segunda-feira, 22 de julho de 2019

O DIVO NACIONAL


IL DIVO

Já não recordo a razão que nos ofereceu, na semana precedente, nos oferecessem, com algum destaque, e que na internet também foi possível completar, a recordação enfática do filme de PAULO SORRENTINO, intitulado IL DIVO, onde se retratam aspectos da vida, obra e a longa presença política de GIULIO ANDREOTTI em primeiro plano da política italiana.

Sem que possamos colocar o nosso actual Presidente da República como um decalque do italiano DIVO, encontramos pontos comuns ou pelo menos semelhantes, entre as duas personagens.

A faceta mais destacada na actividade pública do actual Presidente da República é, sem dúvida, a forte e continuada, mesmo insistente, exposição pública, quase que exclusivamente no sentido afectivo, e de lançar uns “bitates”, mas sempre insistindo na sua promoção pessoal no domínio da popularidade, aparentemente inocente. Parece que possua o dom da ubiquidade. Tão depressa aparece num sitio como noutro bem distante. Faz lembrar a referência dos coelhos na sua cópula, com a frase batida de Vai ser tão bom, não foi?

Os percursos pessoais e políticos de Andreotti e de Marcelo Rebelo de Sousa tampouco são idênticos, longe disso, mas tem características coincidentes. Ambos, indiscutivelmente pertencem à direita mais conservadora e com períodos de vida ligados à autoridade em partidos de carácter induvitávelmente conservadores, mesmo que se intitulassem com adjectivos menos claros (1).

Ambos pessoas de tempera católica. Mais acentuada no caso de Andreotti, que era devoto de missa diária e colaborador efectivo com a zona mais conservadora e ligada à economia italiana, mais concretamente vaticana, fosse de modo evidente ou subterrâneo. O actual Presidente de Portugal não é tão transparente, por excesso, como Andreotti. Mas não deixa de insistir na sua decisão, esforçada, de ganhar o estatuto de Divo nacional. Mantendo um contacto respeitoso e convincente com a Igreja Católica. Com a sua táctica, que mantêm insistentemente, conseguiu esbater o estigma de pertencer a uma casta nitidamente conservadora e unida ao ideário do Estado Novo de Salazar. 

A característica nacional dos portugueses é a de não serem obcecadamente rancorosos. Isso facilita a convivência entre sectores com convicções diferentes. Facto que, sem dúvida, contribui para a noção de que este é um povo intrinsecamente pacífico e que, se não decide perdoar, pelo menos aceita as opiniões dos outros, mesmo que não as partilhe, a fim de ter uma vida social mais tranquila.

Esta característica dos portugueses, que além dos Pirenéus, nos dá o direito a ser vistos como “pobretes mas alegretes”. Se o ouvimos em boca de forasteiros nos soa a ofensa, ou a que é uma qualificação muito perto do despeito, provocado maldosamente ao nos apontar de ser Portugal um País pobre. E ninguém gosta que lhe sejam publicitadas doenças ou sintomas de diminuição em alguma escala comparativa de valores.

É mais do que suficiente saber “o que a casa gasta”. E mais triste o não sermos capazes de encontrar mais justificações, aceitáveis, para aceitar o nosso atraso na Europa. Bem tentam, os pretensos promotores do orgulho nacional, enaltecer feitos históricos, quase sempre adoçados, e as victórias em desportos, muitas vezes individuais, mas com direito sem contestação, a bandeira e hino nacional. Mas todos sabemos, mas engolimos, que nada disto compensa a imagem real que temos perante o exterior, e muito menos aliviar as dificuldades do orçamento familiar.

Aquilo que nos mantêm na cauda é, como todos sabem, o conluio existente, embora com algumas mudanças nas personagens, entre o poder estatal e os bem situados na economia nacional. Uma classe social nova, herdeira da burguesia do século XVIII, e que constitui o substituto evolutivo da anterior nobreza.

E a cidadania que vegeta nas camadas com menor poder de compra como reage? Descartando um reduzido sector de imaginários activistas, o pessoal com o futebol e algum circo, lá se vai aguentando. Pelo menos tentam manter a cabeça à tona da água, nem que para isso tenham que viver de fiado. Como aliás acontece com a economia nacional. Daí que não consigamos escapar de sermos apontados como pobretes mas alegretes.

E o nosso Divo ajuda, e até promove a festa, nomeadamente quando deixa que alguém, na desgraça e com pouco brio pessoal, se encoste ao seu ombro para se lamentar, e se deixe fotografar para aparecer na Tv e nalgum jornal colaborador do capital, por este ser o dono.

(1) Todos os partidos ditatoriais na Europa do séc XX, tinham uma nomenclatura onde incluíam termos como Social, Socialista e Popular, e  até Democrata.

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