sexta-feira, 7 de julho de 2017

CRÓNICAS DO VALE - cap 11

EDIÇÃO ESPECIAL

Os derradeiros acontecimentos, ou mais propriamente sucessos de que sofreremos as consequências, deram uma machadada, que até pode ser de carácter final, aos projectos de conseguir organizar algum festival na freguesia de Vale do Pito. Sinto uma pressão interior para mudar o título desta espécie de crónicas para qualquer coisa como CRÓNICAS DO VALE.

Pode ser que esta ideia não seja a mais positiva, mas tampouco me satisfaz o insistir num festival morto antes de nascer, abortado se preferirem. Seja qual for a forma de encarar a situação é pertinente recordar, assimilar, que tudo não passava de uma brincadeira, que ajudou a oferecer, gratuitamente, uns bocados com boa disposição ligados a pensamentos e visões eróticas. A minha experiência me avisa de que é possível que alguns dos presentes saísse com tanto entusiasmo que, sem tardança, procurassem concretizar ao vivo e a cores as cenas que visualizaram mentalmente. Terão sido semelhantes às que conduziram às visões do trio da Serra dos Candeeiros.

Não esqueço aqueles cidadãos desta freguesia, e não só, que por se considerarem pessoas sérias, respeitáveis e respeitadoras da moral e bons costumes, rejeitaram tudo de imediato, em bloco. Além de terem acesso directo ao Reino dos Seus (deles) pode ser que após as próximas eleições, que é provável que ganhem os de costume, lhes ofereçam algum lugar onde receber remuneração sem suar.

Enquanto meditava e escrevia fui observando as movimentações das autoridades. Estão lá todos. É um fartote. E todos, a julgar pela gesticulação e movimentos labiais, consideram-se capazes de dar opiniões a ser tomadas em linha de conta. Só os da Judiciária e mais os da equipa de criminologistas, que se juntaram aí pela hora que antecede, é que não passaram cartão a todos os sabedores. Mas não julguem que estes se sentem diminuídos. São impermeáveis.

Cá vem os judiciários! 
- Boa tarde, Senhor Maragato, já nos apresentamos e, como sei que sabe, sendo o proprietário do local donde depositaram o cadáver aufere da primazia na tentativa de esclarecer esta morte. O que nos pode dizer, falando como nos romances, em sua defesa?. Mas acompanhando a pergunta com um sorriso amigável (nunca fiando!).

- Para os apontamentos que, sem dúvida, têm que fazer, digo que depois do susto que devem ter sentido aqueles homens que encontraram os despojos humanos, fui eu quem mais se surpreendeu. Não recordo ter ido, jamais, para aquele canto da propriedade. E, no meu entender, nunca teria enviado para ali uma equipa de desmatadores se soubesse da possibilidade de encontrarem esta surpresa. Tive outras razões, ou motivações, que me induziram a contratar esta brigada de operários. Os fogos que, anualmente, nos devoram as florestas e terras de cultura, além de causarem mortes que não deviam acontecer, fez despertar em mim os sentimentos cívicos e, principalmente, a necessidade de proteger o património familiar.


- Não tem uma ideia, mesmo que leve, de quem poderia ser o cidadão que vivia naquele corpo? 
- Até agora desconheço os detalhes ou características que os senhores já conseguiram observar. È possível que ao longo das horas os venha a conhecer pelos noticiários, sempre ávidos de casos com potencial de morbidez e mistério.  -Só querem vender papel e minutos de audiência, enquanto nos dificultam a vida zumbindo como moscas brejeiras à nossa volta, sentenciou o que devia ser de graduação mais alta entre os polícias e inspectores.

 -Voltando ao meu discurso afirmo que, por enquanto, nem sequer sei se se trata de um homem ou de uma mulher, e que possível idade teria enquanto vivo, ou quanto tempo terá decorrido entre a sua morte e o terem encontrado os restos. Nem tenho a ideia de ter sido uma morte natural ou provocada por outrem. Digamos, se houve crime. Vou poupar-lhes a pergunta seguinte: apesar de viver nesta aldeia, e conhecer uma boa percentagem dos seus habitantes, não creio que este corpo pertença a algum dos cidadãos aqui residentes. Não me consta que se fale nalgum desaparecimento súbito. Os que saíram, em migração para o estrangeiro ou para procurar melhor vida nas cidades, habitualmente comunicam periodicamente com os familiares que cá ficaram. Mas de isto tudo, e mais, já vos terá informado o Presidente da Junta de Freguesia, que embora sendo uma pessoa reservada, como pertence a quem ocupa este pelouro, tem mantido alguns diálogos comigo e nunca referiu nada que se pudesse ligar com este sucesso.


- Quanto a mim, este crime, se o for, e penso existirem fortes indícios de o ser, pois de outro modo não teriam -caso os envolvidos fosse mais do que um- atirado este desgraçado para uma cova, como quem de desfaz de um eletrodoméstico fora de uso. E este vício de tornar os terrenos alheios em lixeiras é, como sabem, um hábito muito geral. 
- Eu pesquisaria na Vila, na Sede de Concelho e nas terras com um número de habitantes suficiente para ter probabilidades não só de velhacarias como de que algum cidadão tenha observado alguma coisa a que não prestou importância mas que, se inquirido com saber profissional, pode vir à superfície. Eu ficarei de olhos e ouvidos atentos e com vontade de poder ajudar para esclarecer esta situação.

- Senhor Maragato, agradecemos a sua colaboração espontânea. Foi um prazer o ouvir, e pergunto, com curiosidade profissional. Alguma vez pertenceu a um corpo de investigação? Teremos que ver a sua ficha com atenção. Mas digo isso com respeito, e, mais uma vez, agradeço a sua colaboração.



No capítulo seguinte tentaremos saber mais pormenores

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