MEDITAÇÕES
– Uns são gordos e outros esguios
MAIS
UMA VEZ SOBRE OS DRAGÕES
Em
todas as épocas e lugares do globo, o homem tem-se debatido,
mentalmente, com os dragões, se entendermos como tais os seres
imaginários que são responsabilizados de acções que nos
ultrapassam. Se estivermos dispostos a ter uma visão abrangente de
todos os seres míticos que a humanidade tem adorado ou temido, que
são duas faces da mesma moeda, sempre, mas sempre sem falhar,
encontraremos na base destes mitos a Natureza, e os seus “fenómenos”
que, por obedecerem a forças que nos ultrapassam, o homem sempre
procurou explicar com elucubrações difusas, notoriamente incríveis
a mentes que se pretendem esclarecidas.
Já
não recordo qual foi a faisca que me incitou a entrar, positivamente
a saque, no tema do mítico dragão e de tudo aquilo que fui
encontrando, nem sempre evidente, mas que deram azo a credulidades de génese ignota mas perdurável. Actualmente o assunto, no que me
atinge pessoalmente, está arquivado, em pousio. Mas paulatinamente
vão surgindo comentários e assuntos que levam a recordar o que
mantenho compilado, copiado, desenhado, gravado e escrito, e próximo
a decidir a editar em livro.
Uma
conversa entre amigos fez emergir, das profundezas do arquivo, a
dicotomia entre o dragão oriental e o ocidental. Ao primeiro
lhe é atribuído um corpo longo, ondulante, serpentina e voador,
enquanto que o dragão europeu ocidental permaneceu, durante muitos
séculos, como um ente perigoso, difícil de visualizar, com corpo
compacto, rechonchudo e habitualmente residente em grutas, fragas ou
florestas com densidade impenetrável. Logicamente, dado que o homem
pretende explicar tudo o que o rodeia, deve existir alguma razão
para que as duas etnias draconianas, oriental e ocidental, sejam tão
diferentes e até de como são definidos os seus caracteres.
Para
entender a divergente imagem do dragão entre Oriente e Ocidente
temos que recuar muitos séculos, e analisar os elementos de
representação iconográfica que encontramos hoje. Sem dúvida que
as representações orientais são muito anteriores às ocidentais, o
que coincide com a reconhecida decalagem cultural que existiu entre
estes dois sectores do continente euro-asiático. O que ainda hoje
nos pode causar admiração é a insistência em representações de
dragões que se mantêm viva no Oriente, sendo corrente o uso
decorativo em porcelana, escultura, talha, pintura e gravura. Mas
sempre com ar feroz e indutor de temor.
Perdoem a insistência, mas é curioso observar como o dragão chinês, e dos
países seus colimitantes, tem sempre uma face agressiva e uma garras
armadas de poderosas unhas. Ambos sinalizando um evidente e potencial
perigo. E, apesar disso, nos é referido que, para as pessoas da
zona, o dragão pode ser um entre protector perante perigos que não
está no poder do homem conseguir neutralizar. Por isso encontramos
dragões no topo dos telhados dos templos e palácios, nas esquinas
das casas e em muitas entradas de respeito, numa posição
equivalente à dos leões que guardam museus, e outros edifícios de
respeitabilidade no ocidente.
Recuemos
mais, até os primórdios da cultura asiática. O mito tem o seu
início nas luzes mutáveis e alongadas, com aparência de cobras,
que circulam pelos ares (em determinadas ocasiões). Não se sabia a
que era devido, qual era a sua origem, mas sabia-se que podia ser o presságio de graves alterações atmosféricas, de ventos fortíssimos acompanhados de chuvas torrenciais e até de inflamação por raios.
Tardou tempo em se descobrir que aquelas serpentes coloridas nos céus
eram auroras boreais, causadas pela atracção magnética dos pólos terrestres para os ventos solares, carregados de energia, ionizavam a atmosfera. O que
sim encontraram foi uma relação entre as cobras celestes,
multi-coloridas, e as temíveis tempestades.
Até
aqui o respeito aos fenómenos atmosféricos, eléctricos ou luminosos, foi motivo de atenção e culto por todos os povos de
Terra. A forma de tentar neutralizar o perigo é que foi diferente
para os orientais, mais meditadores e simbolistas do que os primários
ocidentais. E o que no Oriente decidiram foi que deviam procurar, com
insistência, ter uma relação de amizade com o dragão, sem
esquecer que ele tem poderes inatingivel para os humanos. Que o
deviam satisfazer e adular, sem deixar de o temer.
É
muito interessante saber como e quando a decisão de procurar fazer
amizade com o mítico dragão, passou do Oriente para Ocidente. Já
os exércitos de Alexandre se depararam com tribos indígenas
estruturados em exércitos, que em altos galhardetes desfraldavam
longas tiras com representações de dragões, que ondulando com o
vento, imitavam as auroras boreais. Provavelmente só os portadores
destes estandartes conheciam o seu significado. Mas foram adaptados,
pelos exércitos gregos e romanos como método de gerar terror ao
adversário. Mais tarde nos exércitos modernos, nomeadamente em
certos esquadrões de cavalaria, adoptaram o nome “dragões” .
Mas o simbolismo da serpente voadora foi-se esbatendo.
O
dragão ocidental passou a ser um ente terrestre, com propriedades
mágicas, entre elas as de se poder deslocar pelos ares para
justificar a sua ubiquidade, ou seja a presença em lugares muito
distantes entre si. Só muito recentemente, com o auge dos filmes de
animação, os “nossos” dragões voadores passaram a ser
representados com asas de grande envergadura, sem todavia obedecer às
relações de potência e envergadura que são, naturalmente,
seguidas por aves e morcegos.
(*)
mas, pragmaticamente, não
me decidi a fazer a despesa de editar para desfazer em pasta
reciclada.
Sem comentários:
Enviar um comentário