Temos
máquina. E alguma correspondência.
E
UMA NOTÍCIA ALARMANTE !!
Bom dia
patrão Maragato. Temos novidades, e espero que boas, acerca da
máquina trituradora. Ontem
indicaram-me um sujeito deste concelho que tem um equipamento destes
e que o aluga a quem necessitar. Falei com ele e não quis ajustar
preço antes de fazer uma demonstração na sua propriedade. Mais
disse que a sua máquina come tanto e tão depressa que é difícil
ter material preparado para ela. O costume é fazer o trabalho
possível e partir para outro cliente. Volta quando o avisarmos, e
assim anda de um lado para outro. Não cobra as deslocações; mas
deve incluir no preço da hora trabalhada, se não ia à falência.
Dada a urgência disse-lhe que, caso fosse possível convinha que
viesse esta tarde.
Entretanto
avançaremos no trabalho de desmatagem e corte das árvores mais
perigosas. Já me esquecia. Disse-me que habitualmente os seus
clientes depois de feito o trabalho de trituração, espalham aquilo
pelo terreno a fim de adubar e evitar que as terras não seqem tanto
ao sol de verão. Com as chuvas integram-se na terra e é muito
favorável. Creio que é tudo.
Excelente
senhor Ernesto. Eu não conseguiria fazer melhor. Aguardaremos para
ver como se comporta esta máquina tão voraz. Enquanto continuem no
trabalho em curso. Eu vou tratar de alguma correspondência.
Ainda bem que
o “primo” Leonardo teve a ocorrência de me dar o seu endereço
de correio electrónico, pois que as coisas se complicaram no sentido
de ter o local apresentável, mas por outro lado parece que estamos
num bom caminho. E antes deste encontro tenho que falar, desta vez a
sério, com a Luísa e o Bruno,
nossos filhos.
Primo
Leonardo. Desde ontem a situação na residência de Vale do Pito
alterou-se. A brigada de trabalhadores, que para os meus adentros
chamo de Brigada Victor Jara, compareceu em força e já estão com
as mãos na massa na desmatagem rasteira e no corte das árvores que
cresceram demasiado perto do caminho de entrada para a propriedade, e
à volta da casa. Não imaginam a barulheira e poeirada que existe
neste sitio. E ainda não é nada do que se espera, pois deve estar a
chegar uma máquina trituradora,
montada sobre uma camioneta, que vai transformar matos e ramagens em
pequenas aparas biodegradáveis, que servirão para adubar as
terras e refrear a erosão que as chuvas causam quando o terreno
está nu.
Por isso
tenho que vos pedir uns dias de espera até ser mais conveniente e o
ambiente mais sossegado para vos poder receber condignamente. Todo o
processo de venda da propriedade ficará congelado, para todos os
pretendentes, e antes de tomar qualquer decisão vos ouvirei
atentamente e com agrado. Evidentemente a família tem prioridade.
Um abraço do
Primo José Maragato
E agora para
vós, filhos:
Queridos
Luísa e Bruno.
Desde muitos
anos atrás que ambos vos manifestastes pouco, ou nada, interessados
em vir a receber este casarão. Entendo, sem problemas, que a vossa
vida foi orientada noutros hábitos e necessidades. E se tivésseis a
noção do que custa manter esta casa e seu terreno envolvente, o
mais provável é que gritásseis, bem alto, livre-se deste ogre
devorador! E não conheceis da missa a metade.
Entre as
despesas caseiras, de manutenção, de um mínimo de pessoal, que
fica resumido a uma senhora, já com meio século às costas, que se
encarrega da cozinha, mesmo que a maior parte das refeições as faça
fora, de tratar das minhas roupas e de uma limpeza sumária nas
divisões que habitualmente ocupo, que são menos da décima parte do
total. Está disposto que duas vezes por ano, a fim de que tudo não
apodreça, tenha a ajuda de duas raparigas para dar uma volta geral.
Tenho, a nosso encargo, um caseiro a tempo inteiro. Todos eles
descontando, eu, para a segurança social.
Juntem a isso
o IMI, o IRS, os seguros de acidentes do pessoal, de incêndios e
catástrofes, a electricidade e as botijas de gás, mais os materiais
consumíveis do dia-a-dia e as reparações que o caseiro não pode
resolver, e despesas imprevistas que sempre surgem, e então os
vossos olhos se abririam de pasmo. Por isso fiz uma sondagem de
mercado para ver se esta propriedade teria aceitação no mercado
dito imobiliário. E apareceram interessados, entre eles um grupo de
primos da vossa falecida mãe, que pretendem criar uma espécie de
sociedade par comprar isto. (Nem imaginam no vespeiro em que se
meteriam) Querem visitar a casa e a propriedade, possivelmente
dentro de 8 a 15 dias. Junto cópia da carta que lhes enviei hoje
mesmo. Até agora foram só conversas telefónicas.
Preciso de
saber a vossa opinião para poder avançar ou recuar. E até gostaria
que no dia da “visita de estudo” da família Sousa, pudesse vos
ter ao meu lado. Não me sentiria como esbanjador dos bens
familiares. E seria uma oportunidade de reverem os dias da vossa
infância.
Beijos do pai
A missiva
segue para os vossos, dois, endereços de correio electrónico.
NOTÍCIA
DE ÚLTIMA HORA
As
duas horas que antecedem este anexo tem sido, inesperadamente,
insólitas, alarmantes e exaustivas. Neste momento só posso dizer
que nos trabalhos de desmatagem, e já nos limites do nosso terreno,
encontraram um corpo, practicamente desprovisto de roupas, abandonado
numa pequena cova e dando mostras de ter sido pasto de animais
necrófagos, desde corvos a cães abandonados e raposas. A GNR
estabeleceu um perímetro de segurança e aguardam os peritos
forenses e agentes da Judiciária.
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