Desta
vez o tema está delimitado pela estufa.
Sei
que ficou combinado só voltarmos ao tema da “minha” estufa
quando comparecer a casal Cardoso. Apesar disso sinto uma necessidade
irresistível de te fazer partícipe de alguns assuntos que estão
ligados a este projecto, nos quais não me sinto com forças e muito
menos experiência para entrar confiadamente.
Do
que te contei da minha meninice e juventude sabes que eu, de terra,
plantas, couves e nabiças, só sei alguma coisa quando já as vejo
no mercado. Sei que nascem e criam-se, ou criavam-se então, na
terra. Hoje, pelo que li já crescem alfaces, espinafres e sei lá
mais que sem terra, penduradas sobre uma água adicionada de
“alimentos”.
Tentei
ultrapassar esta crassa ignorância lendo livrinhos, começando com
os que tratavam das estufas de jardim, que em geral também trazem,
lá para as últimas páginas, indicações para tratar de plantas
comestíveis. Por muita vontade que tenha posto nesta tentativa de me
ilustrar fiquei não só com uma notória falta de um mínimo saber
sobre estes assuntos, como como fiquei muito confundida, mesmo
atrapalhada com a quantidade de conselhos ou propostas sérias (?)
que tentavam entrar na minha cabeça.
Desta
confusão, complexa de mais para mim, aceitei algumas dicas que me
pareceram totalmente sensatas. A mais simples de aceitar foi a
sugestão, quase imposição, de ter, perto da entrada, uma bancada
de trabalho, na qual se
trataria da recepção das plantas e materiais, escolher e
transferir para vasos ou para canteiros; arrumar devidamente os
produtos industriais como adubos e sementes, alguns, poucos,
insecticidas; preparar as flores cortadas antes de as levar para as
jarras da casa ou fazer ramos bonitos para oferecer. Só no que dizem
que se pode e deve fazer na bancada gastam algumas páginas. Que eu
li atentamente, pois que as considerei como uma espécie de tabuada,
sem a qual não se pode avançar.
Mais
adiante, entre outros capítulos, encontrei a explicação das
bondades e perigos que os diferentes estercos animais podem oferecer.
Para que plantas se podem usar uns e outros não. As pessoas que se
criaram no ambiente rural, com criação de animais de pena e de pelo,
e até de algum suíno e cabras misturadas com ovelhas, e também com
hortas que tratar -das quais dependia uma boa parte da sua
alimentação- devem ouvir e aprender estes conselhos desde a
meninice. Mas e eu? Para mim todo o esterco é a mesma coisa !
Agora
já sei que esta ignorância simplista pode levar a magnos desaires e
problemas. E tive que desbastar este e outros assuntos sem a tua
ajuda. Que nem me atrevi a pedir por ter a certeza de que, nisto,
eras tão desconhecedor quanto eu.
Com
certeza que não sabes que para os efeitos de melhorar uma terra de
cultura, seja de hortaliças, vinha ou flores, não são iguais os
detritos vindos de galinhas, coelhos, ovelhas, burros e cavalos,
porcos ou gado bobino. Nem como se podem ou devem aplicar na terra,
se em profundidade ou misturados com a terra envolvente, se é
pertinente encharcara terra depois de adubar. E até que consoante a
acidez do solo (esta sabias?) pode ser necessário juntar pó de pedra calcária ou mesmo um pouco de pó de cal apagada, cinzas, ou um composto de
enxofre. São tantas as recomendações a seguir e os riscos de não
as cumprir, que depois de ler isto fiquei com a cabeça quente.
Neste
complexo tema dos estercos,
como são chamados popularmente, pois que o termo adubos
está reservado para os compostos sintéticos, fabris ou, quase que
indevidamente, para aquelas sacas que dizem conter adubos compostos,
com incorporação de esterco animal fermentado e neutralizado, e
outras maravilhas comerciais.
Pois
como ia dizendo, e já me estava a perder com a conversa, fui pedir
ajuda ao nosso feitor Ernesto Carrapato, dando como seguro que ele
saberia bastante neste assunto, e noutros, e que já me orientara
mais do que uma vez. Foi uma decisão acertada. Mas as explicações
foram tão complexas que tive que inaugurar um caderno de
apontamentos para as fixar e consultar quando necessário.
Explicou-me,
o Ernesto, que uns animais dejectam fezes ácidas, que são muito
prejudiciais para certas plantas. Outros estercos só se devem
empregar quando já tenham um período de fermentação capaz; em
geral quando deixarem de “fumar” (ele
refere-se a que libertam mechas de vapor e logo abaixo da superfície
está muito quente)
Mesmo assim, com os cuidados pertinentes da selecção e aplicação,
ele insiste que para as plantas e flores não há melhor do que a
adubação com esterco dos animais.
Também
me ensinou que algumas culturas podem fazer-se colocando as sementes
directamente no chão, devidamente cavado e desterroado, como são os
cereais e alguns legumes, nem todos. Para flores e plantas de
alimentação, como couves, tomateiros, pimentos, cebolas ou pepinos,
a plantação começa num pequeno canteiro,
que chama de viveiro,
como o das trutas na ria. E depois levam-se as plantinhas para a área
donde crescerão. Por vezes algum conhecido pode ter uma boa semente
que nos venda ou ofereça. Mas que ele, para a sua horta, em certas
ocasiões compra já as plantas a colocar no seu quintal a algum
vendedor no mercado de Aveiro, mas só a um conhecido ou que lhe
recomendaram.
-
Muito me contas Isabel. Fico envergonhado do que já sabes e eu
ignoro. Tenho que me acautelar com as perguntas que me venham à língua. Gostaria que me mostrasses donde tens estes livrinhos que te
ajudaram, tenho o propósito de tentar educar-me nas “ingrícolas”,
mas não garanto que consiga acompanhar a tua pedalada.
-
Pois o que ouviste ainda não é nada. Aqueles especialistas que
contratei tem dificuldade em descer ao meu nível, de dona de casa
curiosa e com vontade de passar um tempo, indefinido, entretida com
flores e alfaces, rabanetes e tomateiros. Por vontade deles já teríamos transformado o mato que nos rodeia num mar de estufas de
plástico. NEM SOMBRAS! Não quero cair nestes exageros. Prefiro
ficar no nível doméstico que eu imaginei inicialmente. Insisto!
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