A
minha capacidade financeira, mais concretamente os montantes de moeda
corrente que tive à minha disposição sempre foram mais do nível
do pescador de costa, com cana e carreto, saltando de um pesqueiro
para outro, imaginando que ali não mordiam, mas que uns metros mais
à direita ou à esquerda havia uns robalos e uns sargos com dentes
de fumador, ansiosos de engolir o dueto isco e anzol. Dito de outra
forma, nada me impelia a tentar a pesca de alto bordo, fosse para as
costas do Canadá ou da Mauritânia usando uma simbologia geográfica
para fugir de nomear entidades bancárias concretas.
Apesar
desta situação pessoal, a experiência vivida, primeiro como
estudante e depois como profissional, elucidaram-me sobre o como
agiam os bancos, e como só os muito poderosos ou, o que é quase
equivalente, os trafulhas de primeira linha, é que tinham entrada
pela porta reservada e conseguir fazer suculentos negócios.
Paralelamente fiquei a saber como se conseguia capital nos gabinetes
da CGD.
Entre
as novidades que a Abrllada nos ofereceu foi dar a possibilidade,
mais teórica do que efectiva, de que qualquer cidadão que
dispusesse de um excedente de capital pudesse entrar no jogo das
aplicações de risco, sem se capacitar de que, por desconhecer o que
se manobrava por trás dos reposteiros, ele, o incauto aforrador,
seria, sempre o que pagaria as favas.
Outra
novidade que nos deram, também envenenada, foi a de nos dar notícia
de alguns dos negócios escuros, foram financiados, sem um estudo
aprofundado da sua viabilidade ou garantias que os cobrissem, em
conluio por banqueiros que deviam ser pessoas respeitáveis, mas que
só o eram de facto para os seus pares. Curiosamente, ou não, muitos
destes financiamentos entraram nas pastas dos incumprimentos, que,
eufemisticamente se denominam como crédito mal parado, ou
mais correctamente, dados como incobráveis.
Uma
lista que além de incluir muito crédito concedido para adquirir um
habitáculo, e que a evolução catastrófica (apara alguns) da
economia impediu o devedor de cumprir os pagamentos, podemos estar
desconfiados -como deveríamos ser- que ainda devem existir mais
dívidas de porte, das de milhares de milhões, nesta lista e por
isso não se pode considerar como completa. Estes esquecimentos, a
existir, pode ser que se reservam cautelosamente para não alarmar,
ainda mais, a população que confiou na banca.
O
alarme sou quando nos anunciaram que, dado o estado de carência nas
tesourarias de alguns bancos privados, era inevitável que o Estado
lhes desse uma ajuda, entregando dinheiro dos contribuintes ou, o que
é equivalente, contraindo dívida no exterior com juros e
amortização a cargo do sempre cidadão indefeso. Curiosamente esta
situação foi debatida em jornais, televisões e profissionais
reputados, sem que a população se mostrasse alarmada, como deveria.
Agora,
repetindo o filme por enésima vez, calhou ser a Caixa Geral de
Depósitos, acompanhada do seu eterno parceiro Montepio, que se
destapam com os cofres vazios, ou quase. O pagode, que pelos vistos
acreditava que a CGD é NOSSA, tal como se clamava a respeito
de Angola numas palavras de ordem da época da outra senhora, mostra
que não sabiam ou não avaliavam como sempre funcionou esta entidade
bancária tão especial. Com uns estatutos que lhe auferiam um poder
absoluto sobre a economia nacional.
Qualquer
cidadão adulto, e mais se for empregado do Estado, sabe que a CGD
tinha a exclusividade de todas as receitas e pagamentos que se deviam
entregar a qualquer entidade estatal. Que os ordenados eram
tramitados, geridos e distribuídos pela CGD. Assim geria um imenso
volume -à nossa escala- de numerário certo e inquestionável. E o
que fazia com este dinheiro “fresco”?
Simplesmente
era ali, na CGD, onde os empresários e promotores bem vistos pelo
regime se abasteciam sem problemas, e com juros muito acessíveis,
dando garantias de imobiliário, civil ou industrial, ainda só em
estado de projecto, ou instalações já amortizadas que deviam ser
ampliadas ou substituídas. Assim se cresceu, moderadamente, mas
cresceu, durante a regência de Salazar e do tio Caetano. O já
referido Montepio, que na sua génese era uma casa de penhoras,
funcionava do mesmo modo: financiando sem problemas de maior. Os
problemas, subjacentes, só agora apareceram à luz do dia.
Tanto
a CGD como o Montepio tinham a vantagem adicional de não serem
efectivamente controladas pelas entidades que o deviam fazer,
principalmente o Banco de Portugal, pelo simples facto de que os
lugares de topo nestas três entidades sempre foram atribuídos a
membros de um reduzido grupo de eleitos, certamente seleccionados
pela sua capacidade, responsabilidade e honradez.
A
grande diferença entre ser vítima de um banco privado, e já
fechado se for o caso, reside a que neste só entrou quem quis, e na
CGD pode sentir-se abusado por ter que contribuir, sem ser
voluntariamente, a cobrir os mal-parados, pois para muitos era
condição sine qua non manter conta aberta nesta
entidade “pública”.
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