sexta-feira, 9 de agosto de 2019

MEDITAÇÕES - Pratos típicos




AS ESTIMADAS SARDINHAS ASSADAS!!!!

Cada povo traz sedimentos na sua mente de uma série de preferências que, em muitos casos, não conseguem manter a sua simpatia ou opção instintiva quando confrontadas com os factos que, as mesmas opções pessoais, possam ser “desqualificadas” por quem apresenta argumentos que as conduzem a ser rejeitadas.

Neste apontamento de hoje sofre dos condicionamentos que hoje me afectaram, circunstâncias que não interessa especificar. O tema fica circunscrito à culinária tradicional, que por ser característica da população de uma determinada área e influenciada, desde muitos anos atrás, pela acessibilidade de certos alimentos, e das técnicas de cozinha que estavam disponíveis. Tentar fazer um apanhado extensivo sobre os pratos regionais mais afamados seria uma tarefa gigantesca. E quando se pretendesse valorizar, segundo os critérios da cozinha normal entre nós, sem subir aos píncaros da alta cozinha e cozinha “de autor”, nos depararíamos com a necessidade que os nossos antepassados, mesmo recentes, tinham para se abastecer e conseguir que na cozinha se preparassem alimentos que hoje quase ficaram esquecidos.

Parece óbvio que não citaremos extremos tais como o prazer que certos povos tem comendo larvas de insectos, ou mastigando alguns no estado adulto mas após serem assados ou cozinhados segundo as suas técnicas. Se rejeitarmos a sugestão de comer escaravelhos, baratas ou gafanhotos, devíamos recordar que estes animais são parentes próximos dos camarões que apreciamos, sejam cozidos ou crus, para acompanhar uma bebida alcoólica fresca.

De modo semelhante temos a noção de que, caso sejamos carnívoros, é recomendável cozinhar e comer a carne quanto mais recentemente morta. Fugir das carnes em processo de decomposição. Mas quem viveu no ambiente rural recorda, e sabe por ter visto, que também se recomenda deixar a carne repousar algumas horas, ou mesmo um dia inteiro, após a matança e antes de a desmembrar. Hoje creio que não se liga muito a este preceito. Mas... se fizer uma leitura atenta a certas reportagens de culinária “de topo”, pode encontrar referências a comercialização, a preços altos, de carne de animais abatidos até 30 dias antes! E vinda de origens bem longínquas, como pode ser o Japão.

Regressando ao rectângulo, os urbanitas actuais dificilmente aceitariam como petisco a magra refeição que muitos ganhões e pastores, longe da sua casa, comiam no seu descanso da jorna. Não raramente dispunham de um naco de pão, raramente da véspera, e um bocado de toucinho salgado. E já em casa, como lanche. Poder untar o pão da semana com unto de porco temperado com pimentão, como se fosse manteiga fresca, era um petisco que muitos velhos recordarão com saudade.

Do que antecede podemos concluir que são os hábitos recentes que condicionam o nosso paladar e as preferências. E não deixamos de lado os limites de opção que nos são marcados pelos custos monetários. Nem tudo o que sonhamos poder ter no prato nos é dado conseguir.

Mesmo assim há “iguarias” que estão tão fixas no ideário gastronómico nacional que não resistem a uma analise de prós e contras. E a mais penosa e generalizada é o impulso de comer sardinhas assadas. Poucos alimentos dos humanos devem possuir um nível de incómodo como o fedor do assar peixe, e mais se forem sardinhas. E se ao comer este peixe seja grelhado ou frito, nos sentíssemos com a boca aguada de prazer, extasiados até, então já nos devemos considerar uns sibaritas.

É sintomático, e mostra não respeitar as adversões dos não tradicionalistas extremos, que nesta época ainda se chamem parentes e amigos para uma “sardinhada”. Esta situação social é um dos atavismos que insistimos em valorizar, sem que tenha outro mérito do que o juntar pessoas num fingido agradável convívio. Nunca fui convidado para partilhar uma almoçarada de açorda de bacalhau! Felizmente.

E para que conste. Não sinto um ódio extremo em relação às sardinhas. Só ao  cheiro, intenso e agressivo. Quando devidamente enlatadas são agradáveis!

Muito mais se podia escrever sobre alguns dos pratos que se consideram como 
 sendo o identificador culinário de uma zona determinada, atribuindo-lhe uma identidade reconhecível, na maior parte das vezes  partilhada sem saber.



urbanita  - pessoa que habita numa grande cidade
sibarita  - pessoa dada ao luxo e aos prazeres da vida








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