segunda-feira, 2 de abril de 2018

CRÓNICAS DO VALE - Capítulo 24





- Agora é o momento de aplicar aquilo de cada macaco no seu galho. Os filhos fioram à vida, e nós? Entre ir no comboio até Coimbra, onde temos a viatura e o ficar na Capital do Desaparecido Império, eu escolheria esta segunda hipótese. E a tua opinião?

- Esta hipótese parece-me, em princípio, interessante. Mas gostaria de a ver mais detalhada. Ou seja, não ficaremos no meio da rua, como os sem abrigo ou os pintalgados fazendo de estátuas. Para já é pertinente encontrar um local onde pernoitar, e depois uma forma de aproveitar este tempo disponível sem estar feitos parvos a ver montras e deixarmos cativar por mais compras sem sentido.

- Se te parecer sensato apanhávamos um táxi até o Corte Inglês e sabendo que os dois gostamos de cinema, aquele lugar, mesmo esquecendo que é um empório onde gastar dinheiro em tantos andares, oferece uma data de salas. Podemos escolher algum dos filmes que raramente chegam a Coimbra, ou mesmo dois se não tivermos muita pressa para nos deitar. No mesmo andar dos cinemas há lugares donde se pode petiscar um jantar leve. E na Duque de Ávila, bem perto, há hotéis aceitáveis. Ao sair do táxi com meia dúzia de passos nos colocamos na recepção e deixamos o quarto marcado e nos livramos deste saco, para não andar carregando o enxoval de um lado para outro. O que opinas?

- José, a tua cabeça não descansa, e penso que a tua proposta merece ser atendida sem controvérsia. Já agora, que tenho a palavra, queria referir dois temas. Em primeiro lugar dizer que não me passou por alto que nas despedida te referisses ao estado já profissional dos teus filhos. Era um tema que eu ameacei inquirir, mas que depois, por prudência, e arrependimento de ter sido excessivamente intrometida, não voltei a tocar. Obrigado pela tua gentileza.

- O outro asunto, no qual penso que devo colaborar ou participar, dado meu estatuton actual de esposa, é o de te empurrar a cumprir a tua promessa de dar uma adiafa, não só ao pessoal que fez a limpeza e desmatação dos terrenos envolventes da mansão do Vale, como também sei que tinhas o propósito de incluir o Presidente da Junta de Freguesia e mais algumas pessoas com as que tiveste relações de amizade. Gostaria de, além de estar presente, poder ajudar em tudo que estiver ao meu alcance.

- Tens razão,  e estava na mente falar nisso. Aindabem que es tú a recordar a promessa e te ofereceres a mostrar como age a companheira oficial. O encontrarem aquele cadáver nos terrenos da casa veio atrapalhar o ambiente, e colocar a promessa num canto, quase esquecido. Mas sei que as pessoas do vale do Pito, sendo essencialmente rurais, sem demérito nem desprimor, mas antes merecedoras de estima e consideração, são bastante terra-a-terra e por isso não deixam de lado os assuntos que lhes interessam de perto.

Eu até penso que o mostrares uma faceta relaxada e até com vontade de manter as tuas ligações à população local, contribui a patentear,por assim dizer, que não tens receio de seres punido por um crime que não cometeste e que te sentes lesado por ter conspurcado o local e as pessoas da casa, e do Vale porque não, sem sentido nem razão. Daí que, entre outras razões entendo que é pertinente dares um andamento ao assunto. E avisares quanto antes aos que sabem ser convidados.

Mais uma vez aceito as tuas argumentações. Mas levar isto avante implica, previamente, tratar de pormenores importantes. Para já uma lista de quantas pessoas teremos que satisfazer, mesmo alguns que nada tiveram que ver com o trabalho em si mas que, certamente, se consideram merecedores de estar presentes. Depois disso combinar quem preparará e servirá o repasto. Não me parece justo que aceite a certamente proposta da veterana Ivone, mesmo que ela diga que tratará de encontrar ajudantes entre a população local. Sinceramente preferia que fosses tu a falar com ela, já amanha, e, procurando não a melindrar, sugerir que das profissionais de hotelaria e similares que conheces, podias angariar uns colaboradores que, “sob as suas ordens” fizessem muitas das tarefas indispensáveis. Até de contratar mesas e cadeiras como fazem nos casamentos.

- Parece-me sensato. Mas atrevo-me e lembrar que eu sou dona e responsável de dois estabelecimentos e que tenho em miras de alugar, ou comprar, um local em Aveiro para expandir o negócio. Por isso, ao chegar a Coimbra deixas-me onde arrumei o meu carro e tratarei das minhas coisas o mais rapidamente que puder, e depois rumarei para a casa do Vale. Entretanto tu podias falar, se assim entenderes, com o feitor Ernesto Carrapato e com o Presidente da Junta, sem comprometer uma data, que desconhecemos por agora.

Não te esqueças de falar com a Luísa e com o Bruno, deixando uma dica, sem compromisso, de que não nos importarmos que venham acompanhados com alguém do seu ambiente, seja amigo, amiga ou mais do que isso. Faz-lhes ver que esta companhia serviria tanto para eles não se sentirem perdidos no meio de gentes que falam noutro idioma como, também, para que os “indígenas” valorizassem que não eram totalmente segregados, por assim dizer, por pessoas que mal conheciam de longe e sempre em tempo de férias, em que vocês, precisamente, traziam quase sempre companhia da vossa criação. Usando uma definição corrente no campo.

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