Verdades,
falsidades e confusões.
Sempre que caímos na tentação de
separar em dois grupos de pessoas, normalmente heterogéneas, e
insistimos em lhes dar uma falsa imagem que os mantenha bem definidos
e negue a existência de características, convicções e
preconceitos que podem ser comuns arriscamos a perder a objectividade
de que tanto nos orgulhamos.
A característica mais habitualmente
tomada como destacável para separar os cidadãos em dois grupos.
“irremediavelmente” antagónicos é o seu conservadorismo,
tanto no sentido restrito de reter os bens materiais, adquiridos ou
herdados, como no modo como se imagina deveria estar orientada -para
não dizer controlada- a sociedade em geral. Esta fixação
nos “valores” que se atribui, sem ser de todo correcta, aos
direitistas (1) pois que, inclusive o mais miserável dos homens
tem, instintivamente, o ímpeto de defender, nem que seja “com
unhas e dentes” o pouco que considera ser seu.
Um dos “valores” que os que se
consideram conservadores dão mais importância são os seus
“pergaminhos”, e se a isso se lhe pode juntar bens materiais
importantes e uma cultura respeitável, então o fosso que sentem
entre “eles” e o “povão esquedalha” é mais fundo do que o
agora célebre canhão da Nazaré. Argumentar que todos
nascemos nus e sem nenhum pão no sovaco, não é argumento a ter em
conta.
Tampouco de nada vale recordar que
os primeiros pensadores que se dedicaram a levantar os alicerces do
respeito social e da pretendida igualdade de direitos, não eram
precisamente uns analfabetos, mas sim membros das classes superiores,
que através da especulação filosófica chegaram a decidir que
deviam procurar elevar a triste vida a que os pobres estavam
condenados, e dar-lhes a oportunidade de lhes ser dado,
altruísticamente, não só uma incipiente cultura, começando pelo
ensino de escrever e ler, como ponto de partida para a maioria da
plebe.
Outra faceta importante, e notória
nesta fase da evolução da sociedade, é o da quantidade de novas
adesões no campo dos conservadores. Pessoas que sem terem um passado
com pergaminhos, e até com artes e manhas pouco recomendáveis,
conseguiram subir na escala social, disputando a honorabilidade com
aquelas famílias de renome histórico. Estes “penetras”, que não
são poucos e até tem peso económico que os impõe como
respeitáveis, conseguiram romper as barreiras elitistas. Podem ser
criticados pelas costas, gozados nos círculos mais conservadores, e
até odiados pelos seus antigos companheiros. Mas é o exemplo
indiscutível de como a cultura, mesmo que por vezes se verifique ser
rudimentar, deixou de
poder resguardar-se atrás de
muralhas impenetráveis. Todos temos a obrigação de saber que a
honorabilidade não se herda, mas consegue-se pelos seus feitos e
carácter. Há “honoráveis” que não passam de canalhas, e
populares que nos dão lições de correcção e humanidade.
A minha CONCLUSÃO é que insistir
em “esquerdalha e direitalha” é continuar no passado e esquecer
que a situação voluntária de cada pessoa neste falso espectro
social é orientada, principalmente, pela cultura de que dispõe e,
sem dúvida, do montante de bens que conseguiu adquirir. Tal como
acontece com o cabelo, que pode passar do moreno para o loiro com muita
facilidade e rapidez. É uma questão de manipular a aparência, e,
evidentemente, de ter sempre dinheiro disponível.
- Permito-me recordar que esta qualificação de direita e esquerda é uma reminiscência histórica de quando, nas Cortes, se sentavam os nobres e respeitáveis do lado direito e o povo, a plebe, os trabalhadores e assimilados, do lado esquerdo.
- Recordo uma anedota, mais descriptiva do que cómica, em que se relatava como decorreu uma distribuição de bens “confiscados” numa herdade no momento álgido da reforma agrária. Após distribuir terras, casas, alfaias de grande e pequeno porte, chegou a vez aos animais, desde o gado vacuno, caprino, ovelhas e galinhas. Neste momento levantou-se um dos colectivistas e, apontando o dedo com intenção de ser ouvido, disse: Nas galinhas ninguém mexe. São minhas!
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