Como escrever sem nada dizer
Este
compromisso regional-histórico-sociológico começou com o desafio
de dar a minha versão -livre- da génese, vida e abandono da
Base Aérea de Beja. Coincidindo com o que um simples cidadão, que
só se pode documentar pelo que apanha nos jornais e nas emissões de
televisão, e que, sinceramente, nunca nos atrevemos a por as mãos
no lume para garantir a sua total veracidade, surgiu o “boato” de
que o Governo dos EUA, ponderando a importância das diferentes áreas
do globo, sob o ponto de vista dos seus próprios interesses, pós a
possibilidade de desactivar e abandonar a base aérea que construiu e
equipou na Ilha Terceira.
O
tema foi tratado, resumidamente numa das minhas páginas editadas
neste blogue, com o tema concreto da Base das Lages. Mais tarde tive
a escorregadela de anunciar uns escritos monográficos sobre os
arquipélagos portugueses no Atlântico.
Quando
chegou o momento de cumprir a promessa fiquei desconcertado. Mesmo
assim atrevi-me a dar uns toques de bola no reduzido arquipélago da
Madeira. Não quis cair na armadilha de referir as costumeiras notas
de cariz turístico ou de política local-nacional. São tópicos
batidos com insistência pelos tais media.
Não tenho unhas nem capacidade para tentar tocar em assuntos já
esgotados. Ou não!
E
já tocou o clarim no camarote do respeitável anunciando que vai
sair do curro para a arena o seguinte toiro -com
vossa licença e sem ofensa-
AÇORES.
Recordando
a anterior citação de um assunto restrito a um sector concreto e
numa ilha, a Terceira, das sete que constituem o arquipélago, senti
que, mesmo ficando na história recente, devia-se ter salientado que
já início da segunda guerra mundial, a Inglaterra, e de imediato o
Quartel General dos Aliados, não estavam satisfeitos com a posição
de “neutralidade” que Portugal tomou neste conflito. Uma
neutralidade que todos sabiam escondia os apoios que o Eixo tinha
naquele arquipélago. A Inglaterra e depois os Aliados dependiam, em
grau elevado, dos fornecimentos que lhes chegavam por via marítima,
e que eram insistentemente flagelados pelas forças do Eixo, apoiadas
em bases tácitas e não reconhecidas oficialmente no arquipélago
dos Açores.
Inglaterra
tentou, insistentemente, convencer o Governo de Portugal a que se
juntasse à coligação. Salazar, fosse por prudência, por astúcia
ou por temer uma acção beligerante do seu “colega” Francisco
Franco, devedor aos importante apoios que lhe prestaram a Alemanha
nazi e a Itália fascista, agisse, nem que fosse por compromisso, a
invadir Portugal. Optou em resistir e jogar, sorrateiramente, nos
dois tabuleiros até que Churchill lhe disse: Ou no facilita uma base
ou teremos que a tomar pela força. E assim se instalaram os
americanos na Terceira.
Quanto
a dar uma visão geral do
arquipélago, desisto.
Prefiro ver o como evoluiu a sua população ao longo dos tempos.
Eram ilhas desertas quando os portugueses ali chegaram. Embora já no
séc XX se encontrassem vestígios da estadia de humanos, que
partiram ou faleceram. Foi povoada por gente deslocada do Portugal
continental, e com a inclusão, esporádica, de escravos para a lide
caseira, particular, vindos de diferentes zonas de África. Uns de
pele escura, pretos mesmo, e outros mais claros. Alguns acasalaram e
até ganharam alforria dos os colonos europeus.
Todas
as ilhas tem uma origem vulcânica, com reduzida capa de terra
propícia para ser cultivada, salvo zonas muito delimitadas. O que se
verificou é que a população foi aumentando progressivamente, sem
que a agricultura e a pesca, junto com a escassez de empregos
remunerados, tornou sempre difícil alimentar toda aquela gente. Em
número sempre crescente! Daí que a emigração tenha sido asolução
inevitável, desde séculos.
Geograficamente
o arquipélago está perto do paralelo de Lisboa e a uma distância
relativamente curta. Todavia o regime de ventos e correntes, que
condicionam a navegação à vela, não eram muito favoráveis, tanto
para sair como para entrar. A rota de entrada implicava descer ao
longo da costa de África até poder apanhar a corrente do Brasil (a
tal da “volta da mina”),
subir pelas costas das Guianas até os arquipélagos do mar Caribe.
Subir com a Corrente do Golfo, sempre procurando evitar as águas
mortas do Mar dos
Sargaços,
e após as Bermudas virar à direita rumando para os Açores. Quase
um presídio este Arquipélago durante a navegação à vela!
Apesar
de todas as dificuldades muitos açorianos emigraram para as
Américas, desde o Brasil e Venezuela até os EUA e Canadá. Estas
condições de navegação tampouco foram apelativas para ali se
instalarem grandes entrepostos de escravos.
A
agricultura insular foi reduzida. Alguma vinha, nomeadamente no Pico,
cana de açúcar, elaborando açúcar consumida quase que
internamente e para fabricar rum, para abastecer os navios que ali
aportavam. Alguma coisa fez alterar o isolamento deste arquipélago
quando se vulgarizou a motorização das naves. Surgiram armazéns de
carvão nos pontos onde existissem condições para ancorar e
reabastecer.
Uma
curiosidade de cariz vegetal se encontra na ilha de São Miguel,
concretamente na Ribeira Grande, onde existe uma plantação de chã
com vários hectares de terreno dedicados em exclusiva a esta planta.
Ali tem instalações de manipulação, armazenamento, e venda, além
de exportação, do famoso Chã
da Gorreana.
Tenho
uma vivência pessoal sobre esta plantação. Depois de visitar e
comprar alguns pacotinhos desta erva aromática, digestiva e
peitoral,
dei um passeio a pé -sempre
isolado na retaguarda dos acompanhantes, como é meu
hábito, e encontrei um senhor empoleirado num escadote que estava
podando, com muito jeito, uma sebe. O efeito que conseguia era muito
semelhante ao que ficava na plantação da Gorreana depois de
recolherem os rebentos para comercializar.
Sem medir previamente as palavras,
quis mostrar o meu agrado pelo seu trabalho fazendo notar que a sua
sebe ficava tão bem, ou melhor, do que as plantas de Gonorreia.
Em vez de ficar contente, o cidadão, desceu do escadote e
enfrentou-me, de dedo em riste e na outra mão a tesoura grande. E
mostrando-se ofendido -com
razão para tal- afirmou: A plantação é Gorreana e o
que você disse, Gonorreia, é uma doença transmissível, que
eu tratei muitas vezes antes de me reformar, pois que era
farmacêutico. TOMA E EMBRULHA!
Saiu-me o tiro pela culatra. Nunca
imaginei que o residente apanhasse o trocadilho. Segui caminho com a
cauda entre as pernas, figuradamente. Mais adiante o grupo entrou num
mini-mercado local e tivemos a segunda surpresa: o mesmo pacote de
chã que se pagou por X na origem, era bastante mais barato na loja
de porta para a rua!
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