Mas são
pouco prováveis as mudanças
Ao
longo deste período de retracção do mercado consumidor, não só
devido à reclusão das famílias no seu espaço de habitação mas,
sem dúvida, também à merma do numerário disponível, conduziu a
novos hábitos e à restrição de despesas supérfluas, que se
tinham instalado como sendo indispensáveis, quase que ao nível de
fundamentais. E devem ter sido muitas as pessoas que verificaram da
falsidade desta tensão consumista.
Dá
para pensar se, em tão poucos meses, se compararmos com o tempo que
foi necessário para alterações de conduta anteriores, se aceitou
como válida a ponderação cuidadosa de como dissipar sem freio era
aquilo que, de facto, se desejava retomar como algo fundamental
quando as nossas vidas pudessem entrar numa nova era.
Todos
assistimos a um progressivo e lamentável declínio do comércio
tradicional. Da morte sem renascimento de muitas lojas de porta para
a rua das quais nos tínhamos tornado fieis clientes. Lojas onde nos
atendiam com demonstrações de afecto, fruto dos anos de relação
individual, nem sempre profissional. Já ali tínhamos acompanhado
pais e familiares adultos quando estes iam às compras.
Neste
pequeno comércio, pessoal mesmo quando existiam alguns, poucos,
empregados já veteranos, entrávamos com a quase certeza de poder
encontrar o que necessitávamos. E , no caso de não ser possível,
já contávamos com que nos dessem uma orientação alternativa, sem
se preocuparem do facto de ser um estabelecimento concorrente.
Com
o decorrer dos anos, o visual dos percursos urbanos habituais
foram-se alterando paulatinamente, e hoje pouco resta daqueles locais
onde entrávamos quase como na nossa casa. Além dos taipais, que
denotam o fecho impreterível, proliferam novas utilizações, que em
geral não nos interessam e que, com frequência, tem uma vida curta.
A
força da publicidade e da ostentação já tomou pé, entre nós, a
partir dos anos '60, o início de um novo esquema de comércio
conjunto, onde se partilham corredores que pretendem semelhar-se a
ruas. Assim entraram os primeiros “centros comerciais”, que foram
pioneiros antes de avançar, exponencialmente, para o modelo
maior. Muitos cidadãos inexperientes no comércio, decidiram tentar
a sua sorte em lojas de poucos metros quadrados. A maior parte destes
atrevimentos em assuntos onde a inexperiência paga-se cara,
fecharam. Além disso as grandes marcas não confiavam para ali se
instalarem. Sabiam, por observação de sucessos alheios, que era
fundamental ter uma grande área de exposição e atendimento de um
novo tipo de clientes. E que era necessário ir cativando e moldando
o gosto e as preferências do cliente moderno ou modernizado à
força.
Estas
e outras razões conduziram a uma degradação e abandono rápido,
dos mini-centros comerciais e, possivelmente pela influência da
experiência nos USA, e com a experiência já instalada noutros
países europeus, se avançou para as grandes superfícies. Nestas
estruturas de captação de clientes aplicam-se tácticas e
estratégias totalmente diferentes das do comércio tradicional, já
quase extinto, salvo uns raros e pequenos resistentes históricos.
O
atendimento, apesar das muitas indicações da gerência para o lhe
dar um toque pessoal, derrapou para a indiferença, dada a grande
rotatividade dos contratados e das baixas remunerações, que se
pretendem incrementar através de incentivos dependentes das vendas
conseguidas.
Um
sintoma diferencial entre o antigo comércio e o actual é o modo
como é abordado o cliente, mal entra no estabelecimento, por uma
empregada/o que nunca tinha visto na vida, e diz uma frase do seu
caderno de conduta: Em que
a/o posso ajudar? A nossa
reacção pode ser desde o virar para outro lado ou afirmar,
simplesmente, quero dar
uma vista de olhos, e se for preciso já pedirei ajuda, evitando
dizer, cruamente, ponha-se
a andar e não me mace.
Ao
iniciar este escrito tinha uma miragem de possível regresso, mesmo
que muito parcial e restrito, ao comércio das loja de porta aberta
para a rua. O meditar com o passado e o presente levou-me a concluir
que a imensa maioria dos clientes actuais, dado que os velhos já
estão descartados, mortos ou “invisíveis”, cresceram e chegaram
a adultos (?) circulando pelas grandes superfícies. São os seus
templos para consumo e não será a pandemia que fará recuar a
sociedade.
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