Quando
lemos ficção, seja ela do caracter que for, tentamos,
instintivamente, fazer um retrato mental não só do aspecto físico
da personagem, mas também quase como uma sequela inevitável, compor
o seu retrato psicológico, e assim entender e até prever o seu
comportamento ao longo da obra.
Não
se pode dizer, de modo taxativo, que o leitor jamais pode criar a
personagem da mesma forma como o escritor a vai desenvolvendo. Mas,
atendendo a uma quase certa boa fé, ou de bem fazer, e dando por
muito provável que o ficcionista procura dar um desfecho quase que
inesperado, procura, sempre, oferecer uma conclusão minimamente lógica. E cuidará desta forma de apresentar a sua obra porque
pretende que seja apreciado por mentes semelhantes a sua própria.
O
relator debe saber que as mentes humanas regem-se por umas regras
gerais, e que este desconhecido, sentir que não se respeitam
totalmente no texto que está lendo. O pode qualificar como absurdo,
incongruente e, em última análise, rejeitará continuar a ler.
Por
outro lado, mesmo que o esquema habitual de quem escreve ficção
aconselhe a que antes de iniciar, ou após poucos parágrafos da
primeira página, estrutura, seja mentalmente, se tiver uma mente com
uma superior capacidade memorística, ou, em alternativa mais
positiva escrever «um guião prévio, que não tomará como de
obrigado cumprimento, dado que é ele mesmo o criador, e, sendo dono
e senhor pode auto-autorizar para avançar sem receio de entrar em
discordâncias evidentes com que escreveu anteriormente. Para
colmatar os erros de incompatibilidades é que tem que reler e
corrigir, muitas vezes socorrendo-se de uma pessoa habilitada, pois
que o autor pode tropeçar nos mesmos erros sem os encontrar.
De
qualquer modo é conveniente aceitar que um escritor -que seja
colocado pelo seu público acima da mediocridade- recorre para o
argumento de factos e pessoas de cuja vida, ou partes da mesma, foi
testemunha directa ou indirecta, e as coloque no meio do enredo.
Quem, por coincidências da vida, tenha tido contacto com o passado
do escritor, seja da família ou das pessoas que saiba ter convivido,
é possível que encontre descrições que os/as retratem, por vezes
fielmente. Mas em geral o escritor usará de cautela e limitar-se
algumas pinceladas verossímeis. Não no intuito de denunciar ou
desenmascarar, más só com a simples pretensão de conferir um
mínimo de credibilidade.
Resumindo:
quem sabe como são as personagens é o escritor. Mas cuidado, pode
acontecer, e acontece com frequência, que o desenrolar do tema
“empurre” alguma ou algumas personagens para comportamentos não
previstos ou previsíveis inicialmente. O mudar, sem destruir o que
se definiu anteriormente, é um predicado que não está à
disposição do leitor. Só o escritor tem poder para manobrar o
percurso dos intervenientes na ficção.
Mesmo
tendo em atenção estas regras ou artifícios estruturais que se
utilizam na escrita de ficção, é frequente que o leitor sinta o
impulso de avançar antes de ler o que aparecerá no texto
impresso (ou nas imagens de cinema ou de TV) E acertará em
muitas ocasiões, consoante a sua experiência pessoal, tanto na
leitura como no seguimento dos comportamentos de quem tenha
oportunidade de ver.
Por
outro lado alguns escritores, quando o fim da obra está por perto,
tem o “saudável hábito” de, indirectamente, provocar o leitor
no sentido de ver se este adivinha o desfecho. No caso mais habitual,
em especial nos romances policiais, o bom escritor faz muitas
manobras para confundir o leitor e fechar o caso com uma saída que
mesmo tendo deixado umas pistas pelo caminho, eram tão discretas e
pouco evidentes (de propósito!) que raramente foram tomadas a sério.
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