IL
DIVO
Já
não recordo a razão que nos ofereceu, na semana precedente, nos oferecessem, com algum destaque, e que na internet também foi
possível completar, a recordação enfática do filme de PAULO
SORRENTINO, intitulado IL DIVO, onde se retratam aspectos da vida,
obra e a longa presença política de GIULIO ANDREOTTI em primeiro
plano da política italiana.
Sem
que possamos colocar o nosso actual Presidente da República como um
decalque do italiano DIVO, encontramos pontos comuns ou pelo menos
semelhantes, entre as duas personagens.
A
faceta mais destacada na actividade pública do actual Presidente da
República é, sem dúvida, a forte e continuada, mesmo insistente,
exposição pública, quase que exclusivamente no sentido afectivo, e
de lançar uns “bitates”, mas sempre insistindo na sua promoção
pessoal no domínio da popularidade, aparentemente inocente. Parece
que possua o dom da ubiquidade. Tão depressa aparece num sitio como
noutro bem distante. Faz lembrar a referência dos coelhos na sua
cópula, com a frase batida de Vai ser tão bom, não foi?
Os
percursos pessoais e políticos de Andreotti e de Marcelo Rebelo de
Sousa tampouco são idênticos, longe disso, mas tem características coincidentes. Ambos, indiscutivelmente pertencem à direita mais
conservadora e com períodos de vida ligados à autoridade em partidos de
carácter induvitávelmente conservadores, mesmo que se intitulassem
com adjectivos menos claros (1).
Ambos pessoas de tempera católica. Mais acentuada no caso de
Andreotti, que era devoto de missa diária e colaborador efectivo com
a zona mais conservadora e ligada à economia italiana, mais
concretamente vaticana, fosse de modo evidente ou subterrâneo. O
actual Presidente de Portugal não é tão transparente, por excesso,
como Andreotti. Mas não deixa de insistir na sua decisão, esforçada,
de ganhar o estatuto de Divo nacional. Mantendo um contacto respeitoso e convincente com a Igreja Católica. Com
a sua táctica, que mantêm insistentemente, conseguiu esbater o
estigma de pertencer a uma casta nitidamente conservadora e unida ao
ideário do Estado Novo de Salazar.
A característica nacional dos
portugueses é a de não serem obcecadamente rancorosos. Isso facilita a
convivência entre sectores com convicções diferentes. Facto que,
sem dúvida, contribui para a noção de que este é um povo intrinsecamente pacífico e que, se não decide perdoar, pelo menos aceita as opiniões dos outros, mesmo que não as partilhe, a fim de ter uma vida social mais tranquila.
Esta
característica dos portugueses, que além dos Pirenéus, nos dá o
direito a ser vistos como “pobretes mas alegretes”. Se
o ouvimos em boca de forasteiros nos soa a ofensa, ou a que é uma
qualificação muito perto do despeito, provocado maldosamente ao nos
apontar de ser Portugal um País pobre. E ninguém gosta que lhe sejam publicitadas doenças ou sintomas de diminuição em alguma escala
comparativa de valores.
É mais do que suficiente saber “o que a casa gasta”. E mais triste o não
sermos capazes de encontrar mais justificações, aceitáveis, para
aceitar o nosso atraso na Europa. Bem tentam, os pretensos promotores do orgulho nacional, enaltecer feitos
históricos, quase sempre adoçados, e as victórias em desportos,
muitas vezes individuais, mas com direito sem contestação, a
bandeira e hino nacional. Mas todos sabemos, mas engolimos, que nada
disto compensa a imagem real que temos perante o exterior, e muito menos aliviar as dificuldades do orçamento familiar.
Aquilo
que nos mantêm na cauda é, como todos sabem, o conluio existente,
embora com algumas mudanças nas personagens, entre o poder estatal e
os bem situados na economia nacional. Uma classe social nova,
herdeira da burguesia do século XVIII, e que constitui o substituto evolutivo da
anterior nobreza.
E
a cidadania que vegeta nas camadas com menor poder de compra como
reage? Descartando um reduzido sector de imaginários activistas, o pessoal com o futebol e algum circo, lá se vai aguentando. Pelo menos tentam
manter a cabeça à tona da água, nem que para isso tenham que viver
de fiado. Como aliás acontece com a economia nacional. Daí que não
consigamos escapar de sermos apontados como pobretes mas
alegretes.
E o nosso Divo ajuda, e até
promove a festa, nomeadamente quando deixa que alguém, na desgraça e
com pouco brio pessoal, se encoste ao seu ombro para se lamentar, e
se deixe fotografar para aparecer na Tv e nalgum jornal colaborador
do capital, por este ser o dono.
(1) Todos
os partidos ditatoriais na Europa do séc XX, tinham uma nomenclatura
onde incluíam termos como Social, Socialista e Popular, e até Democrata.
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