segunda-feira, 18 de novembro de 2019

MEDITAÇÕES – É muito complexo




ENTENDE-SE O QUE ACONTECE, AGORA, NAS ESPANHAS?

Penso que, para muitos portugueses, mesmo os ilustrados, seja difícil mergulhar na situação actual da política espanhola (leia-se de idioma castelhano) porque, a meu entender, seria necessário recuar mais de uma centena de anos na história vivida além da raia de Elvas/Badajoz, e das outras fronteiras terrestres com o território daquele (para mim) ofensivo dos nuestros hermanos.

Tentarei justificar esta referência despectiva que é usada com tanta frequência pelos escribas dos dois lados, mas com sentimento totalmente oposto, uns com soberba e senhoria e os outros com desprezo. Ambos estão errados.. Muito cedo, já com 12 anos, percebi que o “azar” que qualquer português sente em relação aos castelhanos, que eles mesmo teimam em procurar confundir com o genérico españoles, é de tal magnitude e presente na totalidade da população, que só um cego, imbuído da sua espanholidade ferrenha, não captaria  a primeira vez que ouvisse ou lesse -sempre entre comas- esta declaração de irmandade, o quão negativa é vista deste lado.

Para tentar entender o eterno, ou pelo menos já histórico, diferendo existente entre catalães a “espanhois=castelhanos” temos que recuar séculos e admitir a triste realidade de que os que são mais quantitativamente e agressivamente são os que procuram tirar aquilo que os perdedores consideram ser a sua individualidade. Neste caso concreto é a sua língua e, por arrastamento, o desejo de ser tratados de modo diferenciado, mas preferente, em relação aos povos que os rodeiam e “invadem”. Convêm tentar a similitude entre o sentir-se e ser português de alma e coração como um bem comum que não se quer perder, e que também existe entre os catalães de raiz. Que pela sua capacidade industrial e comercial destacam-se de outras regiões peninsulares em situação económica mais débil.

A zona de fala castelhana herdou, desde a expulsão dos muçulmanos, uma distribuição de terras “reconquistadas” muito medieval. Entregaram-se grandes espaços, mesmo enormes, aos chefes das forças, practicamente mercenárias, que lutaram contra os ocupantes. -Em muitas ocasiões tinham-se colocado, depois de ajustar o pagamento, do lado dos “infiéis” contra as tropas do Rei; mas isso são pequenos pormenores, com a sua importância relativa- Como a coroa sempre, lá e cá, estava com os cofres vazios e vivendo com empréstimos dos banqueiros judeus, para satisfazer os capitães a coroa lhes entregava a propriedade, em regime perpétuo, dos terrenos “recuperados”, incluindo a gleba que os devia trabalhar. Daí surgiram os latifundiários dos dois lados da fronteira.

E nestes latifúndios proliferaram os sem terra, os jornaleiros que eram seleccionados na praça da terra pelo Senhor ou seu representante. Enquanto persistiu o Império Espanhol nas Américas, este excedente de população, sem eira nem beira, embarcava para o novo mundo. Mas quando terminou, com a “libertação” de Cuba pelos amigos “desinteressados” dos Estados Unidos, o povo mal alimentado e pobre de pedir, teve que rumar para as zonas da península onde podia alugar os seus braços a outra espécie de exploradores.

Dado que a industrialização da dita Espanha foi muito lenta, comparativamente com a Europa ocidental, as zonas onde podiam contratar gente quase todos rústicos, mas com vontade de trabalhar, viver e criar família, estavam no Norte (Astúrias e País Vasco) e Nordeste (Catalunha).

E aqui se inicia o filme actual:

Carecendo de mão de obra intensiva em diversos sectores, entre eles a têxtil, mecânica, construção e obras públicas. O fluxo de migrantes internos foi notável, já desde início do século XIX. E como inicialmente chegaram mais homens do que mulheres, e os homens da Catalunha tinham sofrido importante desbastes das guerras de Marrocos e Cuba, havia excesso de mulheres. E começaram os matrimónios mitos -os híbridos ou mestiços como agora denominam os da VOX- Esta integração, lenta mas efectiva e tranquila, continuou até os dias de hoje. E, curiosamente, os rapazes solteiros catalães ficaram muito prendados pelas raparigas de raiz castelhana, andaluza, murciana, ou estremenha, que se mostravam mais desempoeiradas e vistosas do que as suas vizinhas. Daí que a miscigenação rumou para o outro sentido. Mas sempre entre os de origem catalã e os outros/as.

Esta convivência tácita, mesmo que não totalmente geral, foi contrariada, propositadamente ou impensadamente, pelas autoridades centralistas quando teimaram em tentar apagar a língua local (a exemplo do que fez a monarquia francesa obrigando a uma língua “franca” mas exclusiva, para todas as populações autóctones do hexágono) Só que os catalães, que nem por isso são propensos a brigas, mostraram ter um forte apego aos seus costumes e língua, incluído o direito civil que estava em vigor naquela área.

O mais que as sucessivas ditaduras ou governos centrais de índole monárquica conseguiram foi que a grande maioria da população da Catalunha se tornasses bi-lingue. EXCEPTO a classe dos burgueses endinheirados, que para garantir os clientes das zonas castelhanas, além das ex-colónias de ultramar, e criar ou incrementar os conhecimentos e laços com os decisores de Madrid, socializaram com todos, desde contínuos até ministros, e optaram por se castelhanizar, inclusive no seio das suas famílias, nas suas casas e escolas para descendentes.

Como o ter poder económico implica ser esperto, estes “castelhanos-novos”, tal como os judeus falsamente convertidos ao cristianismo ou catolicismo, mantinham, por trás do pano, contacto com os insubordinados catalanistas. Até hoje. Foram estes os geradores de uma quinta coluna que incitou a adversão e até ódio, dos autóctones não só para o poder central e as autoridades, sempre mais ou menos repressivas, que levaram para esta zona, mas genericamente para todos os “castelhanos”, Ah! Excepto daqueles seus conhecidos e já, em muitos casos, com laços de sangue. (Quem conviveu e convive com esta situação de calma efectiva entre co-cidadãos a qualifica, como mínimo, de curiosa e favorável)

E tão bem os burgueses manobraram e venderam o seu país natal que perduram, por trás do pano, até hoje. São eles que colocaram o Puigdemont, Torra, e anteriormente Pujol e Más, na Generalitat para “negociar” os interesses da Catalunya, misturando propositadamente e com todo o cinismo, com os seus interesses de grupo, incluídos industriais e banqueiros.

O povo, como sempre acontece, foi e continua a ser manipulado por quem sabe e tem os cordéis da comunicação social na mão. Antes eram os jornais e emissoras de radio, agora são as televisões e as redes sociais, que por se mostrarem anónimas não tira que sejam manipuladas.

E aqui deixo um excessivamente longo relato do que acontece em Espanha. Insisto em que é demasiado longo porque hoje ninguém está disposto a ler mais de seis linhas de texto sobre um tema sério.

Deixo para trás a posição ambígua dos socialistas do PSOE, que desde o pacto pós-Franco perderam o rumo histórico.

Sem comentários:

Enviar um comentário