QUANDO
UM SONHO SE PROLONGA EM VIGÍLIA
Esta
madrugada acordei, repentinamente. Mas desta feita recordava o
argumento que bulia no meu subconsciente, ou consciênte quase no seu
90 %. O impacto mental que se tinha instalado era de tal calibre que,
propositadamente, mantive-me estático, sem forçar a marcha do
acordar e, excepcionalmente, pude continuar o raciocínio que tinha
enquanto dormido. O que ainda não descobri foi o facto real, ou a
vivência como digo habitualmente, que me deixou tamanha “ansiedade”.
Recordo
que a cena começava numa minha visita a uma escola secundária, sem
que destaque de onde era e se havia uma motivação concreta. Bati à
porta de uma sala de aula, que estava em actividade e com a
professora (doutora possivelmente) expondo a lição do dia. Pedi se
me permitia estar presente, a fim de comparar a minha experiência de
65 anos atrás com o que actualmente acontecia numa aula numa escola
oficial. Prometi estar calado, como atento observador, sem deixar de
aceitar que este meu pedido não devia ser normal, nem sequer aceite.
Mas confesso que nem sonhando cumpri a minha promessa.
Já
meio acordado lembro que, progressivamente, ia ficando confuso
perante o ambiente que reinava na sala. Pelos vistos aquilo era
normal ou habitual. Deduzi, com boa vontade, que os tempos eram
outros, bastante diferentes, e que a disciplina, quase que espartana,
que eu tinha vivido já nada tinha que se comparasse ao
comportamento, digamos que “democrático e descontraído” com que
os alunos falavam entre eles e até do modo como interpelavam a
professora. Por fortuna não “assisti” (no
sonho) a cenas de agressão verbal ou física entre
discentes e docente. Mas aquilo que vi chegou para me acordar com um
peso social na mente gasta de um velho.
Não
foi a primeira vez que meditei, e até comentei com amigos, o quanto
se modificou a vida das pessoas em menos de uma centúria. Do
trabalho infantil, (que
era imprescindível por necessidade económica de muitas famílias,
levou ao ditado popular que afirmava
Quando nasce
um filho traz um pão debaixo do braço)
Passamos a uma
realidade totalmente diferente. Que chega a ser absurda por
exagerada. Os filhos tornaram-se, de facto, réis e em
muitas ocasiões verdadeiros ditadores dos adultos.
O
que se tornou normal, desde infantários a apoios nas deslocações,
instalações das escolas e na multiplicidade de professores e
auxiliares que se exigem, multiplicaram os custos da passagem de
criança a adulto por um factor que ninguém se atreve a quantificar,
pela noção prévia de que deve ser espantoso. Tudo é pago, ou fica
na dívida pública, a preço de oiro do Brasil, com
a agravante de que esta “obra” nunca fica acabada. Pior, ano após
ano, a despesa cresce.
Progrediu-se
socialmente? Pois com certeza que sim. Mas a que custo? Como exemplo
de mudança temos que a esperança “de vida” (quantas
vezes os últimos anos de estadia neste mundo não se podem valorizar
com sendo, de facto, vida) passou
de 60 para mais de 80 anos. E cada vez são menos as famílias que
conservam os seus velhos no seio da casa. Tornou-se habitual os
despachar para um “lar” onde aguardem pela morte, e não
carreguem a família com trabalhos nem sempre agradáveis.
Ao
arrumar os avós num buraco, mais ou menos infecto, globalmente
tem-se que, entre reformas e custos de “manutenção”,
nomeadamente alimentação, asseio, cuidados de saúde, consultas e medicamentos, os velhos
são uma carga de despesas gerais considerável. Friamente e com mais
adoçante do que açúcar esta situação empurra para a moralmente
não aceitável eutanásia.
Esconder esta situação e o consequente desfecho é comparável à
falsa ideia de que a avestruz esconde-se enterrando a cabeça e
deixando o corpanzil de fora. (*)
Voltando
ao princípio: do nascimento até a vida laboral activa, ou seja
quando já produz e não está à espera de uma ocupação que lhe
permita a sobrevivência, ou seja o período produtivo do
homem/mulher, digamos com salário ou objectos de produção pessoal
comercializáveis, e o atingir o limite oficial de deixar de
trabalhar, recebendo uma quantia variável, a que chamamos reforma, arbitrariamente podemos considerar que dos 70/80 anos de presença neste mundo, só
contribuímos para a despesa geral (incluindo a nossa própria),
durante uns 45 anos. Isso sem descontar férias e baixas por doença,
mortalidade prematura e catástrofes. E chegamos à conclusão de
que: Na média geral somos
culpados de consumismo improdutivo durante quase metade da nossa
vida.
E
nesta excessivamente simples contabilidade não referimos os
esbulhos, roubos, desfalque e erros que são apanágio das
sociedades. NÃO ME PARECE QUE SE CONSIGA EQUILIBRAR O ORÇAMENTO GERAL,
sem recorrer a truques contabilísticos e varrer para debaixo do
tapete.
(*) Eu,
pessoalmente, digo com convicção que já estou mais “fora de
prazo” do que um iogurte fabricado em 1950.
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