usam a cabeça para outros mesteres do que aqueles que estão ligados ao seu exterior, e que aproveitam com esmero os sinais recebidos através dos órgãos dos sentidos, visão, olfato, audição, tacto e paladar (aos que se junta a entrada para o aparelho digestivo, que é a nossa caldeira motriz), é possível que consigam algumas ligações entre aquilo que ve e ouve e o seu arquivo de conhecimentos, sejam próprios ou adquiridos.

Das definições que encontramos, escritas e avaliadas, dos dois termos que coloquei como cabeçalho, (ver notas a pé de página) tiramos a conclusão imediata de que existe um risco elevado de incompatibilidade entre ambas.

Para evitar polémicas estéreis (ou "estorís" como eu, jocosamente, prefiro usar) desta vez prefiro deixar de lado todos aqueles assuntos que encaixam no foro das religiões. Tal como se tornou famosa uma frase que Cervantes colocou numa das aventuras do imaginado cavaleiro andante, desencontrado do tempo em que vivía, mas que o escritor utilizou para criticar a sociedade da sua época.

Quando Dom Quixote, numa das suas aventuras nocturnas andava, mais o seu companheiro Sancho Panza, visto por ele como sendo um escudeiro, perdidos na escuridão mais negra, chegaram a uma pequena aldeia e decidiram bater a alguma porta para pedir acolhimento. Sancho assim fez. Bateu num grande portão e o silêncio ecoou dentro. Alonso Quijano, -que era seu nome no BI, que não existia naquela época- podia ser louco, fantasioso, mas não era burro, e pelo eco deduziu o que era aquela casa. De imediato chamou Sancho dizendo, Vamos embora pois esbarramos com a Igreja. Cervantes tinha s suas razões.

São muitos os temas nos que o cidadão pode cair em comportamentos pouco racionais, e em vez disso age com cega fé, com tanta intensidade e convicção que pode chegar com outro fiel, mas com diferente opção, não só verbalmente como a murro e pontapé. Por alguma razão se diz que A fé pode mover montanhas. Só como aperitivo deixo um par de tópicos que servem de orientação: clubes desportivos e partidos políticos.

O que hoje me incitou a escrever foram alguns artigos de opinião, nomeadamente aqueles que vinham assinados por pessoas credíveis, onde se escalpeliza a situação social que se vive actualmente nos EUA. Está em curso uma separação da população entre dois grupos de pessoas, quase que tão forte como a ue deu origem à sua guerra de secessão, mas com características muito diferentes. Criaram-se dois bandos de momento irreconciliáveis, e, com uma deriva muito acirrada que, pelo menos nesta altura, esqueceu as origens do descontentamento social.

Aquilo que é merece mais atenção por parte dos estudiosos é que os adeptos às opções e declarações do seu actual presidente o são com uma fé cega, não tão só à pessoa em si, mas especialmente ao que as pessoas se habituaram a considerar como fontes merecedores de crédito.

Os meios de difusão electrónica, que são o pão para a boca dos entusiastas, e pão para as carteiras dos patrocinadores ou exploradores, além das palermices ue os utentes colocam a fim de serem “mundialmente” conhecidos, são o melhor veículo que dispõem aqueles que desejam distribuir notícias falsas. Os EUA, onde se geraram estes monstros de captar mentalidades, têm um presidente que, além de utilizar a rede twitter como meio primordial para governar o seu País, e por tabela desorganizar o resto do globo, confessa ue estas redes e os noticiários da FOX (considerados como lixo em todo o globo, por estarem viciados em notícias falsas e condicionar a opinião pública, pelo menos entre os seus seguidores) em detrimento aos seus conselheiros políticos, ue sempre foram uma base de debate interno na Casa Branca.

Esta orientação para a fé cega que se espalhou na população dos EUA adquiriu o estatuto de um problema com difícil erradicação. Não é uma fé que se satisfaça com cantar salmos ou participar em cerimónias religiosas. Está organizada, como a seu tempo fizeram Mussolini e Hitler para governar os Estados Unidos a seu bel prazer, provocando a maior desunião social de que há memória. Para mais desgraça as zonas onde residem, com maioria, os adeptos deste populista coincidem, quase que milimetricamente, com as dos sulistas, que ainda hoje não conseguiram aceitar a sua derrota.

O problema maior, e quase insolúvel, reside em que os fanáticos de uma fé, seja ela ual for, fechar os seus ouvidos aos argumentos cordatos que interferem com a sua crendice. Constroem um muro intransponível, mais alto e eficaz do que aquele que, mesmo ue parcialmente, já existe entre os EUA e o México. E ser gobernados por egolatras nunca  nos pode levar a um bom fim.






  • CORDURA qualidade de cordato; bom senso; prudência
  • CORDATO prudente; circunspecto; sisudo. Do latim cordatu.
  • EGOLATRA egoísta; orgulhoso; presunçoso; vaidoso.
  • ESCALPELIZAR figurativamente criticar; analisar minuciosamente
  • FÉ crença absoluta na existência de certo facto; convicção íntima; lealdade.

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