Não
sei como os cidadãos menos abastados avaliaram as repetidas
notícias, que a meu entender são alarmantes, e não um sintoma de
corporativismo. Refiro concretamente as sucessivas demissões, em
grupo, dos responsáveis de hospitais civis, ou seja daquelas
unidades de cuidados de saúde que dependem para o seu funcionamento
directamente do Ministério da Saúde, e portanto das cerbas
aprovadas quando se discutiu o Orçamento Geral do estado. Verbas
que, de facto, lhes
deveriam ser atribuídas para poderem não só tratar os pacientes
que ali se acolhem mas, indispensável, poder abastecer-se dos
artigos necessários, desde medicamentos, meterial de consumo,
equipamentos funcionais e conseguir os elementos humanos sem os quais
é difícil ou impossível manter aquelas unidades hospitalares
funcionais.
Isto
parece tão claro e evidente que, tendo no governo um conjunto de
forças que se auto-qualificam de esquerda, e sendo uma das premissas
desta facção social o garantir os cuidados de saúde, ajam
perversamente em oposição factual ao aprovado no tal Orçamento
Geral do Estado. Com o intuito de ganhar méritos contabilísticos
perante os credores, retiraram uma parte das verbas teóricamente
atribuídas em muitos departamentos. Chamam a esta manobra sibilina,
o aplicar cativações.
Este
truque aritmético consiste, traduzido na linguagem normal, em dar
com uma mão e tirar de imediato com a outra. Agindo assim é
impossível cumprir um plano de acção sério. Anda coxo logo à
partida.
São
muitos os serviços que se queixam desta diminuição efectiva de
verbas disponíveis. Podemos admitir, sem que o País caia, que se
corte no orçamento real da “cultura”. Que os museus tenham que
manter salas fechadas por não ter o quadro de vigilantes completo.
Que as companhias de teatro, ballet ou orquestras estejam na penúria
por falta de apoio monetário; que não se possam subsidiar filmagens
ou restauros considerados urgentes; etc.
Mas
que os cidadãos carentes de cuidados de saúde vejam que não podem
ser atendidos nos hospitais, e outras unidades de saúde, por
carência de meios, e se tente justificar este crime social pelo
propósito de ficar bem qualificados perante quem nos avalia, é
inaceitável. E se os sindicatos, sejam filiados na CGTP,na UGT ou
Independentes (teóricamente) fazem greves, pressionam e conseguem,
se não tudo aquilo que reclamam pelo menos uma fracção a fim de
que se calem, nem que seja por um periodo de tempo relativamente
curto, o que podem fazer os doentes?
A
greve do doente deve ser o morrer sem assistência. Quem se importa
na governação? A opção, para aqueles que tenham uma reserva
económica com uma certa magnitude, é a de poder procurar tratamento
junto das unidades de saúde particulares, privadas, cujas
contas são, posteriormente, cobertas pelos cofres do estado.
Assim,pelo caminho, há quem lucre com a desgraça alheia. Bacano!
Os
críticos, apoiantes indirectos ou camuflados, das habilidades do
ministro -agora a tempo parcial,
enquanto sorri com toda a dentadura- dirão que desde os
médicos às equipas de enfermagem e de diagóstico, são muitos
aqueles que, mesmo sem estarem em greve, prestam o seu trabalho
profissional nos hospitais privados. Centros estes que constantemente
aliciam os profisiionais que foram preparados pelo estado. A estes
denunciantes podiamos perguntar: que entendem que deviam fazer estes
membros dos quadros hospitalares, quando não os contratam ou não
são remunerados como na concorrência -que sabemos joga com as
costas e as contas quentes, garantidas pelas verbas do estado-
para sobreviver e tirar proveito económico da sua capacidade
profissional?
E
este esquema, além de outros também do domínio público, funciona
com o beneplácito duns elementos que se proclamam como tendo um
intenso sentindo, um pendor, social; preocupados com os problemas dos
mais desfavorecidos. Pelo menos, aqueles que aceitam, claramente, a
sua vocação direitista, não tentam enganar o pessoal.
Uma
vergonha. Não que aconteça isto, mas pior, o facto de não existir
um sentimento geral de repúdio e revolta. Que vale o fingir que
estamos no bom caminho quando se sacrificam os serviços essenciais?
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