Um
fruto da família das maçãs, peros, peras e outros frutos de pevide
miúda. O marmeleiro é associado, através das suas varas rijas mas
flexíveis, como tendo reconhecidas propriedades recuperadoras, no
sentido de que manipulados contra as costas de um faltoso o podem
corrigir e assim o reconduzir para o grupo dos bem comportados.
Habituei-me
a ver os marmeleiros mais como arbustos, dispares das árvores que
insistem em manter um aspecto normal, com um tronco único e ramas
onde frutificam flores e dão suporte aos frutos. Pelo contrário, os
marmeleiros são quase que arbustos, indómitos, com uma
multiplicidade de troncos à volta da estaca central e ramas
despenteadas, rebeldes, possivelmente porque o homem, o camponés,
não se dispos a domestica-lo. Deve ser por esta razão e porque os
seus frutos não são os mais cotizados no mercado, que muitas vezes
ficam relegados à berma das propriedades, com as funções de
constituir uma sebe natural, não totalmente dissuadora, tanto entre
propriedades de donos diferentes como nas lindes de caminhos
comunais. Esta colocação oferece ao vizinho ou ao passante a
possibilidade de pilhar algum fruto sem sentir que esteja cometendo
propriamente um furto.
O
fruto em si, o marmelo, merece mais estima do que a que sugere
o pouco cuidado que se dedica à árvore arbustiva. E, no entanto,
dada a sua forma e o ter uma portuberância pouco usual no extremo
oposto ao pedúnculo, além de que quando madura emana um perfume
cativante, é associado à imagem da mama feminina e daí que na
linguagem picaresca se denominem de marmelos os peitos.
Por
outro lado temos que os marmelos assados no forno rivalizam com as
maçãs, por terem uma textura e um aroma específicos. A sua polpa,
quando cozinhada com a adição de açúcar, nos oferece a estimada
marmelada -que novamente fica ligada aos peitos das
raparigas como prato forte nos namoros, pela possibilidade de excitar
tanto a portadora como o manipulador- Esta iguaria tradicional é
denominada em castelhano como carne de membrillo, e
em catalão como confitura de codony. Em
castelhano os atrevimentos de namoro referem-se como pelar
la pava.
Quando
garoto, escolar, ainda na terra onde nascí, os lápis eram afiados
com umas afiadeiras que, maldosamente, tinham o mau hábito de partir
a ponta da mina. Os mais habilidosos aproveitavam as lâminas das
maquinetas de barbear paternas para afiar os lápis, arriscando-se a
cortas os dedos. Eram os únicos instrumentos de corte á nossa
disposição. Aos que lhes dávamos outras utilizações, próprias
das crianças que éramos.
Fazendo
uma vaquinha entre dois ou três colegas juntavamos os poucos
céntimos que tinhamos nos bolsos e, numa loja perto da escola,
compravamos um marmelo, comunitário. Com a lâmina cortavam-se
lascas, que se distrinuiam entre os “sócios”. Em cru e nem
sempre com a maturação completa, estas lascas eram muito ácidas,
astringentes, e as mastigar e engolir implicava um esforço a raiar
no massoquismo. Tal como o jogo do pião ou das bilas era uma
brincadeira de época.
E
as memórias sobre marmelos não se ficam por aqui. Em catalão, que
tem identica ao português a frase propiciatória para errar do UM
TIGRE, DOIS TIGRES, TRÊS TIGRES, existe uma armadilha de pronúncia
com marmelos, mas intraduzível. Reza assim LA TIA MARIA COLLIA
CODONYS, CODONYS COLLIA LA TIA MARIA, DE GENOLLONS. (*) Tinha que se
pronunciar, repetidamente, e muito depressa. Até que a língua se
atrapalhasse e em vez de codonys pronunciasse COLLONS.
Uma
brincadeira fonética própria da idade em que se inicia a conversa
apimentada. Corresponde á habitual pesquisa de palavras “reservadas”
quando se maneja um dicionário pela primeira vez. E, em geral, ali
não constam, para desconsolo do neófito.
(*)
em criança não captava a malandrice de a tia estar
ajoelhada enquanto colhia marmelos, que neste caso seriam “tomates”.
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