sábado, 15 de setembro de 2018

MEDITAÇÕES – Cuidar dos reflexos



Por ser sábado, comprei o semanário Expresso, que é o único periódico que consulto, embora não considere que este “eleito por exclusão de partes” seja merecedor de um fé cega. Mas ao não procurar comparação com outro, limito-me a julgar pelos meus preconceitos.

Iniciei com uma leitura seletiva, como habitualmente faço, a alguns artigos e colunas que figuram na revista que acompanha o referido semanário. Por tratar de uma personagem marcante da história recente li, sem ser na tal diagonal, o artigo que anunciava notícias sensacionais, bombásticas, que certamente poderiam melhorar a visão que o cidadão comum tinha sobre o periodo em que Salazar esteve de baixa após a famosa queda da cadeira. Não encontrei nada de novo neste texto, mesmo contando com as opiniões “isentas” do famoso politólogo Jaime Nogueira Pinto.

Apesar de não ter acrescentado nada de importante ao acervo que tenho em mente, tanto sobre a figura do ditador como do meio social que o rodeava, surgiu-me um julgamento, parcial, concreto, sobre uma das ordens severas que Salazar dava para os encarregados de censurar o que se editava e publicava. Diz-se, e encontrei repetidamente MEDITAÇÕES – Cuidar dos reflexos esta afirmação, que o Presidente do Conselho ordenava que não se referissem nos jornais notícias de suicidios. Não por uma questão de respeito para aqueles que decidiam deixar de viver mas, especialmente porque sabia que esta, e outras notícias de índole social, podiam conduzir a que outros cidadãos decidissem seguir o exemplo. O mimetismo sempre existiu e existirá.

Os opositores, como era de prever, opinavam que esta normativa era mais uma das pressões inaceitáveis que, abusivamente, condicionava a livre expressão que deveria ser respeitada, em vez de ser alvo de repressão.

Saltando para actualidade e dentro da liberdade de expressão e comunicação que, teóricamente, nos é dada actualmente nos países ditos democráticos, nada me impede de ajuizar que o que acontece entre os jóvens estudantes, nomeadamente nos EUA em que a situação alcançou níveis de catástrofe social, com a frequência com que um dos alunos, munido de armas de repetição, ataca indiscriminadamente os seus colegas de escola, causando mortes e feridos sem justificação. O reflexo mais imediato centra-se a culpabilizar o sistema vigente, que permite e até incita a que os cidadãos adquiram e possam utilizar armas de fogo, como defesa pessoal ou, sem poder evitar, também para agressão mortífera.

Ligando o nosso passado à actualidade nada me impede de pensar que esta situação, como também a dos ataques terroristas, é incitada, mesmo que alegando não ser este o propósito, ao noticiar este género de sucessos com excessivo detalhe, com morbidez desnecessária, e com isso provocar outros insensatos, mal doutrinados pela noção de ser pertinente a agressividade, que lhe garante o ser respeitado e considerado “super”.

O ter uma arma de fogo, ou mais do que uma, com capacidade letal, possibilita que o aluado possa vingarse de imaginadas -ou mesmo reais mas de um nível pouco importante- ofensas. Quando este jóvem, obcecado, tem a possibilidade de utilizar armas que estão, em muitas ocasiões, na sua casa e de que até receberam instruções de uso, já está practicamente orientado para ser autor de um massacre.

Tenho a noção de que, pelo menos neste caso, Salazar tinha razão. E que as liberdades, quando consentidas indiscriminadamente, são potencialmente um perigo social, com uma magnitude não desprezível.

E termino com uma referência curiosa, de algo corrente na fase ainda rígida de ditadura. Existia uma emissora, de raio de penetração reduzida à area da cidade de Lisboa, onde era consentido um programa irreverente, que hoje nos pode parecer impossível poder ser enviado para as ondas radiofónicas. Neste programa surgiam anúncios comerciais inusitados, mas patrocinados por casas comerciais idóneas e identificadas. Um deles dizia assim: A Agência Barata (uma das mais importante funerárias de então) enterra o que morre e o que se mata! Ding-Dong!

Um atrevimento, consentido, que infringia o silêncio sobre suicídios !


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