UM
LIVRO ABORTADO
Devem
ser muitos os manuscritos iniciados, ilustrados, revistos, e
paginados, já “prontos a comer” que foram colocados na gaveta do
esquecimento. Penso que os respectivos autores, enquanto passaram
muitas horas trabalhando na sua obra, pensaram que o seu fruto devia
atingir a meta de ser publicado, distribuído e adquirido por
anónimos. Por vezes pode acontecer que a sensatez, que sempre
cohabita com as ilusões, faça prevalecer a sua noção acerca da
realidade e aconselhe o abandono.
É
o que me aconteceu após terminar o longo e extenuante trabalho a que
dediquei a minha, esporádica, disponibilidade de tempo ao estudo do
que chamei O MITO DOS DRAGÕES. Por casualidade temporal, e já
estando metido nesta pesquisa, a publicidade e comercialização
colocaram os dragões no pódio. Foram filmes, series, livros, banda
desenhada e tudo o mais que se imaginasse poder levar a consumir. E
sempre com seres inverossímeis. Durou até que este lume foi
substituído por outro. Mas ainda existem brasas incandescentes.
Como
a minha visão a respeito dos mitos draconianos era e é,
exclusivamente, racional, e estava agarrado sem remédio, inclusive
utilizei as minhas fracas capacidades artísticas, e assim sendo
desenhei, pintei, modelei uma excessiva quantidade de peças
representativas de dragões e outros mitos a ele associados, sempre
procurando interpretar as descrições que encontrava em textos
fidedignos.
Quando,
depois de ter considerado o estudo como quase exaurido (desculpem
não ter usado o termo esgotado. Não resisti) o
tendo o “manuscrito” revisto, paginado, com muitas ilustrações,
próprias e retiradas de fontes, chegou o toque de clarim: Como
conseguir que isto ficasse impresso e à disposição do público?
Meditei,
voltei a meditar, e fiz o balanço interior baseado no que via pelas
livrarias. Nem sequer tentei uma abordagem junto de alguma editora.
Fazer
uma edição de autor,
como fazem os poetas que se satisfazem com os exemplares que
distribuem gratuitamente e uns poucos que são pagos, foi posta de
lado. Hoje está tudo metido (1) numa grande caixa à espera que os
meus descendentes deitem fora, dado que não fui capaz de abortar um
feto (metafóricamente falando),
que já tinha completado o seu tempo de gestação.
Mas
tenho pena. Ali tinha deixado tão explicitamente como fui capaz,
como e donde tiveram início muitos mitos que estão abrangidos no
tema draconiano. São simples curiosidades que não devem ofender
ninguém e que nunca afectarão os dogmas cimentados. A
ignorância é mais perniciosa.
A
razão de mais peso sobre a minha obra, abortada, é que sempre
procurei as origens reais destes mitos, que abrangem practicamente
todo o globo terrestre, e que, quase
sempre foram
utilizados pelas doutrinas religiosas com o propósito de, dando-lhe
interpretações
tendenciosas,
passarem a ser mais uma pedra nos seus edifícios dialécticos.
As
pessoas, vistas globalmente, gostam de ser enganadas, mesmo quando
lhes cheira a aldrabice. E contrariar esta realidade, que contraria a
sua tranquilidade, não é aceite nem perdoada.
(1)
manuscritos, cópias do texto, disquetes, pen, fotografias, esboços,
livros de consulta, etc.
Sem comentários:
Enviar um comentário