quinta-feira, 2 de janeiro de 2020

MEDITAÇÕES - Uns são gordos e outros esguios


MEDITAÇÕES – Uns são gordos e outros esguios

MAIS UMA VEZ SOBRE OS DRAGÕES

Em todas as épocas e lugares do globo, o homem tem-se debatido, mentalmente, com os dragões, se entendermos como tais os seres imaginários que são responsabilizados de acções que nos ultrapassam. Se estivermos dispostos a ter uma visão abrangente de todos os seres míticos que a humanidade tem adorado ou temido, que são duas faces da mesma moeda, sempre, mas sempre sem falhar, encontraremos na base destes mitos a Natureza, e os seus “fenómenos” que, por obedecerem a forças que nos ultrapassam, o homem sempre procurou explicar com elucubrações difusas, notoriamente incríveis a mentes que se pretendem esclarecidas.

Já não recordo qual foi a faisca que me incitou a entrar, positivamente a saque, no tema do mítico dragão e de tudo aquilo que fui encontrando, nem sempre evidente, mas que deram azo a credulidades de génese ignota mas perdurável. Actualmente o assunto, no que me atinge pessoalmente, está arquivado, em pousio. Mas paulatinamente vão surgindo comentários e assuntos que levam a recordar o que mantenho compilado, copiado, desenhado, gravado e escrito, e próximo a decidir a editar em livro.

Uma conversa entre amigos fez emergir, das profundezas do arquivo, a dicotomia entre o dragão oriental e o ocidental. Ao primeiro lhe é atribuído um corpo longo, ondulante, serpentina e voador, enquanto que o dragão europeu ocidental permaneceu, durante muitos séculos, como um ente perigoso, difícil de visualizar, com corpo compacto, rechonchudo e habitualmente residente em grutas, fragas ou florestas com densidade impenetrável. Logicamente, dado que o homem pretende explicar tudo o que o rodeia, deve existir alguma razão para que as duas etnias draconianas, oriental e ocidental, sejam tão diferentes e até de como são definidos os seus caracteres.

Para entender a divergente imagem do dragão entre Oriente e Ocidente temos que recuar muitos séculos, e analisar os elementos de representação iconográfica que encontramos hoje. Sem dúvida que as representações orientais são muito anteriores às ocidentais, o que coincide com a reconhecida decalagem cultural que existiu entre estes dois sectores do continente euro-asiático. O que ainda hoje nos pode causar admiração é a insistência em representações de dragões que se mantêm viva no Oriente, sendo corrente o uso decorativo em porcelana, escultura, talha, pintura e gravura. Mas sempre com ar feroz e indutor de temor.

Perdoem a insistência, mas é curioso observar como o dragão chinês, e dos países seus colimitantes, tem sempre uma face agressiva e uma garras armadas de poderosas unhas. Ambos sinalizando um evidente e potencial perigo. E, apesar disso, nos é referido que, para as pessoas da zona, o dragão pode ser um entre protector perante perigos que não está no poder do homem conseguir neutralizar. Por isso encontramos dragões no topo dos telhados dos templos e palácios, nas esquinas das casas e em muitas entradas de respeito, numa posição equivalente à dos leões que guardam museus, e outros edifícios de respeitabilidade no ocidente.

Recuemos mais, até os primórdios da cultura asiática. O mito tem o seu início nas luzes mutáveis e alongadas, com aparência de cobras, que circulam pelos ares (em determinadas ocasiões). Não se sabia a que era devido, qual era a sua origem, mas sabia-se que podia ser o presságio de graves alterações atmosféricas, de ventos fortíssimos acompanhados de chuvas torrenciais e até de inflamação por raios. Tardou tempo em se descobrir que aquelas serpentes coloridas nos céus eram auroras boreais, causadas pela atracção magnética dos pólos terrestres para os ventos solares, carregados de energia, ionizavam a atmosfera. O que sim encontraram foi uma relação entre as cobras celestes, multi-coloridas, e as temíveis tempestades.

Até aqui o respeito aos fenómenos atmosféricos, eléctricos ou luminosos, foi motivo de atenção e culto por todos os povos de Terra. A forma de tentar neutralizar o perigo é que foi diferente para os orientais, mais meditadores e simbolistas do que os primários ocidentais. E o que no Oriente decidiram foi que deviam procurar, com insistência, ter uma relação de amizade com o dragão, sem esquecer que ele tem poderes inatingivel para os humanos. Que o deviam satisfazer e adular, sem deixar de o temer.

É muito interessante saber como e quando a decisão de procurar fazer amizade com o mítico dragão, passou do Oriente para Ocidente. Já os exércitos de Alexandre se depararam com tribos indígenas estruturados em exércitos, que em altos galhardetes desfraldavam longas tiras com representações de dragões, que ondulando com o vento, imitavam as auroras boreais. Provavelmente só os portadores destes estandartes conheciam o seu significado. Mas foram adaptados, pelos exércitos gregos e romanos como método de gerar terror ao adversário. Mais tarde nos exércitos modernos, nomeadamente em certos esquadrões de cavalaria, adoptaram o nome “dragões” . Mas o simbolismo da serpente voadora foi-se esbatendo.

O dragão ocidental passou a ser um ente terrestre, com propriedades mágicas, entre elas as de se poder deslocar pelos ares para justificar a sua ubiquidade, ou seja a presença em lugares muito distantes entre si. Só muito recentemente, com o auge dos filmes de animação, os “nossos” dragões voadores passaram a ser representados com asas de grande envergadura, sem todavia obedecer às relações de potência e envergadura que são, naturalmente, seguidas por aves e morcegos.

(*) mas, pragmaticamente, não me decidi a fazer a despesa de editar para desfazer em pasta reciclada.











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