sexta-feira, 9 de março de 2018

CRÓNICAS DO VALE – Capítulo 18




O relato interrompeu-se no Capitulo. XVII, em 20 de Julho do 2017. Tentar resumir os acontecimentos descritos desde início, sendo possível que aqueles que estejam interessados possam ler tudo na “hemeroteca” do Google, creio ser desnecessário. Apesar disso e sem recorrer à estafada citação de que aconteceram muitas coisas, até porque nem sequer foram muitas, vou retroceder um pouco.

No capítulo anterior a este “interregno”, numa reunião em Coimbra entre o José Maragato e os advogados Vítor Meneses e Raul R. Rodrigues, deu-se como muito provável que o cadáver encontrado, e já identificado, nos terrenos do palacete familiar dos Maragato no Vale, deve ter sido assassinado, ou teve morte acidental, no decorrer de uma festa-bacanal nalgum local sito, provavelmente entre o Buçaco e o Caramulo. O morto, antes de o ser, era um homossexual que exercia, civilmente, como cabeleireiro e como travesti vocacional, dando espectáculos privados e participando, no Carnaval, em desfiles.

De todas formas tudo estava numa nuvem, a não ser para os directamente implicados., que continuavam a ser desconhecidos de Maragato e seus amigos. Os três “conspiradores” decidiram agir com muita cautela em função do pressuposto de que o esquema que imaginavam, caso coincidisse com a realidade, o mais certo é que tocaria em grupos sociais muito poderosos, não só no âmbito social como no económico e político.

Ao se encontrar com a Isabel, já esposa legal pois que aproveitaram a estadia em Coimbra para formalizar o estado, bem maduro, de ambos, lhe disse que tinham poucos minutos, no máximo meia hora, para arrumar um rodinhas para cada um, que deixariam o resto da bagagem no quarto uma vez que ficaria por conta deles. A Isabel tinha que, com um telefonema, prolongar a situação da sua ajudante como gerente substituta do salão, contando somente que viajariam para Lisboa e voltaria quanto antes. Beijinhos da praxe e adeus.

Segundo disse o José viajariam, de comboio, para Lisboa e ali se encontrariam com os dois filhos, Luísa e Bruno, até agora órfãos de mãe e já com uma madrasta a caminho.

- Enquanto as personagens principais viajavam pela Linha do Norte, confiando, sem demasiada fé, em que não houvesse algum deslizamento de terra ou outras eventualidades, mais ou menos costumeiras nesta importante via férrea, espinha dorsal das comunicações lusitanas, os seguidores podem visitar as instalações sanitárias, lavar cuidadosamente as suas extremidades superiores, e na cafetaria de bordo beber um gintónic, ou um café Expresso do Oriente. (Não esqueçam que também temos um crime entre mãos. Só nos falta a Gata Cristas)

O percurso ferroviário não se fez muito longo porque a conversa entre ambos, num puxa-daqui-puxa-dali os entreteve. E sempre tudo centrado em temas sérios, pois que de fosquinhas e apalpões já tinham a sua dose esgotada, a não ser quando decidiam brincar a fingir de jovens entre lençóis ou sobre a mesa da cozinha, ou donde calhasse, que gaita! Então não tinham direito a brincar? Brincar até morrer!

- Zé, penso que já estou ao corrente de tudo o que tem acontecido ao longo dos últimos meses. Pelo menos das coisas mais importantes. Mesmo que tenhas guardado alguns pormenores para os sacar na altura que entendas ser conveniente. Mas esta reunião súbita com os teus filhos tem agenda estruturada ? (esta é para mostrar que a Isabel lê alguns jornais e revistazecas).

- De facto eu tinha este encontro programado, pelo menos em mente, como a tal LEI MENTAL da nossa História Pátria, e tinha como peça de fundo a nossa relação, que entretanto se oficializou sem a presença dos filhos, o que pode ser tido como uma falta de respeito com eles, e que ambos temos que nos esforçar para neutralizar. Não quero, de modo algum, criar atritos e quezílias irresolúveis entre nós, ou seja tu e eu, e os meus filhos.

Todavia os recentes acontecimentos no perímetro da digamos quase casa solarenga na Vila, tampouco os posso manter escondidos deles, até porque não tendo, oficial ou oficiosamente, nada com isso, a não ser o ter sido descoberto um cadáver nos meus terrenos, de cuja morte não tenho a mais mínima responsabilidade, não deixo de estar referido pelo menos como dono do terreno. Tenho, ou temos pois que vamos em par, que procurar que esta porcaria não nos salpique. Tanto eu como os meus amigos de Coimbra, não temos a mínima dúvida de que esta história cheira muito mal, é uma porcaria que nos pode prejudicar.

- Mas tu dizias-me, em muitas ocasiões, que tinhas muitos e bons conhecimentos nas altas esferas. Não contas com isso? Se fosses um desconhecido …

- Certo. Mas aqueles que supomos podem estar envolvidos neste crime e na sua desastrada ocultação, é muito provável que tenham assessorias de alto gabarito, e que, caso se vejam em risco de aparecer em cena, tentarão passar o bestão a outro. E neste sorteio eu tenho muitos números, demasiados, que não comprei.

- Já entramos na estação da Expo. Aquela coisa tão bonita que serve, em primeira função, para possibilitar constipações e até pneumonias aos que tenham a ousadia de aguardar nos seus cais. E o perigo é maior se ficarem de boca aberta apreciando a ousada arquitectura do seu afamado criador.

- Não vale a pena que procures neste cais, pois fiquei com os filhos que nos encontraríamos na estação da padroeira dos dentistas e das cáries.´uma tal de Santa Apolónia, e não Polónia dos polacos. Dali iremos jantar num local que eles decidam. Lembra-me de puntualizar que não quero entrar num dos antros de moda onde brincam às cozinhas de autor. Fui criado com travessas fartas e estou velho para entrar em novas modas.

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