domingo, 19 de maio de 2019

CRÓNICAS DO VALE - Cap. 83


já à entrada da estufa

E cá estamos, finalmente, à entrada do meu sonho, que avanço, - como aliás já devem ter captado- que se não se está a desfazer pelo menos vai dar a tal Grande Volta. Tentarei explicar com argumentos válidos, até para mim, mas será quase um striptease pois que não duvido de que me sentirei muito desconfortável perante os três, pois que não só aos Amigos Cardoso que me tenho que confessar como também ao meu marido José Maragato, que possivelmente já acertou no sentido que terão as minhas palavras. O “sorriso de coelho” que lhe ilumina a face equivale a um discurso bem elaborado.

Mas entremos, sem receio. O que aqui podem ver corresponde à tentativa de realizar um sonho meu, que poucas horas antes de agora explodiu, ou implodiu como aqueles edifícios que com umas tremendas cargas de dinamite caem, desfazendo-se em bocados. Não é que pretenda arrasar tudo isto, mas pelo menos reduzir fortemente, aproveitando aquilo que for possível dentro do realismo e bom senso.

À nossa esquerda temos uma, mesmo grande, bancada de trabalho, equipada com uma zona de lavagem e embalagem, além da área destinada à recepção de materiais. Admito, com uma dose de vergonha, que tudo isto, sem contar os equipamentos que estavam previstos, excede em muito aquilo que uma dona de casa NORMAL (e não era o meu caso, infelizmente) poderia desejar para substituir as antigas lavores femininos, como rendas, bordados e outras tontices que hoje estão totalmente postas de lado.

Quando a noite passada vi -por desígnio divino?-, a luz da verdade, ou senti que, como diria um brasileiro, que caí na real, quase que, de facto, ia tombando do leito conjugal. E não saí disparada para me desfazer em lágrimas de auto-comiseração, por respeito ao sono do José.

Numa tentativa de me desculpar desejava poder enfrentar o José por não me ter alertado sobre o disparate, dimensional e conceptual, em que me estava a meter. Certo que ele me deu ”carta branca” para decidir o que entendesse. Imagino que ele ponderou o acerto com que, bastante antes de nos conhecermos, eu tinha entrado num território profissional que, para ele, era desconhecido, mas que eu tinha palmilhado como empregada, atenta, por conta de outrem. Deve ter pensado que repetiria, neste capricho, as passadas prudentes que me conhecia. Simplesmente, ele não ponderou que nesta iniciativa minha não tinha uns conhecimentos directos onde me apoiar.

Bem. Desculpem e vamos andando. Perguntem sem acanhamento a que correspondem as diferentes áreas que se nota estarem em preparação. Para já, insisto, do que hoje está em fase de estaleiro, que parece avançado, muito desaparecerá. PORQUE NÃO TINHA SENTIDO, não era realizável por falta de conhecimentos adequados, tanto em mim mesma como já tinha entendido que tampouco o José me podia ajudar cabalmente.

O esquema que o “perito”, filho da Dona Eudócia, cliente do salão, mais o atrelado que ele incorporou, implicava, segundo eles, uma pequena área destinada a dar apoio à cozinha de casa, mais um espaço para flores de corte e plantas que carecem de estarem resguardadas no inverno, por serem originárias de zonas mais cálidas, tais como orquídeas, cactos e outras com lindas flores. Depois, um grande sector preparado para ter produtos hortícolas que, segundo eles, proporcionariam uma “rentabilidade assegurada” para a manutenção da estufa, contando com o aquecimento, as regas automáticas, medidores de temperatura e humidade do ar e do chão, etc. UMA MARAVILHA !!

Eu eu, feita tonta, como uma criança a quem se lhe deu uma bicicleta com rodinhas, já me sentia singrar numa aventura “fabulosa”, na qual não tinha a menor hipótese de conseguir avançar positivamente. Sendo assim não digo que abandone o prazer de ter umas alfaces, uns rabanetes e umas couvitas, para “brincar” … mas isso terá que ser conseguido com a ajuda do feitor, o senhor Ernesto, que já conhecem, mais o interesse que senti terem as empregadas da casa, tanto a governanta como a sua ajudante, que hoje, sem as ter presentes fisicamente, vi se sentiam desanimadas, abandonadas depois de que uns cavalheiros, desconhecidos mas muito sabedores lhes tirarem o “nosso” brinquedo. Sentiram-se, e com razão, postas de lado enquanto antes até traziam sementes ou plantinhas para o quintal da senhora, que sentiam também ser delas.

Não sei se me explico de forma a me entenderem, mas neste momento sinto-me “nua”. Mas confortável, por voltar a encarreirar num terreno que não me sentia à vontade. Uma das facetas pesadas que surgiram esta noite, foi a de querer enfrentar o meu marido para lhe recriminar o me ter deixado embrulhar insensatamente. Agora, já desabafada, dou valor à sua coragem em fingir que não via o desnorte em que eu tinha caído. Ele, extremamente sensato nas suas coisas, cuidadoso e procurando sempre ponderar as opções, jamais decidiu meter-se em agricultor nesta propriedade. Nem noutra qualquer, pois o campo não o apaixona, mesmo que seja de o percorrer e admirar. Ele diz que em terra não sabe nadar, e que outros tem mais conhecimentos, até herdados de gerações anteriores, daí que perante este handicap a prudência o orientar, sempre, a pisar terreno que, para ele, fosse firme.

E já chega de surpresas. Grandes novidades, inesperadas, terão os dois “ingrícolas teóricos” quando compareçam à chamada na segunda feira. Agora mostrarei algumas plantas que foram adquiridas para me satisfazer, e que terão que ser re-arrumadas num espaço muito menor, entre os 15 e 20 metros quadrados. Não mais! A decisão que já está firme é a de reorientar esta tal estufa para uma dimensão caseira, entre os 15 e 20 metros quadrados. Não mais. Admitindo poder ter acertos e também erros, mas de pouca monta, suportáveis sem problemas de maior. Os dois especialistas serão dispensados, mesmo que isso implique custos.

Quando voltarem a nos visitar terei um avental e umas luvas próprias preparados para a Diana me acompanhar e poder levar um bonito ramo para a vossa casa.

  • Desculpem eu entrar no momento do fecho. Mas o meu nome foi referido umas poucas de vezes e até admito, com satisfacção, que a Isabel procurou justificar o meu alheamento. Mas sei que tentar argumentos na fase de gestação, ela entusiasmada, não daria bom resultado.
  • Mas não resisto em referir que actualmente temos pimentos, de várias cores, beringela e tomate, todo o ano em qualquer loja do ramo, sem citar os hipermercados. Esta actualização irreal do mercado abastecedor nos deve alertar acerca de que a satisfacção de ver crescer algum destes frutos num espaço nosso, implica uma dedicação e uns custos hoje difíceis de justificar. Mesmo atendendo à agressividade que muitos destes alimentos, sejam vegetais de cozinha ou frutas, podem comportar em função dos produtos que se utilizam, precisamente nas estufas industriais, o mais que nós podemos fazer para nos resguardar é recorrer a pessoas das redondezas que ainda tratam dos seus quintais como antigamente.

  • - José. Já maçamos excessivamente estes Amigos, vítimas da minha insensatez. Paremos aqui, demos a voltinha e a seguir decidir que fazer amanha, para nos distrair e alegrar.

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