Isabel,
tem calma!
Agora
que parei “para respirar” verifico de que o resto dos passageiros
se mantêm mudos e quedos. Isto leva-me a pensar que entrei com
excessiva vontade de gerar confiança e que eles são ovos de outro
ninho. Que as suas vidas, apesar de mais curtas do que a minha, pois
são bastante mais novos, tem seguido percursos muitíssimo
diferentes do meu. Estou aborrecida comigo mesma. Fui burra sem
desculpa, e tanto à vontade quis mostrar que os afastei,
possivelmente por uma boa, ou mais concretamente má, temporada.
Tenho
idade e experiência mais do que suficiente para saber que nem todas
as pessoas aceitam, instintivamente, descer dos seus pedestrais. Os
enteados que nos acompanham são ambos possuidores de cursos
superiores e eu, sem me envergonhar, criei o meu mundo, a partir do
quinto ano do liceu, lavando cabeças num cabeleireira de vão de
escada e ir galgando degraus com o meu esforço e interesse.
Estou
ciente, farta de saber como se diz, que aquilo que estudamos e que
tínhamos que provar saber em exames, fosse na quarta classe, no
segundo ou no quinto ano do liceu, que foi onde eu parei, hoje, que é
o tempo dos doutores, ou falsos doutores, são desprezados aqueles
que ficaram nas bases. Adquiriram uns conhecimentos que hoje são
vistos como sem préstimo. O que não esconde que se podem encontrar
jovens, já com o primeiro e até segundo ciclo actuais, que se
descontarmos o domínio que têm na manipulação de telemóveis,
tablets e computadores, a sua bagagem de cultura geral é muito
inferior à que nos era fornecida anteriormente, inclusive no nível
da primária.
Todos
tivemos oportunidades de conhecer chefes de repartições cujo
diploma de estudos era do quinto ano. Hoje são todos doutores, ou
pelo menos exigem ser tratados com esta categoria. Por isso o meu
comportamento foi muito atrevido e excessivamente descontraído.
Entusiasmada com o encontro esqueci que as mudanças sociais por
vezes são menos profundas do que imaginamos. Que a democracia social
ainda não cristalizou. Como podia pensar, se pensasse, que de
repente iríamos comer todos do mesmo prato, eu
e aqueles doutores?
De
facto sou mesmo burra e nem sequer aplico as regras que imponho nos
meus estabelecimentos. Se as empregadas, e também eu, damos o
tratamento de doutoras a troche-moche, e raramente a dama cameliada
avisa que não tem este canudo. Ou, em substituição, tratamos
muitas parolas endinheiradas por madama,
vou eu e penso que, sendo uma madrasta recente, posso entrar no seio
destas pessoas. Se as coisas correrem bem será preciso aguardar
algum tempo.
Portanto,
Isabel, vamos ter calma e atribui o teu silêncio a uma pontada de ar
que apanhaste na janela aberta quando te sentias afogueada.
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