- Bem
chegado Amigo Medeiros, também Presidente, mesmo que em certas
ocasiões prefira deixar o estatuto de lado. É possível que, nem
que fosse de vista ou de falatório, já conhecesse a minha actual
esposa, depois de tantos anos de viuvez. Chama-se ISABEL Figueiredo,
filha de um dos primeiros mortos no Ultramar do século XX,
concretamente em Timor. Empresária e agora esposa.
Para
ir até o restaurante que me disse recomendar podemos marchar a pé
ou é melhor entrar num carro?
- Esta
Vila não é das maiores e o local fica aqui no centro, de forma que
andaremos e pelo caminho, que será curto, poderemos falar. Se não
estou enganado a Dona Isabel tem um Salão de Beleza aqui na Vila,
onde a minha mulher é cliente, com total agrado, segundo afirma
(desta vez não se trata do
Pereira) e
que me deu as melhores referências tanto no trato pessoal como nos
cuidados profissionais. Hoje não me acompanhou porque lhe insinuei
que o jantar era quase que oficial, mas, precavida e desconfiada como
são todas as mulheres, especialmente as esposas, deve ter cheirado
que a Dona Isabel estaria presente. Não me pareceu melindrada, e até
me encarregou de que, em caso de se confirmar esta companhia, lhe
transmitisse os seus mais amáveis cumprimentos.
- Senhor
Presidente, cá a Luísa pede que desculpe, Senhor Medeiros -ainda
não me compenetrei de que devo prescindir, em privado
evidentemente, do tratamento oficial- Mas quero deixar
constância de que estou totalmente inocente deste crime, pois que
afastar a sua esposa de um jantar entre amigos é mesmo um crime.
Quando chegar a casa vai levar tau-tau! E já agora, se não se
importa, qual é o seu nome caseiro, o de iniciar a assinatura?
- Óscar, um nome histórico, que o
meu pai foi buscar ao tio que o meteu no seminário, de onde se
escapou enquanto viu uma porta aberta. E a porta foi ter deitado o
olho à minha futura mãe. E segundo ela mesma me contou, ao ver
alto e bonitão, mesmo com as vestes do seminário, que eram as
mesmas dos agora estudantes de Coimbra, decidiu que merecia um
sorriso de incitamento. E cá estou eu para confirmar.
E
já chegamos ao cantinho donde gosto de petiscar. Façam o favor de
entrar.
- Pois
eu, que também tenho almoçado aqui, e até jantado, não tenho
memória de ter coincidido consigo. A partir de hoje já não poderei
dizer que não partilhamos nada. Não me olhe desconfiado. é uma
piadinha do mais angelical. Nem os tais seminaristas perdiam tempo
com uma graçola destas, sem graça como é evidente.
Já
que entramos e viemos para jantar, atendendo a que nós, os homens,
não somos crianças e as digestões pesadas se pagam caras, com azia
e insónias, sugiro que escolhemos pratos simples, frugais ou por aí
perto. Veremos o que nos sugere a Cozinheira e Dona, que se recordo
chama-se Gertrudes.
- Boa
noite Dona Isabel e estimados senhores acompanhantes. Aparecem com
muito apetite ou preferem alguma especialidade caseira que não lhes
tire o sono?
- A
Gertrudes adivinhou exactamente aquilo que os três comentavamos
agora mesmo. Nem vale a pena ler a ementa do dia, caso fosse válida
para o jantar-ceia. Diga o que nos propõe, se faz a fineza de nos
orientar.
- Pois
bem. Tenho umas trutas de rio bravo, que com uns grelos cozidos
levemente, mas tenros como bebés, dão uma boa entrada. Depois posso
preparar uns pratinhos, estilo tapas espanholas, mas bem servidas,
com pipís bem temperados, lascas de lombo de porco preto grelhadas e
com rodelas de batata doce, carapaus frescos em escabeche, e até uns
ovos mexidos com espargos bravios. Creio que é bastante onde
escolher, de modo que se há alguma coisa que não apetece ou querem
sugerir algum prato que sabem eu faço bem, peço que, em confiança,
digam.
- Da
minha parte, e sem saber o que preferem os outros, dispensava os
pipís e trocava por umas lascas de bacalhau, do alto, bem desalgado
e temperado com vinagre de maçã, colorau doce e pimenta preta. Mas
o quê dizem os membros do recente casal, já de papel passado?
Isabel, pronuncie-se, s.f.f.
- Pois
até estou em acordo com o deixar os pipís para uma petisqueira de
vinho tinto, com caracóis e búzios, que são primos direitos uns
dos outros. E se posso opinar, além de água fresca sem gás, uma
garrafa de verde branco, do nosso ribeiro de Monção, creio que
daria o complemento correcto.
- E
não conseguem entrar com uma malga pequena de caldo verde, enquanto
esperam? Foi feito agora mesmo; não são sobras do almoço.
- Tá
certo, a Dona Gertrudes é que sabe. Ah! E pode servir os pratos
consoante ficarem prontos, pois cá daremos conta de tudo.
CONTINUARÁ,
se me decidir a isso...
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