quarta-feira, 27 de maio de 2020

MEDITAÇÕES – Direitas e Esquerdas.



Verdades, falsidades e confusões.

Sempre que caímos na tentação de separar em dois grupos de pessoas, normalmente heterogéneas, e insistimos em lhes dar uma falsa imagem que os mantenha bem definidos e negue a existência de características, convicções e preconceitos que podem ser comuns arriscamos a perder a objectividade de que tanto nos orgulhamos.

A característica mais habitualmente tomada como destacável para separar os cidadãos em dois grupos. “irremediavelmente” antagónicos é o seu conservadorismo, tanto no sentido restrito de reter os bens materiais, adquiridos ou herdados, como no modo como se imagina deveria estar orientada -para não dizer controlada- a sociedade em geral. Esta fixação nos “valores” que se atribui, sem ser de todo correcta, aos direitistas (1) pois que, inclusive o mais miserável dos homens tem, instintivamente, o ímpeto de defender, nem que seja “com unhas e dentes” o pouco que considera ser seu.

Um dos “valores” que os que se consideram conservadores dão mais importância são os seus “pergaminhos”, e se a isso se lhe pode juntar bens materiais importantes e uma cultura respeitável, então o fosso que sentem entre “eles” e o “povão esquedalha” é mais fundo do que o agora célebre canhão da Nazaré. Argumentar que todos nascemos nus e sem nenhum pão no sovaco, não é argumento a ter em conta.

Tampouco de nada vale recordar que os primeiros pensadores que se dedicaram a levantar os alicerces do respeito social e da pretendida igualdade de direitos, não eram precisamente uns analfabetos, mas sim membros das classes superiores, que através da especulação filosófica chegaram a decidir que deviam procurar elevar a triste vida a que os pobres estavam condenados, e dar-lhes a oportunidade de lhes ser dado, altruísticamente, não só uma incipiente cultura, começando pelo ensino de escrever e ler, como ponto de partida para a maioria da plebe.

Outra faceta importante, e notória nesta fase da evolução da sociedade, é o da quantidade de novas adesões no campo dos conservadores. Pessoas que sem terem um passado com pergaminhos, e até com artes e manhas pouco recomendáveis, conseguiram subir na escala social, disputando a honorabilidade com aquelas famílias de renome histórico. Estes “penetras”, que não são poucos e até tem peso económico que os impõe como respeitáveis, conseguiram romper as barreiras elitistas. Podem ser criticados pelas costas, gozados nos círculos mais conservadores, e até odiados pelos seus antigos companheiros. Mas é o exemplo indiscutível de como a cultura, mesmo que por vezes se verifique ser rudimentar, deixou de

poder resguardar-se atrás de muralhas impenetráveis. Todos temos a obrigação de saber que a honorabilidade não se herda, mas consegue-se pelos seus feitos e carácter. Há “honoráveis” que não passam de canalhas, e populares que nos dão lições de correcção e humanidade.

A minha CONCLUSÃO é que insistir em “esquerdalha e direitalha” é continuar no passado e esquecer que a situação voluntária de cada pessoa neste falso espectro social é orientada, principalmente, pela cultura de que dispõe e, sem dúvida, do montante de bens que conseguiu adquirir. Tal como acontece com o cabelo, que pode passar do moreno para o loiro com muita facilidade e rapidez. É uma questão de manipular a aparência, e, evidentemente, de ter sempre dinheiro disponível.



  1. Permito-me recordar que esta qualificação de direita e esquerda é uma reminiscência histórica de quando, nas Cortes, se sentavam os nobres e respeitáveis do lado direito e o povo, a plebe, os trabalhadores e assimilados, do lado esquerdo.
  2.  Recordo uma anedota, mais descriptiva do que cómica, em que se relatava como decorreu uma distribuição de bens “confiscados” numa herdade no momento álgido da reforma agrária. Após distribuir terras, casas, alfaias de grande e pequeno porte, chegou a vez aos animais, desde o gado vacuno, caprino, ovelhas e galinhas. Neste momento levantou-se um dos colectivistas e, apontando o dedo com intenção de ser ouvido, disse: Nas galinhas ninguém mexe. São minhas!

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