segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

PODE SER O PRINCIPIO



Desta vez não se trata do famoso Princípio de Peter, mas de algo que está acontecendo e que só é visto sob um dos possíveis pontos de vista. Numa análise imediata, sentimos que este fluxo inesperado de migrantes veio na pior altura possível.

De facto os efeitos da crise de 2008 e da desindustrialização, aliada à abertura comercial decidida com o livre comércio, estão longe de terem sido digeridos por todos os países membros da União Europeia. Apesar das muitas declarações de boa vontade e de que se decidiu acolher os refugiados que aqui chegam, a realidade é bem outra. De entrada são confinados em campos de acolhimento, e ali sofrem uma triagem com a qual se consegue justificar o devolver para o país de origem uma parte dos clandestinos.

Vendo as coisas desde longe, dado que Portugal não tem sido um país onde cheguem constantemente levas de inmigrantes. Pode-se sentir que após o endurecimento, ou practicamente fecho, do trânsito de migrantes pelo território turco, o fluxo de sírios e outros cidadãos daquela zona, em direcção às ilhas gregas parece que diminuiu. Alguns deste sírios encaminham-se, agora, para o Egipto e dalí para a Libia. Em simultâneo aumentaram as rotas com início nos países da África sub-saariana, dirigindo-se para as costas da Líbia.

Ali juntam-se gentes de muitas procedências. Após pagarem a sua passagem aos negociantes nada escrupulosos, embarcam sem as mínimas condições, em barcos velhos ou, ultimamente, em barcaças de borracha, mais apinhados do que numa carruagem de metro-politano em hora de ponta.

Estes migrantes africanos actuais são, na sua maioria, provenientes do Sudão, Eritreia, Somália e outros países a sul da faixa do deserto. Metem-se a caminho incitados não só por conflictos bélicos como também por carências alimentares, falta de trabalho remunerado e outras tantas razões. Carregam a ilusão de que uma vez chegados à Europa terão a sua vida garantida.

E esta complexa motivação para abandonar o seu lugar de origem, partir em direcção a um sonho, a um El Dorado, coincide com aquela expansão histórica de milênios atrás, quando os primeiros homens, nascidos na zona austral de África iniciaram a sua expansão por todo o globo. Com a única, mas muito importante, diferença de que aquela migração inicial levou séculos para alcançar locais progressivamente mais longínquos.

Hoje, mesmo que muitos iniciem a o seu périplo literalmente a pé, as distâncias efectivas encurtaram. Tudo acontece mais depressa.

Os governos ocidentais tentam travar esta migração o mais perto da sua origem, procurando que esta acção dissuasora não seja noticiada aos seus cidadãos. Mas, de facto, mesmo que nos sentirmos pressionados pelo humanitarismo e por isso vocacionados a abrir as nossas casas para acolher quem nos quer acompanhar, a realidade mostra que estas decisões humanitárias são muito bem vistas se aplicadas nas casas dos outros.

Pessoalmente ainda não encontrei, ou nem sequer imaginei, uma via factível, correcta e com garantia de sucesso, que possibilite convencer estes migrantes a desistir do seu sonho. Não me parece que encontremos argumentos, socialmente aceitáveis, que convençam os desesperados a desistir. Eles, que sabem arriscam a própria vida neste processo e decidiram que na sua terra não existe futuro, já estão agarrados num sonho.

O que mudou nestes países africanos? Guerras, fomes, secas, doenças, sempre existiram. Outros factores se alteraram. Passaram a ser visitados e ajudados por organizações internacionais humanitárias. Com eles descobriram necessidades novas, indispensáveis para sobreviverem com um mínimo de satisfacção. Passaram a ter assistência médica e sanitária, reduziram a mortalidade infantil; muitas doenças transmissíveis foram debeladas ou muito minoradas nos seus efeitos. Habituaram-se a novos alimentos, que não constavam da sua ementa tradicional. Mais nutritivos e saborosos, e que sendo oferecidos, não implicam o esforço de cultivar ou recolectar. Constituem um maná que não se quer perder. Tudo isto é bom, óptimo e louvável. Mas não podemos esquecer que com estas ajudas alteramos o seu mundo, para melhor, mas com reflexos que não se contava.

Noutra zona do globo, concretamente nos EUA, fecharam as portas de entrada, legalmente ou ilegalmente, dos naturais do México e outros países do centro e sul do continente americano, aos que estavam dispostos a arriscar para melhorar. Já não terão esta possibilidade. Será que desistiram ou procurarão outro lado onde se dirigir. Desde anos que, dada a sua lingua comum, estes hispano-americanos rumavam para Espanha, tal como os brasileiros vinham para cá.


Não será só o fenómeno do aquecimento do globo e o da subida do nível dos mares que alterará as nossas vidas. E nenhuma destas ameaças, já em curso, são novas na história da Terra.

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