segunda-feira, 18 de março de 2019

IN MEDIO STAT VIRTUS


No meio está a virtude

Nem sempre aquilo que parece evidente numa mensagem clássica é só uma das possíveis interpretações, e, pelo contrário, aquilo que mais de imediato nos é sugerido pode ser o cerne do recado. A tradução que apresento para a máxima latina é a mais socialmente correcta, se a entendermos equivalente ao outro ditado de Nem tanto ao mar nem tanto à terra. Nos propõe fugir dos extremos, da ambição desmedida, ir para um equilíbrio que satisfaça ambas partes.

Todavia, a picardia da linguagem vulgar, interpreta literalmente onde se guarda a virtude, concretamente das mulheres. Pelo contrário quando são referidas mulheres de virtude, o léxico popular não se refere precisamente a mulheres que tenham um comportamento virtuoso, sem mácula. Antes esse qualificativo se usa para definir mulheres que se dedicam a más artes, a bruxedos e outras acções que sendo reprováveis socialmente a mesma sociedade aceita e até promove.

Uma situação que pode ser ainda se mantenha vigente nas zonas rurais mais esquecidas, e a de que estas mulheres a quem se atribuem poderes ocultos, tanto para fornecer mezinhas de medicina popular como até, em casos extremos podem facilitar abortos ou um fim de vida sem sofrimento. Aquilo que se chamava de uma boa morte, que na linguagem e costumes actuais se refere como aplicar a eutanâsia. E quantos de nós, se nos encontrássemos perto de um fim irremediável, sem possibilidades de cura e perante o ter que padecer de um tempo indefinido de sofrimento, não desejaria que alguém, fosse homem ou mulher, médico ou curandeiro nos ajudasse a partir?

Outra frase feita, que ouvi referir durante a minha juventude e que desconheço se ainda perdura na linguagem coloquial, era: Deu-lhe água de cú lavado. Que além da rudeza de interpretação literal se pode entender como, para conseguir prender um namorado, sempre houve e haverá, quem arrisque a oferecer “o seu tesouro máximo”, não necessariamente através de uma beberagem nojenta mas antes por facilitar, consentir, uma apertura do tal meio onde se atribui residir a virtude, e praticar aquele acto que, simpáticamente se pode definir como um acto de amor.

E numa sequência muito corrente podia -ou pode- acontecer que mesmo sacrificando a virtude do meio, o fim pretendido não surgisse e o parceiro se escapuliu depois de satisfeita a sua lubricidade. A ex-virgem dizia, neste caso, que foi enganada a falsa fé, possivelmente com o uso da lábia traiçoeira do castigador que, antes dela, já tinha conseguido resultados iguais com outras convencidas do seu valor e capacidade de não vir a ter o mesmo destino das anteriormente enganadas.

Esta capacidade que alguns têm, e usam, para conseguir o que desejam chama-se cantar a canção do bandido. Que, como é evidente, aquele que tem o dom de convencer outro, usará a canção mais apropriada em cada caso. Os membros da dita etnia cigana possuem um repertório bastante extenso para convencer, enfeitiçar, quem se coloque a jeito de os ouvir. O que se recomenda é que jamais lhes de a mais mínima oportunidade de iniciarem o seu “canto”, pois que uma vez ligada a fita é difícil interromper e escapar incólumes.

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