sexta-feira, 26 de maio de 2017

A TARTARUGA E O IMBONDEIRO



Ainda o Presidente do Conselho de Ministros -que era a designação do agrado de António Salazar- estava em plena posse das suas faculdades mentais e ditatoriais contavam uma história, apócrifa como é hábito serem, na qual se relatava da visita de um grupo de escuteiros ou alunos de uma escola, tanto faz, que conseguiram ser recebidos pelo Professor. Provavelmente eram alunas do Instituto de Odivelas, naquele convento que, nos tempos da monarquia, ganhou merecida fama de ser antro de encontros de terceiro grau.

Os minutos disponíveis eram poucos, dadas as múltiplas tarefas e ocupações do P.M., daí que aquele menino, ou menina, que fora escolhida para se dirigir à respeitável personalidade desse um passo em frente para lhe oferecer uma prenda, numa caixa embrulhada em papel dourado e com um fita encimada com um formoso laçarote. Salazar agradeceu e, como pessoa bem educada, quis desembrulhar para ver de que oferta se tratava.

De imediato o Professor disse, que sem desprezar nem ofender as crianças, não podia aceitar aquela prenda. Uma bonita tartaruga de terra, das que antigamente povoavam a zona meridional da península. A garotada ficou terrivelmente triste. Alguns ainda derramaram uma lágrimas que não conseguiram reter. Foi tanta a ilusão com que juntaram as suas economias para poder comprar esta prenda!

Vendo o desconsolo do grupo, Salazar sentiu a necessidade de se justificar dizendo: Tenho que confessar que me afeiçoo muito aos animais de companhia, e quando morrem de velhice sofro um pesado desgosto. Por esta razão nunca quis ter cães, gatos, papagaios ou nenhum animal ao qual me possa habituar.

Ontem encontrei-me perante uma situação potencialmente parecida. Ofereceram-me, com amizade e por saber que nesta derradeira fase da vida terrena dedico tempo e esmero, dentro das minhas fracas capacidades, na plantação de viveiros e canteiros, sem ideia de vir a concorrer ao certame dos mais cuidados pequenos jardins caseiros. No intuito de acompanhar o meu hobby, deram-me um projecto de árvore, que pode crescer num exemplar exótico de grande porte. Agradeci comovido e ainda hoje plantei aquele vegetal em estado vegetativo, atendendo às recomendações e indicações que a acompanhavam, numa longa série de idiomas: Francês; Inglês; Holandês; Espanhol; Alemão; Italiano; Russo; Coreano; Japonês e Árabe (por esta ordem) Tudo bem explicadinho.

Casualmente, ou não, a árvore em questão é um imbondeiro, o nome mais corrente em Portugal, mas que no folheto que a acompanhava é identificada como um boabab, também se conhece como árvore garrafa, e do qual é possível encontrar alguns exemplares em jardins públicos e colecções botânicas.

Até aqui tudo bem. O alarme disparou nas orientações de como devia ser tratada esta árvore, terminando com a recomendação de que dando-lhe os cuidados indicados pode transitar de geração em geração sucessivamente pois que pode viver até uns 2000 anos. Por esta razão o boabab é conhecido como a árvore da longevidade.

Só de pensar nas responsabilidades que irei transferir aos meus descendentes, caso a árvore não medre -que é uma hipótese plausível- sinto um enorme peso sobre mim.

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