quarta-feira, 4 de abril de 2018

CRÓNICAS DO VALE Cap. 25



Já deitados

Este banho foi revitalizador. Estava muito fatigada depois de um dia excessivamente carregado. Mas nem por isso os meus olhos pedem para fechar os estores. E tu, como te sentes?

Mais ou menos como tu dizes, se bem que a minha cabeça parece uma panela de “precisão”, assobiando e com a piruleta dançando sem parar. São demasiados os temas que, na minha cabeça, lutam entre si para ganharem protagonismo, e qualquer deles tem a sua importância. O que menos pesa corresponde à tentativa de apreciar os dois filmes da maratona de ontem.

Admito que escolhemos bem, mas estou baralhado, e nem sequer comentamos um com o outro acerca da impressão que nos deixaram. Os dois argumentos são tipicamente do teor dos USA, e mesmo que as pessoas tenham comportamentos similares, as características do meio em que se encontram condiciona muito a evolução dos mesmos.

-É assim que devem ser vistas as criações cinematográficas ou literárias. A experiência de vida de um europeu, e neste caso de um português, pressiona no sentido de tentar entender, com algum esforço mental, aquilo que no sua origem deve ser quase que banal. Se recordarmos, já com sossego, a história dos três cartazes, de imediato temos que sentir que a acção, denunciadora, daquela mãe, seria absolutamente impensável neste País, e a partir de aqui, mesmo que valorizemos os problemas sociais e mentais daquelas gentes, para nós é tão inverossímil como uma das aventuras do homem-aranha. Que por sinal nunca vi, nem tenho intenção de jamais ir ver.

- Inteiramente contigo. E sem ser idêntico também me senti fora do contexto no outro filme, a tal Lady Bird, que teve alguma nomeações e foi premiado nalguma categoria. Ali aparecem problemas de adaptação que são comuns no ambiente da adolescência. Alguns terminam muito mal enquanto que outros os superam e encaixam no ritmo da vida que se considera normal. Estava cansado nesta sessão e vi que tu também deixavas cair a cabeça, daí que não esperassemos pelo fim e deixamos os problemas para aquela menina, que nem sequer o trabalho dedicado da equipa de maquilhagem lhe conseguiram dar um ar de adolescente mínimamente credível na primeira parte. Enquanto me recordar não tenho intenção de voltar a fazer uma maratona como a de hoje. Nem que chovam picaretas. Isto podia fazer, sem problemas, quando andava pelas Coimbras. Mas agora ...

- Por enquanto coincidimos em gostos e decisões. E como entramos no mundo da fantasia, apareceu-me à tona do pensamento um tema que me intriga desde que te conheci. Ou quase. E que até hoje, apesar das intimidades que criamos e sem que atribua o atrevimento ao facto de sermos um casal com papel passado, tão de fresco que poderia ser considerado que em plena lua de mel, o momento de sossego em que estamos, deitados ao pé um do outro, sem montar nem ginasticar, incita a que me atreva a perguntar, e peço que não leves a mal.Estás disponível?

- Com certeza! Por quem é?

Ainda bem que levas as coisas a brincar. Pois, respondendo, eu sou pelos Galitos de Aveiro, mesmo que não valham grande coisa, e em segundo lugar pelo Benfica, como acontece a muitos lusitanos. Sei que a geografia que empurra para ser do Porto. VIVA O PORTO!, mas não posso com o Pinto da Costa, que está a mudar de amor, ou de vagina se preferires, cada duas por três, ou seja seis. Algumas delas, se não todas, são muito rodadas, se acreditar nas revistas que coloco nos salões e que as freguesas devoram com os olhos a saltarem das órbitas. Mas, pelos vistos, o Pinto da Costa prefere balizas bem abertas, experientes. Não sei como se amanha, mas ouvi cochicharem, as tais freguesas “da alta”, que ele deve ser habilidoso com os trabalhos de língua. Dizem até que deve ter um “linguaralho” de palmo e meio. Pelo menos fala muito e agressivo. São umas maldizentes do mais ordinário marche.

O que me empurra a ser atrevida, curiosa e intrometida, sem perdão, mas compreensível, é que sempre te vi sem problemas de dinheiro. Com notas frescas, sem estarem manuseadas e engelhadas, na carteira; com uma colecção de cartões de débito e crédito que fariam inveja a qualquer cigano da feira, e nunca jamais, em tempo algum (estava mortinha para meter este lugar comum) deixaste cair, nem uma dica nebulosa, que indiciasse de onde tiras os teus proventos. Que devem fluir mais do que o Douro. Ainda agora sinto que vais dar uma adiafa mutitudinária no Vale do Pito e nem tugiste nem mugiste. Parece que tens uma cornucópia de onde escorrem libras sem parar. 

- Já me admirava que não saltasse esta pergunta. Recorda que o Barba Azul tinha tudo preparado, naquele quarto fechado, para despachar as esposas curiosas, e que todas sem excepção terminaram mal. E eu tenho a barba bem cerrada. Obviamente este não será o nosso caso, mas o momento não é o mais adequado. Tomo nota e prometo ir te integrando neste mundo que desconheces. Só te direi que há dois preceitos a considerar. Um diz aquilo de que uma mão lava a outra, mas existe outro que contrapõe, muito sensatamente, que não deixes que a mão esquerda saiba o que faz a mão direita, e o vice-versa também é válido, em especial para os canhotos. Curiosamente, quando parti o braço direito em garoto, ao cair de uma figueira, aprendí a escrever e outras habilidades, com a mão esquerda. Sou, pois, ambíguo, ou melhor: ambidestro

- Vamos dar a conversa por terminada, não achas, querido José? Antes, porém, assinalo que te esqueceste de que a última mulher do Barba Azul ganhou a aposta e não foi morta. E, caso te interesse, tenho o campo bastante lubrificado, e sinto, pelo alto nos lençóis, que também o corpo te pede um aperitivo antes de dormir. Ou estou enganada?

-  Novamente estás acertada. Cá vou eu, a caminho de Viseu.

Sei de muitos nomes para o túnel do amor, mas o de Viseu é novidade. Aproveitaste o verso, e bem aproveitado. Vem aos meus braços, leão do Sporting!

- Eu do Sporting !? Nem louco. Sou da Académica e com muita honra e desgostos


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