quinta-feira, 2 de maio de 2019

MEDITAÇÕES TÉTRICAS



TRATAM-NOS BEM QUANDO MORTOS ?

Numa visão imediatista e centrada naquilo com que convivemos, creio que a maioria dos cidadãos não se preocupa, e estou com eles, com o que façam com o nosso corpo quando a vida nos abandonar. Antes que se vocacionem a me ajuizar deixo, mais uma vez, constância de que a minha vontade é a de ser esturricado, assado como São Lourenço, mas bem queimado (mais ou menos, pois além dos 80 e tal % de água, o carbonato (não cabronato! A não ser em casos muito particulares...! de cálcio que compõe o nosso esqueleto, não se decompõe nas temperaturas que se devem atingir nos fornos crematórios existentes). Quanto aos restos que fiquem, e da parte peneirada que entreguem aos familiares, por mim qualquer local de reciclagem é adequado, precisamente para iniciar a reciclagem. Lá dizem os anglófonos: ACHAS PARA AS ACHAS.

E com a minha vontade expressa tenho notícia de que cada dia mais cidadãos se decidem por esta opção,nem que seja por uma questão de higiene ambiental. Todavia esta practica colide com os costumes mais ou menos arcaicos que regem no nosso meio. Outros credos ou civilizações ainda vigentes no planeta já aderiram à cremação desde séculos. Nalguns casos quando o defunto era homem casado, o preceito implica que a esposa se imolará na mesma pira! Seria para satisfazer uma vingança ou para dar saída a um excesso de viúvas?

Mas limitemo-nos aos costumes ocidentais. O dito progresso tem conduzido a que as empresas funerárias -antigamente cangalheiros, que se encarregavam tanto de quem morria como de quem se matava..- hoje já embelezam o defunto/a com maquilhagens que não devem ficar atrás das que os egípcios aplicavam aos seus, pelo menos quando os descendentes decidiam pagar este tratamento.

E pode perguntar-se: E nós na actualidade? Não conheço o negócio das funerárias, mas admito que os costumes normais nos USA já se estão implantado na nossa sociedade. Entre eles o de oferecer um reconstituinte beberete ou mesmo refeição aos parentes e amigos que se apresentaram para homenagear o defunto/a, ou para ficar bem visto perante os familiares. Seja como for que as coisas evoluam, não tardará a se aplicar o esquema de além-atlântico.

Para já os nossos mortos são, habitualmente, vestidos em fato de passeio ou mesmo de cerimónia, e calçados de meia e sapato, nem que sejam uns falsos, de cartão a fingir cabedal. Porque não nos deixam ir descalços? Será para que não se firam os seus pés quando entrarem na fase de mortos-vivos?

Ora bem. Se nos preocupamos em não os enviar para o além a pé descalço, porque nos fecham os olhos? Não bastará aquele andar incerto? Teremos que usar uma bengala de morto ou um andarilho? Ou andar às apalpadelas? Uma pessoa que os seus conhecidos sempre o viram com uns óculos sobre o nariz, devem ficar desconcertados ao ver que, tendo as pálpebras baixadas -não por opção própria- não corresponde fielmente à imagem que traz na sua memória. 

No Antigo Egipto, aqueles que eram momificados, de facto também tinham os olhos fechados, e vazados e cosidos, para efeitos da técnica de mumificação. Mas depois, na altura de ficar expostos no correspondente sarcófago, lhes colocavam uma máscara com olhos bem abertos. Somos menos que os egipcios?

A desconsideração na ausência dos óculos correctores, que para já, na dúvida de se os deixar com o defunto com o propósito de lhe possibilitar a visão ao perto ou ao longe, nos levaria a colocar, sempre, uns com lentes progressivas (que a minha experiência não aconselha serem usados em vida, quanto mais em morto!) ou bifocais.

E mais objectos de uso pessoal deveríamos colocar na campa; como era norma já em tempos históricos. Por exemplo: se era fumador de cachimbo, aquele que se sabia era seu preferido. Ou se mais modernaço usava o tal cigarro electrónico que deita umas fumaradas comparáveis às do vendedor de castanhas assadas. Deveriam ter à mão, mesmo se esquelética, aquele útil que em vida lhe era indispensável! Assim como o isqueiro que tanto estimava. (O Bic ou equivalente não entra nesta selecção de bens pessoais, por ser de usar e deitar fora. Lixo!) E já agora: a tablet com que estava constantemente a esfregar o dedo, devia ficar com ele, ou a deixar de herança? E o té-lé-lé, já a caminho de ser abandonado?

Quando na antiguidade europeia, ou mediterrânica, era costume colocar uma moeda na boca do defunto para que com ela pudesse pagar a viagem ao barqueiro Caronte, o qual se supunha que ia decidir, consoante o valor da moeda, o local donde deixaria aquela alma para todo o sempre -Certamente havia locais classificados em categorias diversas...- O costume de não entregar o corpo sem um mínimo de numerário não se abandonou de imediato, como se comprova nas excavações de sepulturas relativamente recentes, pelo menos do medievo. Em muitas, é usual encontrar moedas, além de outros objectos junto das ossadas. Para que fim os parentes colocavam dinheiro e diversos objectos? Nem todos deviar ser vistos como ofertas para quem recebesse o morto. Para tal propósito já estava destinada a moeda de Caronte. Era um farnel para os primeiros tempos no outro mundo ?

NÃO SEI SE CONSEGUIREI DORMIR DESCANSADO ESTA NOITE, POIS O ASSUNTO DEIXOU-ME DEVERAS PREOCUPADO.

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