segunda-feira, 1 de outubro de 2018

IN ILLO TEMPORE – 2



Esquecer o passado

Existem grandes verdades, pensamentos profundos, no meio dos ditados populares, ou rifões. Não faço ideia de se as novas gerações ainda entrarm neste campo da cultura, por arrastamento do que ouvem dizer no seio da família. Mas tenho as minhas dúvidas de que tal aconteça. Esta impressão deve-se por ver como, desde muito crianças, mantem-se totalmente alheadas do que as envolve, e mesmo quando estando num grupo, cada um só tem olhos para o pequeno visor que o traz enfeitiçado. Ja vi uma quase bebé, de chucha, que se entretinha dedilhando e esfregando um telemóvel! muito antes de saber falar e de poder entender cabalmente uma conversa de adulto.

O parágrafo anterior surgiu com o propósito de servir de introito ao que um ditado popular, dos bons, nos avisa, sempre e tanto que o interpretarmos pelo conteúdo abrangente e não só pelo que a frase em si nos diz. O ditado é o seguinte: Cada qual diz da feira consoante lhe vai nela.

Traspondo da situação pontual de uma feira para a vida é fácil entender as razões, ou despropósitos, que levam a que os membros das sucessivas gerações não desejem ouvir das agruras porque podem ter passado os seus antecessores. Do passado dos outros, mesmo sendo tão chegados como os seu proprios pais, só lhes agradam as boas lembranças, as agradáveis, aquelas que se podem valorizar como os programas das televisões generalistas. E a realidade nos diz que por cada vivência engraçada, agradável, se o percurso do familiar incluiu tempos magros, tristes, com dificuldades, serão estas situações as que com mais frequência serão recordadas, especialmente quando a idade avançou e se entra na velhice.

Uma referência conhecida é a de que aqueles que estiveram em frentes de combate, que dispararam a matar e sofreram fogo do inimigo, que viram companheiros mortos ou mutilados, raramente estão dispostos a falar destas vivências. Não só porque estas recordações são pesadas, tristes e trazem traumas para a flor da pele quando ele as preferia manter quase que esquecidas, mas que infelizmente as traz sempre presentes, mas porque sente que os ouvintes, sendo de outra geração, não lhe dão a importãncia que merecem. Obviamente não as podem sentir, dado que não as viveram. Pior, preferem não as ouvir ou, em contraponto, só os sádicos é que prestam atenção, uma atenção que o relator não aprecia.

Possivelmente para conseguir que um descendente se interesse, interiormente, pelas vivências penosas dos seus pais seria necessário que estes, fosse com premeditação ou por não conseguir tirar da sua mente sucessos muito anteriores, tenham martelado os ouvidos dos filhos com uma insistência que tornasse impossível manter os ouvidos moucos. O mais normal é que os filhos rejeitem entrar, entender, valorizar, as situações penosas porque passaram os seus progenitores. Para eles, os da actualidade, o pertinente será atender a outro anexim: Burro morto, cevada ao rabo. Ou Passada a festa, esquece o santo.

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