domingo, 9 de fevereiro de 2020

MEDITAÇÕES – Palavras de noite



NÃO SÃO LEMBRADAS DE MANHÃ

A interpretação mais imediata desde anexim é que muito do que se diz quando o travesseiro está quente -e quem diz travesseiro pode ser o leito todo, o chão, o sofá, a mesa do gabinete, ou até o apoio de uma parede- não se pode considerar como uma jura gravada na pedra, ou seja “lapidar”. São afirmações  totalmente honestas, são fruto do entusiasmo e de fraqueza mental que naquele momento se sente. Mas que quando a febre desce já sabemos que a primeira tarefa com que a mente se afoita é a de varrer para o esquecimento tudo aquilo que pode corresponder a um compromisso problemático.

Daí que a mensagem, implícita o subjacente, é bastante mais abrangente e até impessoal. Se bem que neste momento aquele horizonte que me atrai é muito mais pernicioso do que muitos dos pensamentos e divagações deitadas pela boca fora em momentos de exaltação.

Não vou encaminhar esta reflexão para assuntos do campo da fé, pois sendo esta uma zona onde a racionalidade não está sempre presente -ou practicamente jamais- e apesar disso, ou se calhar por esta mesma razão, é propício a conduzir a ofensas pessoais, o melhor é não entrar, nem sequer com pés de chumbo. Recordo que no universalmente valorizado Dom Quixote, num dos capítulos refere que estando eles dois, Quixote e Sancho, percorrendo as planuras castelhanas numa longa noite escura e procurando um local onde pernoitar, o imaginário escudeiro exclamou que tinham chegado a um possível albergue. Foi bater à aldrava e quando o Cavaleiro da triste figura ouviu o eco que retornava daquele edifício, disse: Sancho, demos de cara com a Igreja, recuemos. (deixo a interpretação deste aviso ao encargo do leitor)

Mas aquilo que, com a experiência vivida e observada, todos sabemos é que promessas de políticos são folhas secas que o vento leva e espalha sem arquivar. Mesmo sabendo que não podemos acreditar no palavreado daqueles que pretendem que os ajudemos a subir ao pódio, com o nosso voto, as piores promessas destes cavalheiros -que o são não precisamente porque se exibem montados num solípede, mas pior, porque somos nós, os cidadãos abusados, mesmo que não propriamente enganados, que os carregamos às costas- E como o mentir, ou prometer com predisposição de não cumprir, deve ser considerado como uma moléstia adicticiva, o devemos anexar à ideia de comer e coçar é só começar.

Tristemente, porque este viciamento em prometer e não cumprir nos afecta a todos, e reconhecemos quão propício é o untar os dedos quando se mexe com azeite, considero que o primeiro lugar na interpretação do que, subtilmente, nos avisa o aforismo que encabeça este escrito, não se deve atribuir às juras de amor carnal mas, por serem mais frequentes e perniciosas, às galgas com que os nossos homens públicos -nossos porque todos temos parte de culpa na sua eleição- são tão prolíferos e esbanjadores. Piores do que as mulheres ditas de públicas, pois estas fazem-se retribuir directamente e com uma dedicação pessoal concreta, mesmo que também falsa.

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